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Maguila improvisa no hospital e treina boxe. Mas evolução é lenta e difícil

Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

08/09/2014 06h38

O mal de Alzheimer é implacável. Irreversível e degenerativo, é uma batalha dura de se enfrentar, mesmo para um homem como Adilson Rodrigues, o Maguila, o peso pesado mais famoso da história do boxe brasileiro. Internado há mais de quatro meses, o sergipano tem vivido no hospital geriátrico Dom Pedro II, em São Paulo, tendo como principal problema a dificuldade de deglutição. Para este problema, sua mulher, Irani Pinheiro, usa a palavra “milagre”. Mas também há boas notícias vindas de lá: o Maguila está de volta ao boxe.

Há um mês, foi Eder Jofre, que sofre de demência pugilística (a encefalopatia traumática crônica), quem voltou a calçar as luvas. Agora, Maguila segue o mesmo caminho. Em seu ritmo, de leve, ele achou nos treinos de boxe a motivação para manter sua luta, já que segue sendo alimentado exclusivamente por sonda e ainda não tem condições de ir para casa.

Irani Pinheiro, sua mulher, alterna entre a felicidade da melhora em seu quadro e a dura realidade do Alzheimer. Diferentemente da preocupação da internação, quando ele também apresentava um quadro de pneumonia, a situação hoje é mais amena. Maguila perdeu muito peso, chegou a pesar 87 kg – pouco para um corpo de 1,87 m que já foi de um peso pesado nocauteador.

“Graças a Deus hoje ele está bem, já está bem recuperado, emagreceu um pouco. Mas agora ganhou dois quilos, está mais ativo, está treinando, fazendo trabalho com fisioterapeuta, fonoaudióloga. E está conseguindo bater três rounds de saco”, revelou Irani, em entrevista ao UOL Esporte.

Os treinos de boxe começaram há cerca de um mês e tiveram impacto positivo na disposição do sergipano. Maguila assiste TV – está acompanhando as eleições, por exemplo – e gosta de ler revistas. Mas faltava algo.

“Nós estávamos procurando um modo melhor para ele se animar, ter mais motivação, não ficar só sentado ou deitado. Como a condição dele está bem melhor do que a que ele chegou, eu perguntei o que ele gostaria de fazer. ‘Você não gostaria de treinar um pouquinho, bater saco?’. Ele falou: ‘pode ser, acho que é isso que eu quero’. Na rotina dele, de manhã vem a equipe de fisioterapia que o leva para a academia. Então adaptamos lá, montamos um saco de boxe e levei suas luvas. Então ele faz um pouco de musculação, depois está conseguindo bater três rounds de saco, no tempo dele, é claro”, detalhou a mulher do lutador, completando. “Eu já falei: ‘cuidado, daqui a pouco você vai querer lutar aqui e não pode’(risos)”.

Exames sempre indicaram problema

Irani revelou à reportagem que desde a época de lutador Maguila tinha algum sinal de que poderia enfrentar o Alzheimer. As tomografias e ressonâncias realizadas como exame de rotina já mostravam algo em seu cérebro.

“O Maguila quando lutava fora do país todos os exames eram feitos. Foi diagnosticado na época que quando fazia tomografia, ressonância, que o cérebro tinha um pontinho que não sabiam se era de nascença ou de porrada. Toda vez dava a mesma coisa. Mas (com o Alzheimer) o comportamento é que muda. Tem dia que ele não lembra que fui lá, tem dia que lembra. Mas ele tem recordação de muitas coisas, está  totalmente consciente”, explicou ela.

Nos seis anos que Maguila já combate o Alzheimer, ela teve de lidar com sintomas de depressão e picos de agressividade do ex-lutador. Quem tem de lidar com tudo é Irani, apesar de ela não ter certeza de que sempre consegue.

“Não sei se eu consigo viu. O Maguila é aquele crianção, aquele meninão. Tem hora que tenho de chegar junto e falar com ele: ‘Adilson’ – quando eu estou brava chamo de Adilson – ‘é o seguinte, agora a gente tem que fazer isso, e isso, o que você acha?’.”

Maguila quer carne seca

A dificuldade de tirar Maguila do hospital vem de dois fatores: um é o grande número de profissionais que diariamente cuidam dele e o outro é por conta do seu problema de deglutição. Há um mês, os médicos tentaram mudar sua alimentação e começaram a dar comida pastosa para o ex-lutador. Mas não deu certo e a medida foi suspensa.

Isso foi um baque para ele, e Irani sabe que a dificuldade seria maior em casa. “Tem sido uma luta muito grande. Ele gosta muito de comer. Ao saber que tinha de parar, ele balançou. Mas nós conversamos e ele está entendendo que precisa dar um tempo”, explicou ela.

“É difícil você segurar o Maguila para não comer, é difícil ele não assaltar uma geladeira em casa. Quem vai segurar ele? Quando começpi a comer a pastosa, ele falou que já queria carne seca... E arroz, feijão e farinha. Falei: ‘nem eu tô comendo farinha, você vai comer?’. Imagina como seria ir para casa com uma pessoa assim, é meio complicado”, completou.

O problema não pode ser corrigido por cirurgia, e o trabalho feito é com uma fonoaudióloga para que Maguila tente evoluir a ponto de voltar a controlar os movimentos. “Por enquanto continua a sonda. Só se acontecer um milagre. Eu creio, mas isso é Deus que vai decidir”. Além disso, o ex-lutador tem um nódulo no pulmão, mas ainda não se sabe o que ele é, já que está alojado num local que não possibilita a realização de uma biópsia neste momento.