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Fórmula 1

Ricciardo: "Campeonato não acabou. Ainda posso ser campeão"

Livio Oricchio

Do UOL, em Monza (Itália)

06/09/2014 12h00

Se Nico Rosberg e Lewis Hamilton, líder e vice-líder do Mundial, ambos da Mercedes, pensam que o campeonato já acabou e, necessariamente, um dos dois será o campeão, este ano, Daniel Ricciardo, de 25 anos, da Red Bull, terceiro na classificação, agradece muito. 

Nessa entrevista exclusiva realizada em Monza, onde amanhã será disputado o GP da Itália, Ricciardo, a maior revelação da temporada, deixou bem claro o que pensa a respeito da luta pelo título: "Estou distante mais de duas vitórias de Rosberg, mas se sair aqui de Monza com alguns pontos as próximas etapas nos serão mais favoráveis. E se eu eu chegar no GP da Abu Dabi com uma diferença menor de 50 pontos do líder, então tudo pode acontecer, por que não?" 

É uma tarefa das mais difícies para o vencedor das únicas três corridas não vencidas pela Mercedes, este ano, Canadá, Hungria e Bélgica. "Mas matematicamente ainda é possível e tenha a certeza de que estarei atento o tempo todo", afirma Ricciardo. "Atribuir pontos em dobro na última prova redimensionou a disputa."

Ricciardo diz ter um exemplo dentro de casa para se inspirar, a conquista do primeiro campeonato do companheiro, Sebastian Vettel, em 2010, também na prova do Circuito Yas Marina, em Abu Dabi.

"Se eu estiver lá na condição de ainda poder ser campeão vou fazer como Seb (Vettel). Ele correu pensando apenas em vencer e somente depois da bandeirada procurou saber a colocação final dos adversários", explicou o australiano. 

Contra todas as previsões, diante dos números favoráveis de Fernando Alonso, da Ferrari, e Mark Webber, Red Bull, Vettel festejou o título. Depois do GP do Brasil, anterior ao de Abu Dabi, Alonso liderava o Mundial com 246 pontos, seguido por Webber, 238, e só então vinha Vettel, com 231. Havia 15 pontos de diferença entre Alonso e Vettel.

A Red Bull está tão feliz com o fato de ter revelado outro extraordinário piloto que Christian Horner, diretor da equipe, disse, rindo, em Monza aos eventuais interessados em Ricciardo: "Ele tem contrato até 2030".  

Ofuscou Vettel

O que impressiona no caso de Ricciardo, este ano, é o fato de estar vencendo ninguém menos de o tetracampeão do mundo, Vettel, na sua primeira experiência com um carro potencialmente vencedor. Depois de 12 etapas, o GP da Itália, amanhã, é o 13.º do calendário, Rosberg lidera com 220 pontos. Hamilton está em segundo, 191. E logo a seguir Ricciardo, 156. Vettel ocupa apenas o sexto lugar, com 98. 

Torna-se inevitável abordar a questão da disputa com Vettel. "Não posso falar por Seb, não sei o que é  o melhor para ele, o carro mudou este ano, talvez tenha ficado pior para o que gosta", comentou o australiano. 

"Posso falar por mim. Acredito que por ter vindo da Toro Rosso, o meu carro na Red Bull, hoje, mesmo sendo diferente do de anos anteriores, por gerar menos pressão aerodinâmica, ainda assim é, para mim, um grande carro."

Deu mais detalhes do porquê estar se dando tão bem. "Este ano, com o motor turbo e suas respostas violentas de potência, não sinto problemas ao comandar o acelerador, não me disturba a forma como a potência vem, é natural para mim." 

A maioria dos pilotos que compete com a unidade motriz da Renault reclama de a geração de potência não ser progressiva, desequilibrando o carro e ser a maior responsável por elevar o desgaste dos pneus.

"Talvez para Seb ter de fazer uma adaptação a tanta coisa nova e diferente seja mais difícil do que para mim. O que vivemos hoje não é uma grande diferença para o que eu tinha. E aprendi, também, que correr na frente é mais fácil, sinto-me bem melhor", falou o vencedor das duas últimas etapas, Hungaroring e Spa-Francorchamps. 

Explora melhor os pneus

Outro ponto destacado por Ricciardo para, como diz, "talvez" explicar a diferença para Vettel é como administra os novos pneus Pirelli, mais duros em relação a 2013. "Tem sido um dos meus pontos mais fortes este ano. Em geral exploro melhor os pneus, não apenas em velocidade, mas na sua preservação também. Em Spa foi muito legal estender a minha permanência na pista, mais do que imaginávamos, e ver que daria para fazer a corrida com dois pit stops."Vettel precisou de três paradas.

As séries de voltas de Vettel com o mesmo jogo de pneus são, quase sempre, menores que as de Ricciardo. "Volto ao discurso de me sentir à vontade no carro, confiante, toda curva você sente o que o carro está fazendo, isso ajuda a tratar melhor os pneus."

O diretor da Red Bull, Horner, lembra uma característica de Ricciardo comum aos grandes campeões. "É muito forte mentalmente." O jovem dirigente inglês destaca o mesmo em Vettel. Ricciardo reconhece a importância de não perder o foco e mesmo não se deixar abater pelas enormes pressões a que um piloto de F1 se submete. 

"Definitivamente sou bastante determinado. Cheguei na Europa com 17 anos com uma visão, um objetivo, acreditava em mim, claro, mas se eu achava que chegaria rápido onde estou? Não", diz o australiano.

Ele foi vice-campeão europeu de Fórmula Renault em 2008 (perdeu o título para Valtteri Bottas, hoje na Williams), campeão britânico de F3, em 2009, e vice-campeão da Fórmula Renault 3.5 em 2010, antes de estrear na F1 em 2011, na modesta HRT, no GP da Grã-Bretanha. "Tudo ficou mais fácil, para mim, quando entrei na academia da Red Bull (2008)", disse.

"Vim porque adoro correr. Mas sempre fiz as coisas certas, trabalhando muito, fisicamente, mentalmente. Alguns amigos, colegas saíam no fim de semana para beber, enquanto eu não, ia dormir cedo, repousar bem, sempre muito focado no meu sonho."

E dá uma dica a mais sobre o que pretende na F1. "Outra característica que tenho é a fome, muita fome." E especifica ser de conquistas.

Mais respeitado, agora

A relação com a Red Bull tem mudado com o sucesso no campeonato. "Sinto que sou, agora, mais chamado para discutir temas técnicos, eles conhecem melhor minha habilidade, não diria que não confiavam em mim, mas perceberam que sei o que estou falando."

Quando começou a realidade era outra. "Eu cheguei e Seb era o líder. Aprendi muita coisa com ele, trabalhamos bem, como um time, nossa relação é boa. Seb demonstra respeito por mim. Sei que ele adoraria ter vencido as três corridas que ganhei, sei que está trabalhando mais duro que nunca, dentro e fora da pista, na sua preparação, mas veio me cumprimentar depois de cada vitória, fez o mesmo com os meus engenheiros, disse que realizamos um belo trabalho."

Fora do ambiente da Red Bull o australiano reconhece estar sendo visto de outra forma. "No paddock bem mais pessoas se aproximam para dizer 'Olá Daniel'. E percebi que ganhei mais respeito de outros pilotos também, tive belas batalhas com pilotos top, como em Hockenheim e Budapeste. Quero me estabelecer no grupo dos melhores." Alonso o elogiou muito depois de duelar com ele. "Pela competência e lisura na pista", segundo o espanhol.

No GP da Bélgica, Ricciardo viu Rosberg e Hamilton se chocarem ainda na segunda volta, fator essencial para sua vitória. A pergunta é se até mesmo riu do ocorrido. "Para quem está do lado de fora, essa é talvez a impressão. Mas quando você vê dois caras na sua frente se baterem, o instinto é sair do local para não acabar envolvido. Só depois você vai pensar o que aquilo significou."

Apenas bem mais tarde ficou claro para Ricciardo o que se passou. "Eu desconhecia as consequências, só no meio da corrida soube que Lewis tinha ficado para trás. Na hora você pensa em sair da cena e diz a si próprio vai em frente, vai em frente, pode ser uma oportunidade, pode ser bom para você. Foi o que fiz sem refletir na hora."

Ricciardo se sente em casa, na Itália. O pai é siciliano e a mãe, calabresa. Vez por outra acompanham o filho de perto. "Estão aqui, sim. Mas preferem ficar na arquibancada, essa em frente aos boxes, na reta." O piloto da Red Bull tem contato com os parentes na Itália. "Com meus primos." 

Curiosamente, seu italiano não é muito fluente. "Entendo, de ouvir em casa e os dois anos de trabalho na Toro Rosso, mas ainda preciso estudar mais para falar." Ele nasceu e foi criado em Perth, no Oeste da Austrália.

Ser campeão este ano é, como afirma Ricciardo, difícil, porém não impossível. Agora, lutar pelo título no ano que vem é algo que o piloto dá como certo. A Renault já trabalha numa nova unidade motriz e o modelo será ainda concebido pelo genial engenheiro Adrian Newey.

Red Bull, campeã em 2015

"Estou realmente otimista com relação a 2105. Se olharmos para trás, até os testes de Jerez, em fevereiro,quando tínhamos imensas dificuldades, e analisarmos onde chegamos hoje veremos que nosso desenvolvimento foi impressionante". 

Ricciardo diz mais: "Acredito que no ano que vem teremos não apenas um carro rápido como confiável. Com um inverno melhor que o deste ano, como penso que será o caso, deveremos lutar pelo campeonato".

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