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"Bananas Congeladas" atraem vice-campeão mundial e atletas olímpicos com medo de altura

Seletiva para atletas de bobsled e skeleton foi disputado em São Caetano, em uma pista de atletismo - Bruno Doro/UOL
Seletiva para atletas de bobsled e skeleton foi disputado em São Caetano, em uma pista de atletismo Imagem: Bruno Doro/UOL

Bruno Doro

Do UOL, em São Caetano do Sul

15/01/2013 00h01

Pergunte para qualquer criança. O que é um carrinho descendo em uma montanha a toda velocidade, fazendo curvas? Montanha russa! Com o bobsled e o skeleton, a sensação deve ser parecida. São descidas em trenós, em uma pista de gelo, cheia de curvas e atingindo velocidades impressionantes.

Essa comparação é comum no mundo dos esportes de gelo. Mas no Brasil, em que as modalidades ainda engatinham, a relação ainda não é tão forte. Tanto que a Confederação Brasileira de Desportos no Gelo (CBDG) fez uma seletiva no último domingo para montar a nova equipe dos Bananas Congeladas (o apelido do time verde-amarelo) e atraiu atletas que confessaram certa inaptidão: problemas com altura e pouco apreço às emoções das montanhas russas.

“Olha, vou ser sincero. Eu já fui uma vez [em uma montanha russa]. Mas fui obrigado”, admite, sorrindo, Jadel Gregório. Dono de três medalhas de prata em campeonatos mundiais, ele o principal nome da seletiva, realizada no CT de atletismo da BM&F, em São Caetano do Sul, um dos mais modernos do país.

E prometeu driblar seus medos caso seja escolhido. “Eu vi uma competição de salto em distância em esqui uma vez. E aquela montanha, sim, era alta. Se fosse como aquela, eu não faria. Mas me garantiram que a de bobsled é mais calma. Mas é uma oportunidade de defender o Brasil. E, para isso, dá para superar esses obstáculos”, diz o saltador, recordista brasileiro do salto triplo.

A SELETIVA DE BOBSLED E SKELETON

  • Primeiro, atletas fizeram tiros de 30m e 60m

  • O segundo teste era de salto em distância parado

  • Depois, levantamento de peso, para medir força

  • O último teste envolvia um trenó especial para o teste

A presença do atleta deixou os dirigentes da CBDG salivando. Jadel era o mais famoso dos atletas pleiteando uma vaga. Além dele, outra atleta olímpica, Lucimar Moura, também estava por lá. Veterana de duas edições dos Jogos Olímpicos, ela já chegou perto de uma medalha, em 2008, quando participou da equipe brasileira do revezamento 4x100 m que terminou em quarto lugar. Ela, também, admitiu receio com a montanha. “Além da altura, tem também o frio. Quando viajamos para lugares com neve, eu até saio, coloco o pé na neve, sinto como está, mas volto logo para dentro”, diverte-se.

Medos como os de Jadel e Lucimar são comuns entre os brasileiros. Tanto que a Confederação vai convocar entre cinco e seis atletas, mas deixará de prontidão mais nomes, prontos para viajar caso um dos escolhidos desista ao se deparar com a montanha. “No alto da montanha, tem gente que olha para baixo e desiste. Acontece muito. Por isso precisamos de um número maior de atletas interessados”, fala Emílio Strapasson, interventor presidente da CBGD.

Quem já teve a experiência de chegar ao topo da pista de olhar para baixo garante que a adrenalina é grande. “Fazem muito essa comparação com montanha russa. Mas é muito mais do que isso. O barulho é muito grande, não é só a velocidade da decida. Nas minhas primeiras voltas, o barulho me deixava tão assustada que não conseguia ouvir a piloto”, lembra Daniela Ribeiro, que já tem três títulos em competições internacionais para mostrar.

Daniela, aliás, tem um perfil muito mais próximo ao que a CBDG procura do que Jadel ou Lucimar. Os dois primeiros têm, no atletismo, seu ganha pão, tem equipes, patrocinadores e calendários montados. Apesar da boa vontade que a dupla mostrou, teriam de fazer concessões, trocar de foca entre os esportes de inverno e verão e, no fim das contas, dedicar apenas parte de seu tempo ao bobsled. “É claro que continuaria a competir no salto triplo. Mas é possível, durante a temporada indoor, fazer essa mudança”, explica Jadel. “Eu avisei meu técnico que faria a seletiva, mas é claro que, se for aprovada, vou precisar analisar bastante o calendário para ver como dividir as coisas”, completa Lucimar.

Por isso, atletas que estão próximos do nível da dupla, mas não conseguiram quebrar a barreira dos quatro ou cinco melhores do país levam vantagem. “É claro que não vou fechar as portas caso o melhor velocista brasileiro queira fazer parte da equipe. Mas precisamos de atletas que possam dar dedicação integral aos esportes de gelo. O Jadel, por exemplo. Se ele estiver focado nos Jogos do Rio de Janeiro, em 2016, não vejo problema em testá-lo e, quem sabe, aguardar até depois das Olimpíadas”, analisa Strapasson.

É o caso de Daniela. Ela era atleta do heptatlo, mas nunca chegou ao nível das melhores do país. Durante a seletiva, porém, era a mais requisitada para dicas. “Dani, como é que empurramos o carrinho?”, “Qual a melhor posição das mãos?” ou “A saída é com os dois pés paralelos ou pode fazer com um deles na frente?” eram perguntas que ela respondia sempre com um sorriso.

Novata, Sally da Silva estava nesse grupo. Apesar de competir contra atletas como Lucimar ou Maíla Machado, que estão entre as melhores do país, foi a mais rápida do dia. “Eu tive bastante sucesso em nível estadual no atletismo. Vi no bobsled uma oportunidade legal para competir em uma Olimpíada”, conta.

Essa chance de um atalho para os Jogos Olímpicos, aliás, atraiu uma série de amadores para a seletiva. Pessoas que, se perdiam no aspecto treinamento físico, garantiam levar vantagem no fator coragem. Um deles era Rafael Atilli. Professor de educação física e praticante de rugby há seis anos, ele fez testes para o skeleton, um trenó aberto, em que o atleta desce com as costas paralelas ao gelo.

“Sempre quis praticar um esporte em alto nível. Quem não gostaria de descer uma montanha a 120 quilômetros por hora?”, pergunta. “No rugby, já enfrentei todos os jogadores da seleção, principalmente os caras do time de Sevens (a modalidade que irá estrear no Rio-2016). Mas são atletas que começaram a jogar aos dez anos. Não havia chance ali. No skeleton, sim”.

Mostra disso veio nos testes físicos. Os 43 inscritos passaram por quatro estações de exames físicos. No primeiro, duas corridas, de 60 e 30 m, para avaliar velocidade. Na segunda, um salto em distância, sem impulso, para avaliar explosão muscular. Na terceira, teste de força, levantamento de peso. Unindo tudo, os candidatos empurraram um carrinho feito especialmente para o teste, com medidas de apoio iguais aos do trenó. Mesmo amador, o jogador de rugby apresentou níveis parecidos com os dos candidatos do atletismo nas provas de velocidade e força, mas ficou longe na prova de saltos.

Além do teste físico, os atletas tiveram de responder a um extenso questionário que investigava experiências profissionais e pessoais de cada um, além da disponibilidade de cada um. “Não basta ser um grande atleta e não poder participar dos treinos. Queremos pessoas com sangue nos olhos, que podem se dedicar ao bobsled. E o que vimos aqui foram muitos atletas assim”, comemorou Strapssom.