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Fórmula 1

Hamilton ganha nota 9 em Silverstone, mas é superado por Bottas e Alonso

Livio Oricchio

Do UOL, em Nice (França)

08/07/2014 14h10

A presença dos dois carros da Williams e da Ferrari no fim do grid, domingo, depois do erro de estratégia na classificação, sábado, já indicava que haveria muitas ultrapassagens nas 52 voltas do GP da Grã-Bretanha, em Silverstone.

Mas a corrida mostrou mais que isso: apresentou um duelo espetacular, em altíssima velocidade, entre Sebastian Vettel, da Red Bull, e Fernando Alonso, Ferrari, dentre outros. A seguir a avaliação dos pilotos no fim de semana na Inglaterra.

Lewis Hamilton - 9
Cometeu um erro importante, sábado, ao abandonar a última volta na classificação, fazendo-o largar em sexto, apenas. Na volta de aquecimento dos pneus, quando saiu dos boxes para a volta lançada, nos segundos finais do Q3, teve tempo de compreender que o trecho final da veloz pista de Silverstone estava quase seco, passou por lá.

Nico Rosberg, companheiro de Mercedes, entendeu e sabia que mesmo sendo mais lento nas duas primeiras parcias era possível compensar a perda no último trecho, já quase sem água. Resultado:  o alemão estabeleceu a pole position, para ainda maior desestruturação de Hamilton.

Outros pilotos melhoraram também substancialmente seus tempos, para piorar, como Vettel, segundo no grid, Jenson Button, McLaren, terceiro, e Nico Hulkenberg, Forcer India, quarto.

Se o cambio de Rosberg não tivesse quebrado é pouco provável que Hamilton o tivesse ultrapassado e, assim, terminaria novamente em segundo. Com seu enorme talento, velocidade e gana de reagir diante da torcida, depois de perder terreno para o companheiro, já na quarta volta da corrida Hamilton era o segundo colocado. Sabia que não podia perder tempo para Rosberg, a essa altura já com uma vantagem de 5 segundos.

O inglês campeão do mundo de 2008 não ganha 10 por causa de desistir na classificação e na F1 ser perseverante é imprescindível. Mas agora, com o moral alto de novo, por estar a apenas 4 pontos de Rosberg, volta a ser o concorrente ao título supercapaz das cinco primeiras etapas, quando só não venceu todas por causa do problema elétrico em Melbourne. Nas restantes, Malásia, Bahrein, China e Espanha só deu ele.

O episódio de Mônaco, com a consequente perda da liderança do campeonato, o desestabilizou. Errou depois no Canadá, na Áustria e na classificação em Silverstone. A vitória diante da sua torcida, vimos no autódromo, parece ter tirado o caminhão de areia que transportava nas costas e ajudava a explicar muito os equívocos depois de Mônaco.

É provável que Rosberg já saiba que enfrentará daqui para a frente um Hamilton mais parecido com o das primeiras etapas que o das últimas, ou seja, mais bem preparado ainda, com a esperada maior estabilização emocional.

Valtteri Bottas - 10
O finlandês da Williams-Mercedes é ao lado do australiano Daniel Ricciardo, da Red Bull, a ótima surpresa da temporada. Ambos não haviam tido até o ano passado a chance de expor seus reais dotes não apenas de velocidade, mas de regularidade, controle da corrida, capacidade de ultrapassagem, dentre outros predicados. Ricciardo completou 25 anos dia 1.º enquanto Bottas o fará 28 de agosto.

Bottas largou em 14.º em Silverstone, por causa de mais um erro estratégico da Williams, e já na 15.ª volta lutava com Button pelo terceiro lugar. Fez a ultrapassagem por fora, na rápida curva Stowe. Sensacional! O terceiro seria sua colocação final, o melhor dos normais, fora a dupla da super Mercedes, mas Rosberg abandonou e Bottas recebeu a bandeirada em segundo.

Assim como Ricciardo se aproveitou das dificuldades da Mercedes em Montreal e ganhou a prova, Bottas se coloca desde já como o maior candidato a vencer nesta temporada o seu primeiro GP também. O finlandês dá a cada corrida mostra de ser o que o ex-chefe da Williams, Dick Stanford, sempre me disse: "Ele é um supertalento".

Felipe Massa compartilhou a Ferrari com Michael Schumacher, Kimi Raikkonen e Fernando Alonso, todos campeões do mundo e extraordinários pilotos. Se achou que o desafio na Williams com o novato Bottas poderia eventualmente ser menor, deve estar revendo seus conceitos. Ainda é cedo para essas comparações, mas Bottas aproveita muitíssimo bem as qualidades do modelo FW36-Mercedes da Williams e o momento de súbita ascensão da equipe.

Com a anunciada aposentadoria de Raikkonen da F1 no fim de 2015, segundo ele próprio disse ser provável, Bottas, ratificando ser o potencial campeão evidenciado este ano, pode vir a ser uma ótima escolha para a Ferrari. Mas não estou certo de que ele aceitaria. A Williams pode estar melhor. E não seria companheiro de Fernando Alonso.

Daniel Ricciardo - 9
Vê-lo pilotar já representa um grande prazer para quem gosta de automobilismo. Como Hamilton, teve um erro de avaliação na sessão que definiu o grid sábado, daí iniciar a corrida apenas em oitavo. E a exemplo do inglês da Mercedes só não recebe 10 por essa razão.

Ricciardo não apenas tem se mostrado mais rápido que o supertalentoso Vettel, ao menos com o modelo RB10-Renault, como tem trabalhado melhor com a equipe. "Mudamos a estratégia durante a prova", explicou Ricciardo. A exemplo do companheiro, faria dois pit stops em vez de somente um, como a maioria.

Optou por uma estratégia ousada, ao largar com pneus duros diante de médio de quase todos. Mas parou cedo, ainda na 15.ª volta de um total de 52, o que significa que teria de ir até o fim, ou seja, completar nada menos de 37 voltas com o jogo de pneus médios.

Com o talento, a sensibilidade, a competência para administrar o ritmo, sempre em alto nível que tem, para ele foi possível, daí o excelente e merecido pódio, o quarto, sem considerar o segundo lugar na estreia na Red Bull, na Austrália, depois tolhido, por irregularidade no consumo de combustível. Além do desempenho notável mantém a simplicidade original como pessoa, o que o torna ainda melhor.

Jenson Button - 9
Correu com a faca entre os dentes depois de Ron Dennis, sócio da McLaren, afirmar que ele precisaria, aos 34 anos e agora 256 GPs de experiência, pelo menos vencer o companheiro de equipe, o estreante Kevin Magnussen, de 21 anos.

O grande problema nessa relação entre Dennis e Button é o valor do contrato do piloto, estimado em 12 milhões de euros  (R$ 41 milhões) por ano. Ele foi campeão do mundo em 2009, com a Brawn-Mercedes.

As ameaças de Dennis têm por objetivo chamar a atenção de algum grande piloto para a McLaren. Deixa claro que há vaga no time. Não nega que adoraria ter Hamilton ou Alonso de volta, mas como sabe que em 2015 não será possível, deverá ficar com Button. Mas pagando metade do que ele recebe hoje.

A Honda está disposta a investir num medalhão, como os citados, mas eles não estão hoje livres e a McLaren-Honda representa, ainda, apenas uma promessa. Não há, ao menos nesse momento, garantia de que terá um carro competitivo em 2015.

Sobre o fim de semana da Button, como sempre acontece nas condições de mudança do estado de aderência da pista, interpretou melhor que quase todos o fim da sessão de classificação. Daí o terceiro tempo. E correu domingo no limite do que o modelo MP4/29-Mercedes poderia produzir para ser quarto.

Pode parecer ingrato, mas às vezes um comentário como o de Dennis a respeito de Button gera respostas como a de Silverstone, acima do que o próprio piloto espera. Com o tempo, o piloto pode perder um pouco a noção do seu limite e, sem saber, passa a trabalhar abaixo dele. O Button de Silverstone não foi o de Spielberg. Com toda certeza. Fez bem para o seu futuro na F1 ouvir o que Dennis falou.

Sebastian Vettel - 9
Pela primeira vez desde que compete pela Red Bull o vi reclamar da equipe publicamente. "Com essa estratégia não daria para fazer mais que um quinto lugar", afirmou, sem esconder a insatisfação. O exemplo estava do seu lado. Ricciardo mudou dos dois pit stops originais para um enquanto Vettel manteve a estratégia inicial de duas paradas.

E com o mesmo carro, sem enfrentar dificuldades técnicas, como na Áustria, por exemplo, mais uma vez Vettel viu o companheiro se classificar na sua frente. No caso do GP da Grã-Bretanha com um agravante: Ricciardo largou em oitavo e chegou em terceiro. Já Vettel saiu da segunda colocação no grid, depois de ótima percepção na classificação, para receber a bandeira apenas em quinto.

Também pela primeira vez Vettel revelou no paddock desconforto com o melhor resultado de Ricciardo. Depois de nove provas, Vettel abandonou na Austrália, em Mônaco e na Áustria, o que explica em grande parte a diferença de pontos entre ambos, 98 para o australiano, terceiro no Mundial, e ele, 70, sexto. Mas os problemas com o equipamento não justificam tudo. Vettel disputa uma temporada pior que a de Ricciardo até agora. Para a surpresa da maioria.

Fernando Alonso - 10
Posso imaginar as reações contrárias ao meu 10 para Alonso. Afinal, também cometeu um erro elementar ao parar a Ferrari dois metros adiante do local indicado no grid na segunda largada.

Na minha análise, e cada um tem a sua, o que faz a graça desses debates, diante do desempenho impressionante de Alonso ao longo das 52 voltas, com um carro visivelmente mais lento que o da Red Bull e da McLaren, em parte da prova, não tenho como não lhe atribuir a avaliação máxima.

Na 25.ª volta de um total de 52, Alonso fez o seu pit stop. Trocou os pneus duros pelos médios. Era o quinto colocado, depois de largar em 16.º. Vettel era o sétimo. Nessa volta Vettel, sétimo, ultrapassa Kevin Magnussen, McLaren, em assume o sexto lugar.

O alemão da Red Bull faria a segunda parada na 33.ª volta (estratégia de dois pit stops, a primeira foi na décima volta) e sai com os pneus médios novos imediatamente na frente de Alonso. O espanhol aproveita os pneus frios, o passa e volta a ficar em quinto. Daí até a 46.ª volta, quando Vettel o ultrapassa na veloz curva Copse, Alonso manteve o tetracampeão do mundo atrás, advertido quanto aos limites da  pista.

Para se ter uma ideia de quão mais rápido poderia ser Vettel, três voltas depois de ganhar o quinto ligar de Alonso já havia aberto 4 segundos de vantagem, ou seja, mais de um segundo por volta. 

Curiosamente não é nas classificações que Alonso expressa o seu melhor, ainda que seja muito rápido. Mas em corrida, o que é capaz de fazer, com um carro limitado, como tem sido nos últimos anos na carreira, é algo excepcional.

O campeão do mundo de 2005 e 2006, pela Renault, tem elevado grau de rejeição, em especial no Brasil. Trata-se de um profissional de personalidade difícil, onde o mundo tem de gravitar ao seu redor. E essa imposição por onde passa, ao menos tenta implantar, cria momentos de excrecência na relação com os companheiros. Nada questionável, tudo procedente.

Mas negar a capacidade de Alonso de trazer resultado às equipes por onde passa é não permitir que a repulsa que seu comportamento por vezes gera seja deixada de lado para a análise fria do seu desempenho.

Kevin Magnussen - 8
Tenaz, inteligente na classificação, a ponto de largar em quinto. Aproveitou bem o seu conhecimento dos seletivos 5.891 metros de Silverstone e disputou grande prova. Como sempre, foi duro, mas leal, nos duelos, ainda que breves. Soube explorar um momento de melhor comportamento do deficiente modelo MP4/29-Mercedes da McLaren.

Nico Hulkenberg - 6
Não tem demonstrado nas últimas corridas o mesmo desempenho contundente de outras oportunidade, ou mesmo na classificação, sábado, quando aproveitou bem a condição da pista para obter ótimo quarto tempo.

A Force India desenvolveu com menor eficiência o modelo VJM07-Mercedes que os concorrentes. Está ficando para trás. E Hulkenberg não apresentou nenhuma superperformance como fez na segunda metade do ano passado, na limitada também Sauber-Ferrari. Em Silverstone largou em quarto e terminou em oitavo.

Daniil Kvyat - 8
O menino russo da Toro Rosso foi combativo durante todo o fim de semana, dos treinos livres à corrida, passando pela boa classificação, sábado, nono. E acabou na nona colocação também domingo.

Mais rápido que o companheiro, Jean-Eric Vergne, o tempo todo, está fazendo o francês pensar o que vai fazer da vida no ano que vem. Kvyat demonstra bem mais potencial para crescer na F1.

Jean-Eric Vergne - 6
De novo, a referência para analisar o seu trabalho é comparar com o que faz Kvyat. E claramente no GP da Grã-Bretanha, como de modo geral este ano, o francês perde a disputa. Largou em décimo e recebeu a bandeirada em décimo.

Como este é o terceiro ano de Vergne na Toro Rosso e se mostra menos capaz que um jovem estreante, com o mesmo carro e tratamento, Helmut Marko, responsável pelo programa de jovens talentos da Red Bull, a essa altura já começou a pensar quem poderá substituí-lo em 2015.

A não ser que Vergne dispute uma segunda metade de temporada muito, mas muito melhor que a primeira e passe a mensagem de que pode vir a ser um piloto potencialmente capaz de ganhar corridas com o equipamento certo.

Felipe Massa - 4
Errou feio na sexta-feira, no início dos trabalhos da Willliams na corrida de casa, em Silverstone. Para um piloto que completava 200 GPs no fim de semana, e tendo feito exatamente a mesma coisa um ano antes, no mesmo local, com a Ferrari, seria de se esperar que não mais cometesse equívoco semelhante.

Como a Williams fez um trabalho de desenvolvimento excepcional este ano com o modelo FW36-Mercedes, capaz, agora, de permitir ser rápido em qualquer tipo de pista, o erro de sexta-feira não comprometeria o resultado do fim de semana. Bottas não treinou sexta-feira de manhã, por ceder o carro para Susie Wolff, e fez o que fez na corrida. Mas Massa acabou envolvido no acidente de Raikkonen.

A impressão que Massa passa para quem conversa profissionalmente com ele nos autódromos, este ano, é que está trabalhando num padrão de energia equivocado, por mais enigmática, mística ou mesmo subjetiva que possa parecer a afirmação.

As coisas que acontecem com ele parecem ter a ver com a forma como encara a competição. Bottas mantém a faca entre os dentes, dentro e fora do carro. Compreensível, vai completar 25 anos, tem tudo a provar.

Massa, apenas quando está sentado no cockpit. Não parece ter mais o foco exclusivamente no seu trabalho, ainda que a carga de dedicação seja a mesma de sempre. É também uma reação natural de quem experimenta a sua 12.ª temporada na F1. Como com Button, às vezes o piloto pensa que está dando o seu máximo e não está. Há mais o que oferecer.

O desempenho de Button em Silverstone não está relacionado apenas a maior adaptação do ineficiente carro da McLaren à pista, mas a sua postura distinta depois da crítica de Dennis. O inglês quis responder ao chefe. E descobriu que poderia dar mais. Faz sentido acreditarmos que produzirá mais daqui para a frente este ano.

Com Massa a impressão é de ocorrer o mesmo. O piloto tem hoje, aos 33 anos, outras áreas de interesse além da F1. E sugerem ocupar espaço dentro da sua mente. Roubam energia preciosa. A sequência de eventos desfavoráveis, essa vulnerabilidade a acidentes ou incidentes, provavelmente decorre dessa postura um pouco equidistante do maior desafio que o cerca: ser hoje piloto da segunda força da F1, a Williams-Mercedes.

O momento é de reação. Talvez rever a escala de prioridades. Massa já trabalhou com psicólogo. Aventar sequer essa possibilidade, hoje, na condição de principal piloto da Williams, status do momento da contratação, ao menos, seria desejar demais. Mas se for capaz de uma análise fria do que se passa, e essencialmente que tem responsabilidade em quase absolutamente tudo o que vive na F1, voltaria a buscar ajuda profissional.

E já seria meio caminho andado para reverter um quadro que começa a colocar em xeque sua real capacidade de produzir no nível de uma organização que dá a impressão de só perder, agora, para a Mercedes. Massa terá de estar a altura do que a escuderia lhe oferece. Nesse momento, não está.

Organizadores do GP da Grã-Bretanha - 3
Devem estar loucos, só pode ser isso. Paralisar a corrida para reparar um guardrail apenas amassado, pelo que ouvimos no paddock. Seus postes de fixação não foram abalados, segundo ouvi. E as chances de outro impacto naquele ponto eram mínimas.

É muito preciosismo. O mundo interessado na F1 ficou uma hora sem o evento na TV. Uma porcentagem não desprezível não voltou para acompanhar a corrida depois. E os 120 mil fãs no autódromo? Se querem pensar dessa forma, o que dizer de existir apenas um helicóptero UTI disponível?

Um acidente pressupõe quase sempre o envolvimento de mais de um piloto. Se ambos apresentarem uma hemorragia tratável apenas num ambiente hospitalar com mais recursos dos existentes no autódromo? Escolhe quem vai morrer?

O amassado no guardrail não foi motivo para alterar tanta coisa como é o caso de dar uma nova largada uma hora depois. Mesmo pensando exclusivamente na questão do risco.

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