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Histórico de grandes rebaixados mostra que Série B pode não ser desastrosa para Palmeiras

Técnico Gilson Kleina leva as mãos à cabeça durante a partida contra o Botafogo - Ricardo Nogueira/Folhapress
Técnico Gilson Kleina leva as mãos à cabeça durante a partida contra o Botafogo Imagem: Ricardo Nogueira/Folhapress

Bruno Doro e Danilo Lavieri

Do UOL, em São Paulo

05/11/2012 11h00

Em 18º lugar no Campeonato Brasileiro, o Palmeiras lida, há meses, com o fantasma do rebaixamento. Se essa luta contra a degola, porém, não acabar em final feliz, os torcedores palmeirenses não precisam ficar tão preocupados. Historicamente, a queda para a Série B no Brasil não é o desastre que a maioria pensa. E a prova disso vem da análise histórica de outros rebaixados.

Corinthians e Vasco jogaram a Série B em 2008 e 2009, respectivamente. E hoje estão entre os times de maior sucesso nos últimos anos. O Corinthians é o atual campeão brasileiro e da Libertadores. E o Vasco, em 2011, ficou com o título da Copa do Brasil e foi vice-campeão nacional. Estranho? Não para quem analisa o mercado do futebol. Para entender esse fenômeno, o UOL Esporte ouviu especialistas que explicaram porque um rebaixamento pode ter um efeito positivo.

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Primeiro: reconstrução

Um dos motivos que fez com que os grandes rebaixados renascessem foi o efeito fundo do poço: ao serem rebaixados, os clubes chegaram a um momento catalisador para mudanças estruturais. Quem melhor exemplifica esse fenômeno é o Corinthians. Antes da Série B, o clube não aproveitava de maneira eficiente sua maior arma, o tamanho da torcida. Após o título de 2008 (e, claro, a chegada de Ronaldo), a marca Corinthians se tornou sinônimo de lucro.

“O Corinthians aproveitou um fato ruim, o rebaixamento, para revolucionar gestão, a maneira como lidava com o marketing e, um ano depois, usou o fundo do poço para se alavancar. O Bahia (que disputou a Série C em 2006) também fez isso. O Vasco não chegou a revolucionar, mas também viveu esse renascimento. É o momento que esses clubes usaram para se reinventar”, diz Amir Somoggi, consultor de marketing e gestão esportiva.

Os próprios números dos clubes mostram isso. Em 2008, mesmo com a diminuição significativa da quota de direitos da TV, o Corinthians divulgou uma receita bruta apenas 12% menor do que a de 2007. O grande salto, porém, veio em 2009, no ano do retorno, com salto de 54% nos rendimentos. No Vasco, o time chegou até mesmo a ganhar mais na Série B, com aumento de receita bruta de 63%.

PALMEIRAS E FLUMINENSE PROJETAM GUERRA DE NERVOS PARA DOMINGO

  • Dhavid Normando/Photocamera

    No próximo domingo, Presidente Prudente receberá a primeira grande decisão do Brasileirão de 2012. Além de poder definir o campeão, o jogo marcado para as 17h pode definir também mais um rebaixado. É nesse cenário que Palmeiras e Fluminense entram em campo em um jogo que os dois lados já preveem que terá um nervosismo diferente do comum.

FLU ESTÁ INVICTO CONTRA PAULISTAS

  • Fernando Donasci/UOL

    A campanha do Fluminense no Campeonato Brasileiro deste ano impressiona pela regularidade. Mas é contra as equipes paulistas que o aproveitamento do elenco comandado por Abel Braga é ainda mais marcante. Sem nenhuma derrota para times de São Paulo neste ano, o tricolor carioca somou 27 pontos em 33 possíveis. Aproveitamento de 81,8%, superior aos 71,6% do time em toda competição. E na próxima rodada, na partida que pode confirmar o tetracampeonato nacional, a equipe comandada por Abel Braga terá pela frente um Palmeiras 'desesperado'.

Para que o clube viva esse mesmo fenômeno, porém, precisa ter capacidade para aproveitar as oportunidades que surgirem. E esse é um desafio para o Palmeiras, que nos últimos anos peca justamente por seus problemas de gestão. “O maior problema é que (lucrar com a Série B) depende do projeto. Não pode achar que, espontaneamente, tudo vai se resolver porque o time foi rebaixado. Depende da gestão nesse momento. E todos nós sabemos que a gestão é, justamente, o problema atual do Palmeiras. Quando uma equipe grande é rebaixada, ela precisa ser muito mais agressiva para não sumir na Série B”, alerta Somoggi.

Segundo: exposição

Outro ponto que pode beneficiar o Palmeiras em uma eventual queda é o aumento da exposição. Sem a concorrência de rivais de mesmo tamanho, o alviverde seria a grande estrela de uma competição que é transmitida em canais abertos e fechados semanalmente.

“Esse é uma questão nova, que começou justamente com Palmeiras e Botafogo, em 2003. Sempre se esperou que a queda fosse traumática, mas isso não aconteceu. Todos os clubes que caíram voltaram nos braços da torcida, com maior exposição de mídia. Na Série B, esses times fazem boa campanha, transformam torcedor em parceiro e trazem a TV a reboque. A própria Globo transmitiu jogos do Corinthians, não é um absurdo imaginar que faça o mesmo com o Palmeiras”, opina Rafael Plastina, especialista em marketing e diretor da Nielsen Sports Brasil, braço esportivo da gigante global em pesquisas.

Ao contrário dos antecessores, aliás, o Palmeiras nem mesmo perderia dinheiro da TV disputando a Segundona. Quando o Clube dos 13 era o responsável por negociar os direitos de transmissão dos campeonatos, um clube rebaixado receberia, em média, 50% a menos. Agora, com os direitos negociados diretamente com a Globo por cinco anos, o valor é fixo, independente da divisão que disputa.

Terceiro: jogadores depreciados

O cenário até agora pintado parece ser perfeito. Mas nem tudo é tão bonito assim. Não é a toa que todos os clubes olham com pavor para um rebaixamento. Além da gozação a que os torcedores são submetidos, um detalhe assusta quem comanda um clube ameaçado pela degola: que time colocar em campo na Série B?

“Quando um time é rebaixado, seus jogadores perdem valor. É um critério muito objetivo. O valor de um jogador é calculado por alguns fatores e um deles é o efeito vitrine, que leva em conta o país em que joga, o torneio que disputa e o nível do time que defende. O Brasil é um país nível C. O Palmeiras, para o padrão Brasil, é nível A. Mas a Série B é campeonato tipo C. O impacto em jogadores de equipes desse nível ao cair para Segunda Divisão é de desvalorização de 9%. Se um time nível B cai, é de 14%”, explica Fernando Ferreira, diretor da Pluri Consultoria, que monitora o valor de atletas do futebol.

Por isso, não é incomum que times sofram uma debandada de jogadores quando o rebaixamento é confirmado. “Os jogadores têm os interesses próprios. Quando o vínculo com o clube não é tão forte, é claro que vão fazer pressão para sair. Os empresários começam a trabalhar nesse sentido para que seu produto não sofra desvalorização”, continua Ferreira.

Voltando a Corinthians e Vasco, os dois clubes usaram a mesma estratégia para lidar com esse problema: a parceria com empresários fortes. “Os dois sofreram êxodos de atletas e conseguiram montar seus times com jogadores do Carlos Leite, que apostou em uma valorização futura que acabou acontecendo”, lembra o diretor da Pluri. Como exemplo, Leite é o empresário de Mano Menezes, que foi para o Corinthians na Série B e hoje é técnico da seleção, e, entre outros, de André Santos, o lateral-esquerdo que disputou a Segundona pelo clube paulista, chegou a ser convocado para a seleção e hoje é atleta do Arsenal, da Inglaterra.

Quarto: relação com patrocinadores

Outro desafio a ser superado pelo Palmeiras é o relacionamento com os patrocinadores. Atualmente, o parceiro máster do clube é a montadora Kia. O acordo, um dos mais lucrativos do país, tem três anos, mas a cada ano precisa ser renovado. E, até agora, as negociações estão emperradas. O anuncio estava previsto para o fim do salão de automóveis, no dia 04 de novembro, mas empresa reluta em manter o acordo, pelos mesmos valores, com o time na Série B

“Esse é um problema comum. Muitas vezes, o patrocinador coloca cláusula de bonificação por título e, eventualmente, redução em caso de rebaixamento. Na maioria das vezes, porém, para o patrocinador é melhor não mexer no acordo para evitar um confronto perante torcida. É uma faca de dois gumes. A Sansung tentou isso e deixou o Corinthians. Depende do departamento de marketing trabalhar bem para conseguir o mesmo valor do patrocinador ou procurar uma nova empresa para apoiar o clube”, fala Amir Somoggi.

Quinto: fator Libertadores

Para completar, outro ponto que precisa ser lembrado é um verdadeiro trunfo para o Palmeiras: a disputa da Libertadores. Mesmo se for rebaixado, o Palmeiras terá pela frente o principal torneio do continente. “Os direitos da Libertadores não são significativos. O torneio paga menos, por exemplo, do que o Campeonato Paulista. Mas tem muito alcance, aumenta a exposição e, principalmente, a empolgação da torcida”, analisa Somoggi.

Até mesmo a desvalorização dos atletas acaba atenuada. “O caso do Palmeiras é bizarro. E a Libertadores conta muito a favor. Permite à torcida ter uma expectativa muito boa e, por causa dela, o time vai ser obrigado a se fortalecer. Se a equipe for bem, mantém o momento para a Série B, pode subir com facilidade, dá uma reviravolta na situação. Só que precisa ir bem. E todo mundo sabe o quanto é complicado ir bem na Libertadores”, alerta Ferreira.