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Magnano diz que convocaria astros mesmo amargurado e com rancor

Luis Augusto Símon

Do UOL, em São Paulo

09/04/2014 06h00

O Brasil conquistou sua vaga no Mundial de basquete apenas ao ser convidado pela Fiba para o torneio na Espanha, após dar vexame na Copa América e não obter classificação direta. A seleção nacional saiu da competição sem conquistar uma única vitória.

O time do técnico Rubén Magnano disputou a Copa América na Venezuela em 2013 sem suas principais estrelas da NBA, mas para o Mundial, que começa no dia 30 de agosto, terá todos os seus jogadores a disposição. O treinador argentino declarou que pode ficar amargurado, com rancor, mas nunca irá vetar nenhum jogador para o torneio.

Leia a entrevista completa com Magnano:

UOL Esporte: Como será a preparação?
Rubén Magnano: A minha começou quando soube que teríamos o convite. Os jogadores começam depois porque estão jogando. A primeira coisa a fazer é ganhar o primeiro jogo. O primeiro jogo não é o da estreia, contra a França. O primeiro jogo é fazer a melhor seleção brasileira possível. Conseguir que todos os jogadores estejam à disposição, como foi na Olimpíada. Ter um bom número de jogadores e montar o melhor time.

E o que está sendo feito?
Vou viajar agora para Estados Unidos e Espanha. Preciso ter certeza de quais soldados irão comigo para a guerra.

Quando perdeu a vaga para o Mundial, você disse que aqueles jogadores haviam lutado e que outros nem haviam ido a Caracas. De quem você falava?
Nome próprio eu não dou. Como nunca falo quem é o melhor no Brasil.

Mas há alguém vetado?
Não. Não posso me permitir isso. Pessoalmente posso ficar amargurado, posso ficar com rancor, porque fomos lá, demos a cara para bater em Caracas, tentamos e não conseguimos. Sofri uma vergonha esportiva muito grande. Mas perdemos de cabeça alta. Eu tenho de tentar o melhor para o basquete do Brasil. Se o cara falhou uma, falhou duas, vou tentar de novo, se achar que ele pode ajudar. Seguindo as minhas regras, lógico.

Antes de chamar, vai ter uma conversa cara a cara com eles?
Sim, estou viajando para isso. Para falar cara a cara.

O torcedor brasileiro em sua maioria não gosta do Nenê porque acha que ele não se importa com o país. Isso é um problema, chamar alguém com essa imagem?
Pelo que conheço dele, pela experiência que tenho com ele, tenho de falar o contrário do que você pergunta. Nenê na seleção, no treinamento, sempre foi muito bem. É preciso deixar isso claro. E saber que o Nenê convive com uma situação física difícil, ele tem fascite plantar. Viveu situações problemáticas também com a CBB (Confederação Brasileira de Basquete) tempos atrás. Eu entendo que a CBB precisa respeitar muito o atleta e isso está acontecendo. E muitas vezes as informações sobre Nenê não são verdadeiras. Ele tem um desafio que é mostrar ao torcedor brasileiro quem é o verdadeiro Nenê.

O desafio é ainda maior quando o Oscar o critica.
A palavra de Oscar pesa muito no Brasil. E é lógico que não ajuda quando ele fala o que falou de Nenê. Cabe a nós alimentar o Nenê para encarar esse desafio. Temos o desafio de recuperar a imagem que deixamos na Olimpíada. Foi boa.

O convite obriga a levar jogadores da NBA?
Não. Eu tenho claro que por ser da NBA é o melhor. Muitas vezes acontece, e não são de brasileiros, tem muita gente que joga na NBA e não é de sua seleção. Não tem obrigação.  Tem jogadores que não jogam na NBA e produzem muito mais na seleção, até pelo estilo de jogo. Tem jogador na NBA que atua cinco minutos por jogo. Não me serve. Prefiro alguém que está na Europa e joga 25 minutos por jogo.

O Brasil tem no máximo 30 jogadores selecionáveis. Mesmo assim, é possível não chamar alguém da NBA?
Vamos esclarecer. Para um treinador é muito importante ter uma plataforma grande de escolhas, gente da NBA, da Europa, de uma liga nacional forte. Assim, a possibilidade de errar é menor. Esse é um lindo problema. Todo mundo quer. Hoje, infelizmente por nossa estrutura – que está crescendo pouco a pouco – não temos muitos jogadores de nível internacional para escolher. Mesmo assim, pode acontecer de não chamar alguém da NBA. Se jogador joga pouco o ano todo, não rende na seleção.

Quer evitar que jogadores machucados se apresentem?
O jogador pode se machucar depois, temos de contar com isso. Mas o importante é ter a palavra do jogador, é ter o comprometimento do jogador com a seleção. Preciso ter a certeza de que vou poder contar com os jogadores.

As contusões de Varejão, Leandrinho e Nenê te preocupam?
Há tempo para que estejam 100% em condições físicas.

Na Copa América, o Leandrinho e o Varejão se apresentaram contundidos e depois pediram dispensa. Isso cria um mal estar...
Não nesses casos. Eles estavam realmente machucados e não podiam jogar. Não há nada de errado.

Quantos amistosos serão feitos antes do Mundial?
Teremos torneio na Argentina, depois, México, Angola, EUA, Eslovênia, Lituânia, Irã e mais um jogo.

O convite é uma chance a mais para você?
Não só para mim, para a seleção brasileira e principalmente para o basquete brasileiro. Felizmente veio a chance e precisamos aproveitar.

Quando o Brasil terminou em quinto, você esperava tanta confusão depois a ponto da seleção precisar de um convite?
Não. Sempre há dispensas, mas há países que sofrem muito com a ausência de dois ou três e outros não. A Espanha teve duas ausências de peso e foi vice-campeã da Europa.

Há jogadores “convocáveis” no NBB?
Sim, é lógico. O Giovanonni, por exemplo. Outro dia ele disse uma frase ótima: "Enquanto os jovens permitirem, eu vou continuar ganhando". Isso mostra um jogador competitivo. Tem fome de vitória, não cede espaço, gosto de gente assim. 

Quem mais?
O Leo Mendel de Franca é um jogador jovem que acompanho, mas ele precisa emigrar. Precisa estar em ligas que exijam mais. Quando um jogador está chegando no teto de sua liga, precisa ir para outra que lhe exija mais, que o faça buscar novas qualidades, que aumente seu rendimento.

Marcelinho Machado pode voltar?
Pode sim. Eu só não chamei porque respeito a decisão dele de se aposentar. Mas está jogando muito bem, se precisar, vou chamar e tenho certeza que vai aceitar. Respeito Muito. Comigo, sempre se esforçou 101%.

Dizem que só sabe arremessar.
Convido os que dizem isso a ver a partida que fez contra a República Dominicana em Mar Del Plata e a ver suas atuações quando estava na liga da Lituânia, que é fortíssima.

Quando teve o sorteio do Mundial, os espanhóis disseram que estavam no Grupo da Morte, com França, Servia e Brasil. Isso é um reconhecimento, não?
Fomos quinto na Olimpíada e jogamos bem. Podíamos ter ficado terceiro e deixamos ótima imagem. Contra tudo, não deram nada. Por isso, digo que estou lutando para ganhar o primeiro jogo, que é fazer um grande time.

Shamel pode ser naturalizado?
Não falo sobre isso porque ele não é brasileiro não se naturalizou. E só pode ter um naturalizado. E o Larry Taylor foi muito bem na Olimpíada.

Quem está jogando bem na Europa?
Augusto Lima está jogando muito bem. Rafa Luz também. Raulzinho está voltando de contusão. Infelizmente Rafael Hettsheimer está contundido. Mas quem me surpreende é Augusto.

Huertas?
De Huertas nem preciso falar, é um grande jogador e uma grande pessoa. É um líder que ama a sua seleção.

No Pré Mundial, você perdeu muitos pivôs como Thiago, Varejão, Nenê, Faverani e outros.
O que todo mundo dizia é que se Brasil vem com seu garrafão principal, seria difícil de perder.

Entre os 12 convocados, são cinco pivôs?
Sim. Geralmente, são cinco homens grandes, dois são pivôs (numero cinco), dois alas-pivôs (número 4),  um quinto, que pode jogar em duas posições: ala-pivô e pivô ou ala-pivô e ala. Giovanoni pode ser um bom exemplo. De 5 temos Thiago e Nenê, de 4 temos Varejão, Faverani e Hettscheimer. Augusto está de 5, mas prefiro que seja ala-pivô.

Huertas, Luz e Raul estão acima dos nossos armadores do NBB?
Epa, você viu Larry contra a Rússia na Olimpíada. Foi ótimo. Gegê e Fischer também são bons.

Algum brasileiro poderia estar entre os 12 da geração dourada que ganhou a Olimpíada?
Claro, tem qualidade para isso. Só não digo o nome.

Se você fosse convocar uma seleção sul-americana atual, contando todas as estrelas, como Ginobili, por exemplo, quantos brasileiros chamaria?
No mínimo quatro.

Como fazer um país com 200 milhões de habitantes aumentar a base de convocáveis, passar a ter mais de 30 nomes?
Precisa aumentar as instituições onde se joga basquete, os clubes. Isso permite massificar o basquete. Um menino pobre pode jogar basquete sistematicamente sem pagar mensalidade ao clube. Da massificação se encontra qualidade. Se não for assim, teremos sempre que escolher entre 30 ou menos.

Uma vez o Helio Rubens me disse que quando ia enfrentar a Argentina nem treinava, ficava na piscina.
Ele falou como jogador ou como treinador? Como treinador, ele sabe que não é verdade.

Ele falou como jogador.
Ora, quando ele jogava o Brasil tinha 40% a mais de clubes do que tem agora, com metade da população. Perdemos Monte Líbano, Sírio, Ipiranga, Juventus e muitos outros. Um menino de 16, 17 anos joga quantas partidas por ano? Muito menos que deveria.

O jogador argentino aceita a convocação porque é mais patriota que o brasileiro ou porque eles querem defender o legado de terem sido campeões olímpicos? No Brasil, fala-se que os argentinos são muito mais patriotas.
Eu nunca disse isso, só para deixar claro. O jogador brasileiro gosta de sua pátria sim, é lógico. Atualmente, a seleção argentina é chamada de “A alma”. Isso explica muita coisa. Há um sentimento, um amor. O jogador argentino que foi campeão olímpico e que aceita uma convocação, ele deixa um legado que não é só de arremesso, de rebote, de armação. Ele deixa muita coisa boa com uma declaração de amor, com uma atitude, com um exemplo.

Por exemplo?
Vamos falar de Luis Scola. Ele levou o pivô Delia, que é da seleção, para treinar por três meses na NBA. Ele pegou Campazzo, ensinou muito a ele, de forma particular, e agora ele é o substituto do Prigioni.

Paulão, que tem problemas no joelho e de peso, é um dos melhores jogadores do NBB. Isso mostra que o nível é baixo?
Não, o nível do NBB não é baixo. Dois brasileiros disputaram agora o título da América. Sua comparação é ruim porque tira os méritos de Paulão, um jogador que atuou na Espanha, a segunda liga mais importante do mundo. Tenho acompanhado ele e tem jogado bem. Outro dia, pegou 21 rebotes com o Flamengo.