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Torcedor comanda a Toca, espanta marias-chuteiras e ganha aluguel de Fábio

Torcedor do Cruzeiro, Buiú frequenta a Toca da Raposa diariamente há 25 anos - Luiza Oliveira/UOL
Torcedor do Cruzeiro, Buiú frequenta a Toca da Raposa diariamente há 25 anos Imagem: Luiza Oliveira/UOL

Luiza Oliveira

Do UOL, em Belo Horizonte

26/11/2014 15h03

Ele não é estrelado como os jogadores bicampeões brasileiros, nem tem o poder da diretoria celeste. Mas é quem comanda a Toca da Raposa II, ao menos do lado de fora. Há 25 anos, Buiú vai diariamente para o centro de treinamentos do Cruzeiro e já se tornou amigo dos jogadores com direito a ter o aluguel bancado pelo goleiro Fábio.

Buiú é uma espécie de autoridade na porta da Toca. Ele chega sempre duas horas antes dos treinos e vai embora só quando o último jogador deixa o local. Na portaria, ele organiza a entrada da imprensa, passa informações sobre horários de treinos e toma conta dos carros em dia de visita.

Como um bom anfitrião, ele põe a casa em ordem e não gosta de bagunça na porta do CT. Prova disso é que espanta as marias-chuteiras que aparecem por lá. “Tem dia que aqui fica cheio dessas meninas. E elas ficam querendo se aproximar, fica perguntando quem é solteiro, quem é casado, que horas que sai. Eu não dou confiança não e coloco todas para correr”, conta.

O zelo pelo clube aproximou Buiú da diretoria e dos jogadores. Muitos ajudam com roupas, camisas e dinheiro. Não é à toa que ele se veste bem, tem o tênis da moda e anda com óculos escuros.

O atleta mais próximo é o goleiro Fábio, a quem Buiú chama carinhosamente de papai. A esposa do goleiro, Sandra Maciel, virou a mamãe. Os dois costumam dar conselhos e já o levaram para a igreja que frequentam. Até dão bronca quando Buiú exagera na bebida e vai para a Toca alterado. “Ele fala para eu criar juízo”, ri.

Fábio se sensibilizou com Buiú, que morava na rua e dormia em um lote vago em frente à Toca, e decidiu pagar um aluguel para ele. Foram dois anos bancando a casa, até que o torcedor conseguiu ter condições de se manter e disse que não precisava mais da ajuda.

Hoje, Buiú se sustenta com o dinheiro que consegue como flanelinha e da aposentadoria que ganha por invalidez. Aos 13 anos, ele perdeu o braço direito em um acidente. Estava subindo no ônibus, quando o motorista arrancou, ele caiu no chão e a roda passou em cima do braço.

A dificuldade foi encarada de frente por ele que teve uma infância difícil. Não se relacionava bem com a família e fugiu de casa aos oito anos de idade. Andou de Santa Luzia, cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte, até a porta da Toca da Raposa I na região da Pampulha. Desde então nunca mais parou de acompanhar o Cruzeiro.

Ele conta que fez amizade com muitas personalidades que passaram pelo clube. De Ronaldo Fenômeno a Vanderlei Luxemburgo. E até com profissionais que hoje estão no rival como o técnico Levir Culpi e o diretor de futebol Eduardo Maluf.

O time que Buiú mais lembra com carinho é o de 2003 campeão da Tríplice Coroa. Em um dos jogos daquele ano, o lateral direito Maurinho comemorou um gol em homenagem a ele. Colocou um dos braços no lado de dentro da camisa e saiu correndo. Buiú, que estava na arquibancada, não segurou a emoção.

“Eu vi e sabia que era para mim. Estava comendo um tropeirão e tomando uma cerveja, que na época era liberada no Mineirão. Joguei tudo para o alto e fui para o banheiro chorar. Fiquei muito emocionado”.

A proximidade com o time era tão grande que no fim do ano ele foi convidado para a festa comemoração do título brasileiro. E se deu ao direito de extrapolar. “A gente tomou muita pinga naquele dia, eles me jogaram na piscina. Mas era merecido, né? Depois de trabalhar o ano inteiro”, conta, bem humorado se lembrando da turma que gostava de uma ‘bagunça’.

Com tantas lembranças dos times do Cruzeiro, Buiú espera comemorar mais um título da Copa do Brasil, nesta quarta-feira, diante do maior rival Atlético. E será mais um entre tantos que ele ainda pretende ver de perto. Isso porque da Toca ele não vai sair. “Isso aqui é a minha vida. Só saio morto daqui”.