Topo

Advogado da Lusa culpa desatenção de diretor por risco de rebaixamento

Vinicius Konchinski

Do UOL, no Rio de Janeiro

13/12/2013 06h00

Desatenção. É essa causa de uma das maiores polêmicas do futebol brasileiro nos últimos anos, segundo o advogado Osvaldo Sestário Filho.

Figura conhecida da Justiça Desportiva brasileira, foi o próprio Sestário quem representou a Portuguesa no julgamento do meia Héverton, dias antes da última rodada do Campeonato Brasileiro deste ano. O meia foi suspenso, mas acabou sendo escalado para o jogo da Lusa contra o Grêmio. Por causa disso, o clube corre o risco de ser rebaixado para a série B.

O presidente da Portuguesa, Manuel de Lupa, acusa Sestário de não ter avisado o clube da suspensão. Em entrevista ao UOL Esporte, o advogado deu sua versão sobre caso. Rebateu de Lupa e citou indícios de que a Portuguesa não deu a devida importância para a o julgamento de Héverton no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva).

Sestário conversou com o UOL Esporte na noite de quinta-feira, em seu escritório no centro do Rio de Janeiro. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:

UOL Esporte: O presidente da Portuguesa, Manuel da Lupa, disse que o senhor não informou a suspensão de Héverton.
Sestário: De ontem [quarta-feira] para cá, a Portuguesa mudou a versão dela. Primeiro, eles disseram que eu tinha avisado que Héverton tinha sido suspenso por um jogo só. Agora, estão dizendo que eu sequer avisei da suspensão, que eu não falei com o advogado. Ou seja, são duas versões antagônicas.

UOL: O senhor avisou?
Sestário: Eu liguei para o doutor Valdir [Rocha da Silva, diretor jurídico da Portuguesa]. Ele é meu contato há nove anos na Portuguesa. Falamos na sexta [dia do julgamento] e falamos no sábado. Inclusive, depois do início de toda essa polêmica, falei com o presidente da Portuguesa. Ele tem ciência do que eu falei para o doutor Valdir.

UOL: Tem prova de que falou com eles?
Sestário: Eu já pedi o registro dessas ligações. E também tenho o testemunho de uma advogada que trabalha no escritório comigo, que estava do meu lado quando eu liguei para o clube.

UOL: O senhor não poderia mostrar o registro da ligação no seu celular?
Sestário: Não. Eu recebi mais de 200 ligações só ontem. O registro já ficou para trás.

UOL: Avisou sobre os dois jogos?
Sestário: Claramente, eu falei sobre os dois jogos. Eu tenho a anotação de tudo isso. A pessoa que estava do meu lado confirma. Eu não tenho a menor dúvida disso. Tenho a consciência.

UOL: O senhor trabalha para mais de 30 clubes. Costuma comunicar resultado de julgamentos a todos os clubes por telefone?
Sestário: Sim. Isso é praxe. Quando há um julgamento, o clube costuma ficar em contato direto para saber do resultado o quanto antes.

UOL: O senhor não registra esse contato para evitar erros? Não manda um e-mail?
Sestário: Quando o tribunal oficializa a decisão, eu envio por e-mail. Quando o acórdão sai, dias depois, eu também envio.

UOL: E essa decisão vale a partir de quando? Da data do julgamento, a partir da notificação do clube?
Sestário: Existem dois entendimentos sobre isso. Não quero entrar nesse assunto porque isso pode ser matéria usada na defesa da Portuguesa.

UOL: Como foi o julgamento de Héverton? Ele foi julgado junto com Gilberto [atacante da Portuguesa]?
Sestário: Os dois foram julgados pelo mesmo motivo. O Gilberto foi julgado na segunda-feira. O Héverton foi na sexta-feira.

UOL: Ninguém da Portuguesa falou com o senhor antes? Pediram algum esforço para absolvição: ‘olha, queremos usar o Héverton no domingo’?
Sestário: Não. Fizeram isso com o Gilberto, acho que por ser o artilheiro do time. Chegaram a mandar o Gilberto para o Rio para o julgamento. No caso do Héverton, sequer ele veio aqui. Ele poderia pegar até quatro jogos de suspensão. Gilberto e Héveron estavam sendo julgados por ofensa a árbitro. Nesses casos, costumamos usar a presença do atleta para contrapor o que o árbitro descreveu na súmula. Acho que não deram a mesma importância ao Héverton. Se tivesse a mesma importância, teriam o mandado também. Ou então tentado um recurso contra a suspensão.

UOL: Por que o senhor não recorreu?
Sestário: Não foi pedido nada. Isso é uma decisão do clube.

UOL: A Portuguesa não se atentou para a suspensão de Héverton?
Sestário: A atitude deles demonstra isso. Eu informei e não disseram nada. O próprio fato de não ter enviado atleta corrobora para isso.

UOL: O que o senhor acha que isso vai dar? A Portuguesa escapa do rebaixamento?
Sestário: É possível. Eu já consegui vitórias em casos de jogadores suspensos por terem levado três cartões amarelos e foram escalados. Eu tive neste ano o caso de um jogador do Paysandu que jogou com contrato expirado contra o Naviraiense na Copa do Brasil. Nas comissões o Payssandu, foi condenado duas vezes. No STJD, eu consegui reverter.

UOL: Qual é o argumento nesses casos?
Sestário: Aí entra no mérito da questão. Não quero tocar nesse assunto.

UOL: Como o senhor se vê no centro dessa polêmica toda?
Sestário: Não tive nem tempo de refletir. A ficha ainda não caiu. Sei que estou desde ontem [quarta] dando muitas entrevistas e falando sobre o assunto. Sei que um determinado momento essa coisa vai passar. No começo, fiquei chateado com tudo isso. Passei quarta-feira muito mal. Tive apoio dos meus sócios e dos meus amigos, e agora estou tranquilo. O carinho das pessoas está me ajudando muito.

UOL: Sua família foi envoldida. Circulou na internet uma foto de sua esposa, junto com o senhor, ao lado do atacante Fred.
Sestário: Eu fico triste. Tenho duas filhas.  Elas estão preocupadas. Essa foto com o Fred foi tirada no tribunal. Já tirei foto com outros jogadores também. Todo mundo tem um time. Meu time de coração é o Londrina. Não é porque a gente tira uma foto com jogadores que isso quer dizer alguma coisa.

UOL: O senhor teme ter seu trabalho rotulado?
Sestário: Não tenho esse receio. Pelo contrário. Pelas manifestações que tenho recebido, posso dizer quer estão me dando os limões e eu vou acabar fazendo uma bela limonada.

UOL: O senhor pretende processar a Portuguesa?
Sestário: Eu sou advogado. Se eu tiver qualquer tipo de prejuízo, eu vou contra-atacar. Até agora, quem está sendo prejudicado sou eu. Eu estou sendo bode expiatório dessa situação. Quem está tendo a reputação e a vida toda mexida sou eu.

UOL: O STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) recebeu segurança especial da polícia nesta quinta, por causa de toda essa polêmica. O senhor está com medo ou se sentindo ameaçado?
Sestário: Não. Eu vi os policiais. Achei que eles iam ser testemunhas de algum processo. Quando há processo de invasão de campo, policiais dão testemunho.

UOL: Seu escritório trabalha para mais de 30 clubes. Como começou esse trabalho?
Sestário: Quando eu fui presidente do Londrina, eu sentia certa dificuldade de encontrar um advogado no Rio de Janeiro para nos representar. Um dia, como eu sou advogado, eu vim ao Rio defender pessoalmente um atleta. Depois, virei presidente da Federação dos Clubes da Série B, a FBA. Ali, passei a advogar para alguns clubes. Pensamos então num esquema para ajudar todos os clubes da série B. Em vez de mandar advogados, a gente poderia defender todos aqui. Essa coisa foi crescendo graças ao bom trabalho e passei a representar vários clubes.

UOL: Foi dito que o senhor era advogado indicado pela CBF.
Sestário: Não sou. Eu tenho um histórico da série B. Nós criamos um sistema para representar clubes. Eu já fui contratado da Federação dos Clubes da Série B. Quando a FBA acabou, eu passei a ter contrato com os clubes. Não há qualquer vínculo com a CBF. Com a Portuguesa, por exemplo, eu tenho contrato para prestação de serviços.

UOL: Não há conflito de interesse entre os clubes?
Sestário: Você pode perguntar isso a meus clientes. Quando há conflito de interesse, eu ligo para os clubes e indico advogados diferentes para que os clubes sejam representados. Tudo é pautado na ética.

UOL: O que os clubes que o senhor representa têm dito sobre tudo isso?
Sestário: Eu tenho recebido manifestações de vários clubes. De clubes para que eu estou advogando há quatro meses e de clubes para que estou advogando há nove anos. Todos estão me dando total apoio, prestando solidariedade total e dizendo que confiam no meu trabalho. Estou satisfeito com isso por essa confiança.

UOL: O senhor gostaria de defender a Portuguesa nesse caso da suspensão do Héverton [o clube rompeu com Sestário]? O julgamento está marcado para segunda-feira.
Sestário: Poderia ser, mas como eu não tenho mais nada com o caso, acho melhor não me envolver mais. E eu também já tenho um compromisso profissional. Tenho uma audiência no Tribunal Internacional do Esporte, em Lausanne, na Suíça. Ela já está agendada há muito tempo. Não poderia ajudar.

UOL: O que o senhor acha dessas acusações da Portuguesa contra o senhor?
Sestário: Só posso lamentar. A gente conversou depois do surgimento de tudo isso. Lembramos juntos das passagens da conversa que tivemos. Só posso lamentar.

CONFIRA OUTRAS DECISÕES POLÊMICAS DO STJD

  • 2004 - São Caetano - São Caetano punido com a perda de 24 pontos no Campeonato Brasileiro pela suposta escalação irregular do zagueiro Serginho, que morreu cerca de uma hora após desmaiar durante jogo contra o São Paulo, no Morumbi.

    2005 - Brasileirão - O Campeonato Brasileiro de 2005 vivenciou uma das maiores polêmicas do futebol nacional, quando foi descoberto que o árbitro Edílson Pereira de Carvalho havia manipulado 11 jogos por um esquema de apostas. A polêmica aumentou porque o STJD decidiu anular os 11 jogos e repeti-los novamente. O Corinthians tinha dois de seus jogos entre os 11. Não havia feito nenhum ponto nestes duelos, mas, com a repetição, fez quatro. Foi campeão com três pontos acima do Internacional, o vice-campeão.

    2008 - Grêmio - O zagueiro Léo foi punido com 120 dias de suspensão, o também defensor Réver pegou gancho de três jogos, e o atacante Morales não poderá atuar por oito partidas. Os três jogadores foram julgados por lances ocorridos na partida contra o Botafogo, no último dia 4, em que o Grêmio venceu por 2 a 1. Léo, que foi expulso na oportunidade, foi indiciado por chutar Jorge Henrique, do time carioca, sem a bola estar em disputa. Já Rever foi punido por empurrar o meia Carlos Alberto, e Morales era acusado de fazer falta violenta no lateral Alessandro.

    2009 - Coritiba - O Estádio Couto Pereira será interditado até serem atendidas melhorias de segurança a serem determinadas pela CBF. Depois de cumprida esta pena, passa a valer a cassação de 30 mandos de campo, válida para os jogos da Série B e da Copa do Brasil. Além disso, o clube terá de pagar multa de R$ 610 mil. Acabou cumprindo dez perdas de mando.

    2009 - Botafogo - Pego no doping, o atacante Jobson foi punido com dois anos pelo STJD. Porém, depois teve pena abrandada para seis meses. Ele foi flagrado pelo uso de cocaína em dois exames antidoping realizados na reta final do Brasileirão- contra Palmeiras e Coritiba.

    2010 - Canedense - A briga que envolveu torcedores da Canedense e jogadores do Vila Nova-GO deixou um jogador do time visitante queimado e fora dos gramados por 40 dias. Após a confusão, o STJD resolveu interditar o estádio por 30 dias.

    Mamoré 2010 - Vitinho foi escalado de maneira irregular em jogos do Módulo II e o Clube Patense foi derrotado. Os auditores entenderam que houve a irregularidade e por 8 votos contrários decretaram o Mamoré culpado e decretaram a perda de 7 pontos dentro do Módulo II.

    2010 - Grêmio Prudente- A equipe do interior paulista escalou o zagueiro Paulão em partida contra o Flamengo, pela 3ª rodada do Brasileirão, no final de semana. O problema é que o defensor havia sido suspenso pelo STJD na sexta-feira, e não poderia ter entrado em campo no Macaranã. A defesa do Prudente alegou que o tribunal só notificou o clube na segunda-feira, mas não houve conversa: o time teve três pontos subtraídos e ainda teve que pagar multa de R$ 1 mil. Paulão também foi julgado e corria risco de ser suspenso por um ano, mas foi absolvido.

    2011 - Rio Branco, do Acre, foi desclassificado da Série C do Campeonato Brasileiro 2011. O clube foi punido pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e, além da eliminação, teve que arcar com mais de R$ 13 mil em multas. O time infringiu o artigo 231 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) ao mandar um jogo na Arena da Floresta, que havia sido interditada.

    2013 - Carlos Alberto - Carlos Alberto, atualmente sem clube, foi condenado a um ano de suspensão por doping.

    2013 - Paysandu - Perda de seis mandos de campo e mais R$ 80 mil de multa pecuniária. O clube foi julgado na sede do órgão, no Rio de Janeiro, por conta dos incidentes que aconteceram na partida contra o Avaí, no dia 18 de outubro, no Estádio da Curuzu. Na ocasião, um grupo de torcedores bicolores arremessaram objetos ao gramado, inclusive bombas caseiras, e a partida foi encerrada pelo árbitro Grazianni Maciel Rocha aos 37 minutos do segundo tempo.