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Jamaica repete "bobsled pastelão" em Olimpíada e sai ovacionada em último

Bruno Freitas

Do UOL, em Sochi (Rússia)

16/02/2014 18h03

Desde que um filme da Disney contou a história dos pioneiros do bobsled jamaicano, há mais de 20 anos, toda e qualquer incursão dos filhos da ensolarada ilha do Caribe em Olimpíada de inverno vira um acontecimento. Neste domingo não foi diferente, quando Winston Watts e Marvin Dixon saíram ovacionados em último lugar após o primeiro dia de disputas em Sochi.

Watts, piloto de 46 anos, não conseguiu acertar a viseira antes da segunda descida e praticamente foi até o fim sem enxergar nada. O trenó jamaicano quase virou em um setor, mas conseguiu completar o percurso. O saldo do dia, um 30º lugar nos tempos somados, 4s41 atrás dos líderes russos.

Mas a colocação parcial dos jamaicanos pouco importava. O que mais valia na pista do Sanki Sliding Center era renovar uma das histórias alternativas mais cultuadas do universo dos esportes de inverno.

"Estou feliz só de estar aqui. É maravilhoso que a torcida apoie nós que somos de uma pequena ilha do Caribe", comemorou Watts após o dia de disputas.

"A viseira quebrou e eu não pude enxergar em alguns momentos. Mas pudemos descer em segurança. Mas amanhã (segunda-feira) não temos desculpas, vamos escolher as lâminas certas", completou o piloto veterano.

Ostentando capacetes com desenho de melancias, desenhados pela Puma, os integrantes do trenó de dois homens da Jamaica levantaram o público. Alguns russos inclusive foram ao Sanki Sliding Center munidos de bandeiras em referência aos caribenhos, com direito até a uma faixa com a imagem de Bob Marley. Dois destes entusiastas foram o casal de namorados Andrey Khurry e Elena Pochelova.

O carisma também se espalha entre companheiros de modalidade, como os brasileiros do trenó de quatro homens.

"A gente conversa bastante, estamos em contêineres vizinhos. O Winston Watts é muito fanfarrão, está sempre brincando com a gente. Mas na hora de competir se foca bastante no bobsled", diz o piloto brasileiro Edson Bindilatti.

TUDO COMEÇOU EM UM FILME DA DISNEY EM 93

O potencial pop dos caribenhos do bobsled foi disseminado principalmente através um filme da Disney, de 1993, chamado "Jamaica Abaixo de Zero" (Cool Runnings) - baseado na primeira experiência do país em Jogos de Inverno.

Em Calgary-1988, no Canadá, pela primeira vez os jamaicanos se aventuraram no meio de equipes de países mais familiarizados com o frio, como Alemanha, Suíça e Áustria. A estreia não foi das mais felizes, marcada por um acidente feio, quando o então quarteto do país teve que completar o percurso a pé após um tombamento na terceira descida [mas sem carregar o trenó nos ombros, como o filme da Disney exibiu, em uma licença poética].

Depois deste episódio, outras nações de temperaturas quentes se animaram a também se arriscar na modalidade, como o próprio Brasil.

"O filme nos trouxe muito carinho, mas não queremos mais ser alvo de piadas. Somos top 10 nos tempos de arrancada, merecemos respeito", diz o piloto Watts.

O bobsled da Jamaica não participava de uma Olimpíada desde 2002, em Salt Lake City, contando com Watts. O piloto de 46 anos deixou a aposentadoria recentemente em nome do sonho de voltar ao evento.  

Depois da primeira aparição nos Jogos de Sochi neste domingo, os jamaicanos encerram sua participação nesta segunda-feira, com chances reduzidas de conseguir uma vaga na bateria final.

VAQUINHA PARA PODER IR A SOCHI

Para renovar o folclore jamaicano em Jogos de Inverno, a equipe do país precisou ir à internet para pedir recursos. Logo depois da confirmação da classificação na disputa do trenó de dois homens, os caribenhos pediram US$ 80 mil (cerca de R$ 190 mil) para viabilizar a viagem até a Rússia.

Em apenas 48 horas, os jamaicanos levantaram US$ 130 mil em doações. Segundo a Federação Jamaicana de Bobsled, a campanha também visava a compra de equipamentos necessários, de lâminas para os trenós até roupas de competição.