Topo

Fórmula 1

Futuro de Raikkonen na F1 será decidido nos próximos GPs

Livio Oricchio

Do UOL, em Nice (França)

11/07/2014 12h37

Gerard Lopez, sócio da Lotus, sabia dos riscos de assinar contrato com Kimi Raikkonen para disputar as temporadas de 2012 e 2013. Por essa razão o piloto finlandês receberia por produção, pontos conquistados, 50 mil euros (R$ 170 mil), mais um fixo, estimado em 2 milhões de euros (R$ 6,8 milhões) por ano. Raikkonen permaneceu distante da F1 nas duas temporadas anteriores.

O que Lopez e muita gente na F1 não imaginavam é que o campeão do mundo de 2007, pela Ferrari, seria tão eficiente. Venceu corridas, foi muitas vezes ao pódio e chegou a ter chances de ganhar o campeonato, o que o fez elevar bastante a sua conta bancária.

Quando Raikkonen assinou com a Ferrari, em setembro do ano passado, colegas, técnicos e profissionais em geral da F1 acreditaram que faria o competente companheiro de equipe, Fernando Alonso, suar mais o macacão do que com Felipe Massa, com quem trabalhava na Ferrari desde 2010. O finlandês estava em grande forma.

Mas depois das nove etapas este ano, Raikkonen simplesmente desapareceu das manchetes. Ou melhor, é lembrado por estar produzindo menos de quando a Ferrari o dispensou, no fim de 2009, mesmo tendo um ano de contrato ainda, para assinar com Alonso.

"Não há nada de anormal. Nosso carro é lento e suas reações são opostas às que eu gosto para pilotar. Quando o melhorarmos os resultados vão aparecer", disse Raikkonen, no Canadá. E demonstrou irritação na entrevista ao lhe perguntarem se estava desestimulado. "Você não sabe o que está falando. Se eu não tivesse interesse não estaria aqui."

Estatística muito desfavorável

Os números são cruéis com Raikkonen este ano. Da abertura do Mundial, na Austrália, dia 16 de março, até a corrida de Silverstone, domingo, nona do calendário, somou apenas 19 pontos, 12.º entre os pilotos. Suas melhores colocações foram dois sétimos lugares, em Melbourne e Barcelona.

Nas mesmas nove provas Alonso somou 87 pontos, quarto no Mundial, sendo que no GP da Espanha chegou ao pódio, terceiro, mesmo com o deficiente modelo F14T da Ferrari. O espanhol tem essa característica, mesmo com carros ruins é capaz ainda de obter alguns bons resultados. Raikkonen, a exemplo de Massa, sofre muito mais.

A Ferrari soma 106 pontos entre os Construtores, ocupa o terceiro lugar. A líder é a Mercedes, com 326. Alonso contribuiu com 82,07 % dos pontos. A participação de Raikkonen é bem mais modesta, 17,92 %.

Na disputa pela melhor colocação no grid a vantagem de Alonso também é grande: 7 a 2.

O ex-piloto e atual sócio e diretor da equipe Mercedes, Niki Lauda, comenta: "Kimi não esqueceu como se pilota. No ano passado ganhou corrida. O carro da Ferrari não reage como ele gosta e por essa razão não consegue ser rápido. Medimos as diferenças aqui em no máximo em décimos de segundo, e isso aparece".

O novo diretor da Ferrari, Marco Mattiacci, afirma que Raikkonen não o preocupa. "Kimi voltará a ser rápido", diz. "Basta ter os meios."

A realidade, porém, é outra. O italiano está mexendo em várias áreas da escuderia a fim de que todas, sem exceção, produzam mais. "Esse é o caminho para voltar a disputar títulos", afirmou em Silverstone. E os pilotos têm um peso bastante elevado nesse contexto.

Pior que Massa

Felipe Massa não teve o contrato renovado, no ano passado, pela mesma razão agora de Raikkonen, somar menos pontos do esperado. Em 2013, por exemplo, depois de nove etapas também, o atual piloto da Williams tinha 57 pontos diante de 123 de Alonso.

A contribuição de Massa para os 180 pontos da Ferrari até a nona etapa foi de 31,66%, quase o dobro de Raikkonen este ano até agora, 17,92%. Se Massa, de fato, já não atendia às expectativas, o finlandês menos ainda.

O impressionante nessa história é que Luca di Montezemolo, presidente da Ferrari, e o seu então diretor, Stefano Domenicali, chamaram Raikkonen da Lotus-Renault exatamente por sua regularidade em alto nível nas duas temporadas desde a volta à F1, 2012 e 2013.

Em 2012, Raikkonen obteve sete pódios, dentre eles uma vitória, no GP de Abu Dabi. Somou 207 pontos, diante de 281 do campeão, Sebastian Vettel, da Red Bull, e 278 de Alonso, Ferrari, segundo.

No ano passado, já em discussão com Lopez, por falta de pagamento, Raikkonen mesmo sem disputar as duas últimas provas conquistou 8 pódios, com vitória na Austrália, e 183 pontos. Vettel ganhou o título com 397 e Alonso, em segundo, somou 242.

O finlandês não disputou os GPs dos EUA e do Brasil por não ter recebido um centavo, como afirmou, o ano inteiro. Aproveitou a pausa para uma pequena cirurgia numa vértebra, atingida num acidente em Magny-Cours, França, ainda no seu tempo de McLaren-Mercedes (2002 a 2006), num treino particular.

Pagaram e não levaram

Voltando ao tema da Ferrari, Montezemolo e Domenicali compraram um produto e ainda não o receberam. O desempenho de Raikkonen na Ferrari é o oposto ao demonstrado na Lotus. É pior ainda daquele de Massa. Domenicali foi substituído por Mattiacci, da mesma forma por deficiência, depois do GP de Bahrein.

Por mais que proceda a alegação de Raikkonen, de que não consegue ser rápido com o modelo F14T, parece ser muito provável que a essa altura tanto Mattiacci como Montezemolo já deram uma olhada criteriosa no contrato com seu piloto.

A Ferrari o dispensou no fim de 2009, para ficar com Alonso, e se pudesse de novo trocá-lo por alguém que contribuísse minimamente com a equipe iria de acordo com o projeto de reestruturação já em curso coordenado por Mattiacci.

Não há desta vez um patrocinador interessado em contar com outro piloto na equipe, como foi o caso em 2009, quando o banco espanhol Santander pagou a multa contratual de Raikkonen para permitir a chegada do também espanhol Alonso, sem vínculo mais com a Renault. E não custou barato. Segundo se falou no paddock, 10 milhões de euros (R$ 34 milhões).

Montezemolo está identificando no seu piloto sinais semelhantes aos de 2009. Diante de não dispor de um carro veloz, regular, que lhe permita disputar as primeiras colocações, como fez na Lotus com brilhantismo dois últimos anos, Raikkonen acaba por se desestimular.

Perto de completar 35 anos, já disputou 201 GPs, venceu 20, foi ao pódio 77 vezes, largou em 16 ocasiões na pole position e, além do título mundial de 2007, acabou vice-campeão em 2003 e 2005, pela McLaren-Mercedes.

Iniciativa pode ser do próprio piloto

Tendo na mão o vigoroso extrato bancário, só da Lotus recebeu R$ 80 milhões nos dois últimos anos, parece possível que o piloto também começou a se perguntar: "O que é que eu estou fazendo aqui, se nem consigo me divertir com esse carro lento, desequilibrado. Lutar muito para eventualmente marcar algum ponto?" Mais: "A Ferrari vai demorar um pouco para superar a fase débil".

O momento de Raikkonen é tão desfavorável que nem mesmo se sabe se poderá participar do GP da Alemanha, próxima etapa do campeonato, de 18 a 20 em Hockenheim. Bateu forte ainda na primeira volta da prova de Silverstone e acabou se ferindo no tornozelo e joelho esquerdos. Foi substituído com sucesso pelo francês Jules Bianchi, da Marussia-Ferrari, nos testes desta semana no mesmo circuito.

Mudanças importantes

Mattiacci comentou que conversa regularmente com Raikkonen, que significa que o finlandês o ouve, porque falar não faz parte do seu elenco de ações. Procura estimular o finlandês, ao lhe contar que o coordenador do projeto de 2015 é o capaz inglês James Allison, com quem Raikkonen trabalhou na Lotus, e não mais o grego Nikolas Tombazis.

O responsável pela unidade motriz, ou seja o motor turbo V-6 de 1,6 litro e os dois sistemas de recuperação de energia, Luca Marmorini, está de saída da Ferrari também. Mattiacci ainda não contratou ninguém para a importante função. Convidou o inglês Andy Cowell, da Mercedes, mas os alemães reagiram, deram-lhe uma promoção financeira e o compromisso entre ambos se estendeu.

A Ferrari analisa as duas possibilidades: substituir Raikkonen ou respeitar o contrato e mantê-lo em 2015.  As próximas etapas vão responder qual será a escolha. Dependerá da reação do campeão do mundo de 2007, de provar ser possível confiar nele ainda.

Montezemolo pagaria nova rescisão

Se Mattiacci concluir que valerá a pena contar com sangue novo, alguém de talento, que desembarque em Maranello carregado de entusiasmo, convencerá sem dificuldade Montezemolo da necessidade de pagar uma segunda rescisão ao finlandês.

Qual a lista de candidatos para a vaga de companheiro de Alonso se Raikkonen deixar a Ferrari, considerando-se que o espanhol não levará adiante as conversas com Ron Dennis, sócio da McLaren hoje Mercedes, mas McLaren-Honda em 2015, como é provável?

O primeiro nome é Bianchi, já integrante da academia da Ferrari. Este ano tem realizado belo trabalho, ao somar os primeiros pontos da história dos novos times, com o nono lugar no GP de Mônaco. Mas há também o alemão Nico Hulkenberg, da Force India, que era a primeira opção caso a negociação com Raikkonen não desse certo no ano passado.

Button também poderia ser uma opção

Outra opção para a Ferrari que deve ser levada muito em consideração é a do piloto mais experiente da competição, Jenson Button, da McLaren-Mercedes, campeão do mundo de 2009, pela Brawn GP, sem contrato para 2015: tem 34 anos, 256 GPs, 15 vitórias e 8 poles.

Seu perfil atende a muitos dos pré-requisitos da Ferrari: ainda veloz, muito regular, de fácil trato, importante quando o outro piloto é Alonso, e com um bom carro o inglês somaria pontos com frequência.

Button é menos capaz de Alonso, mas ajudaria de forma efetiva na conquista do Mundial de Construtores. A responsabilidade maior para lutar pelo título de pilotos seria, em princípio, destinada a Alonso.

Fórmula 1