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Aranha diz ter dó de torcedora: "Não sei o que eu falaria para ela"

Do UOL, em São Paulo

01/09/2014 00h11

O goleiro Aranha, na última quinta-feira, foi alvo de insultos racistas durante o jogo entre Grêmio e Santos, pela Copa do Brasil. Durante o jogo, ele chegou a se voltar contra os torcedores e fez gestos, mostrando ter orgulho de sua cor. Mais do que isso, ele revelou neste domingo que estava preparado até para uma invasão de torcedores, caso eles se irritassem com a resposta do goleiro. Além disso, se disse satisfeito com o fato do vídeo com uma torcedora gremista ter sido divulgado.

“Vi (o vídeo) muitas vezes, Porque normalmente eles fazem isso escondido. Em um texto, falei que isso é um mal, e quando não se detecta ele se fortalece. Pode ser fatal. E eu fiquei satisfeito porque eles mostraram a cara", afirmou , em entrevista ao programa 'Fantástico', da TV Globo. A torcedora está proibida de ir a jogos do Grêmio, foi afastada do emprego e terá que depôr.

Aranha diz ter dó da torcedora e usou palavras fortes: “Eu tenho dó dela. Como ser humano e pelas consequências. Se ela for presa, ela não vai ter o tratamento que eu acredito que ela tenha fora da cadeia. Porque o sistema é pesado e cruel. E, mesmo no crime, tem certas regras e atitudes condenáveis Não sei o que eu falaria para ela. Mas sei o que não falaria. Não falaria o que ela disse para mim, não teria a mesma atitude", completou.

Aranha também revelou que estava preparado se torcedores quisessem agredi-lo: "Eu sentia que podia alcançar. Eles vinham na muretinha como se fossem saltar e vir para cima, e eu estava preparado. Para o que der e viesse", disse. Ao ser questionado se pensou que poderia ser atacado, disse: "Sim, por que não? A raiva que eles estavam, porque eles ficaram mais nervosos porque acharam que, como a maioria faz, como eu mesmo já fiz ali, até mesmo ano passado, a geste escuta e finge que não ouve", completou.

Para Aranha, ao racismo soma-se a vontade de ofender das pessoas. "Eles estavam satisfeitos em ferir daquela maneira. Alguns nem são racistas, mas foi a maneira que acharam para me ferir.", afirmou. "Não é só esse tipo de xingamento que há nos estádios. Xingam nossa mãe, as mães dos juízes. Eles acham que vão interferir no jogo ao fazer isso."

Aranha também explicou o que ocorreu ao procurar o árbitro Wilton Pereira Sampaio durante a partida, que só colocou na súmula o ocorrido no dia seguinte, por meio de um adendo. "Eu fui até o árbitro para mostrar que não era cera. Antes de falar com ele, me disse que eu estava insultando a torcida do Grêmio. Ele não ouviu, como muita gente não ouviu. Eu tentei argumentar que não era. Mas como ele não ouviu nada, manteve a postura de árbitro e ser firme, conduzir a parta. Quando meus companheiros chegaram juntos eu acho eu ele percebeu."

Depois, contou como os gritos começaram: "Eles fazem todo tipo de xingamento possível. Começaram a ser mais constantes, com um grupo maior. E eu fui me irritando. E quando começaram a emitir som de macaco não tive dúvida, estourei. Dava para ouvir o que falavam. Muitos palavrões e, no sentido de racimo, ‘preto fedido’, cambada de preto’, 'preto sem –vergonha'. E como estavam agasalhados pelo frio, era fácil falar sem aparecer."

O goleiro santista ainda chamou de “normal”, de forma negativa, o racismo no futebol. “Principalmente no Sul do país”, afirmou, sobre outras passagens em sua carreira. “Tive que ter muita frieza, como muitas pessoas no país, negras, têm. Porque é uma acusação muito grave e, se você não tiver prova, pode ser complicado. Se você quer se enquadrar na sociedade você tem que engolir muita coisa. Por fora, rimos das piadas. Por dentro, dói. É assim que as coisas funcionam há muitos anos, e se vai mudar, não sei.”

Ele também mostrou desejo de expôr a situação em razão de, por ser um nome conhecido, poder mostrar ao público a situação. "Quando acontece isso, graças a Deus e ao trabalho que faço, tenho condição de expôr para muita gente, e a sociedade cobra assim. Se não parar, pelo menos dá uma diminuída."

A partida de volta entre Santos e Grêmio está suspensa até o caso ser julgado. O trâmite no STJD deve durar 20 dias. Neste domingo, Aranha foi ovacionado pela torcida do Botafogo durante a derrota do Santos para o clube carioca no Maracanã, pelo Brasileiro.