Topo

Boate gay de Sochi quis lucrar com Olimpíada, mas só apareceu jornalista

Bruno Freitas

Do UOL, em Sochi (Rússia)

13/02/2014 06h00

O prefeito de Sochi, Anatoly Pakhomov, afirmou pouco antes dos Jogos de Inverno que não existia um único homossexual na região do Cáucaso. O político certamente disparou a bravata sem nunca ter passado perto do cabaré Mayak, que involuntariamente ou não tem carregado a bandeira da resistência gay na sede olímpica, em tempos de lei de perseguição na Rússia de Vladimir Putin.

O único bar gay de Sochi não se intimidou com os tempos de evidência da lei anti propaganda e apostou em uma peça de publicidade para se associar aos Jogos de Inverno. A intenção escancarada era atrair os visitantes estrangeiros para o beco escuro e intimidador que camufla o cabaré, na região central da cidade. No entanto, há algumas semanas só os jornalistas têm tocado a campainha de entrada, em busca de uma repercussão para uma das grandes polêmicas desta Olimpíada.

"Faltava um do Brasil", diz Sergei Baklykov, drag queen que comanda a atração da casa, trajado com uma calça colada e um agasalho da equipe olímpica russa.

O anfitrião diz que não tem mais paciência de responder perguntas dos jornalistas e orienta o visitante do Brasil procurar o proprietário: "volte daqui uma hora e traga um tradutor. Ele não fala inglês".

Em seguida, uma de suas colegas diz que o clube já foi tema de mais de 200 reportagens da imprensa internacional no último mês. A drag queen assegura que os americanos foram os campeões de visitas, mas que diferentes equipes da britânica BBC estiveram lá quatro vezes. Também tocaram a campainha do clube jornalistas de Finlândia, Suíça, Dinamarca, Canadá, etc.

"Sempre as mesmas perguntas sobre Putin e a lei, claro", retruca outro homem que transita na recepção, mas com jeitão de segurança.

Não dá para negar. Nas rodas de imprensa da Olimpíada, é quase obrigatória a conversa “e aí, já fez a pauta no cabaré gay?”. Outro dia, enquanto rolava uma rodada de curling, este brasileiro entrou numa conversa de um russo que já tinha ido ao Mayak, com um americano que precisava ir, citando um inglês que passou informações a respeito.  

Pois é, mas se a horda de jornalistas não para de bater a porta do Mayak, dentro do clube o visual é um tanto triste, com a escassez de frequentadores "pra valer".

A reportagem do UOL apareceu no Mayak na noite de quarta-feira, por volta da meia-noite. Convidado para um passeio pelas instalações, o visitante vê apenas uma única mesa ocupada, mas nada de clientes. Lá estão performers ainda à paisana, sem a super produção característica de uma drag queen poderosa.

Na altura da visita, o palco está deserto e impera um clima deprê: apenas penumbra e um hit qualquer dos anos 80 da caixa de som. 

Antes que o visitante vá embora, um performer de feições orientais sai de trás da mesa e se aproxima curioso, com calças e blusa picotadas, num estilo próximo a Edward Mãos de Tesoura. Mas ao ver que se trata de mais um jornalista diz que não fala inglês e se afasta da tentativa de conversa.

O Mayak fica numa região de grandes hotéis, atrás de uma porta discreta, que não sugere o conteúdo da casa. Nas ruas ao lado, no entanto, clubes destinados ao público heterossexual masculino fazem bem mais alarde com os tradicionais neons e cartazes com descrições minuciosas de serviços.