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Inglaterra já dominou a Liga dos Campeões, mas tragédia encerrou a dinastia

Do UOL, em São Paulo

13/04/2015 06h00

Sem nenhum representante nas quartas de final da Liga dos Campeões, a Inglaterra não vive nem de longe os bons tempos de 20 anos atrás no torneio. Entre meados dos anos 1970 e inícios dos 1980, o futebol inglês teve uma era de glória, com seis títulos consecutivos – até hoje, um recorde na competição -, entre as temporadas 1976-77 e 1981-82.

Tudo começa com o período de Bill Shankly, no Liverpool. Foi ele quem montou a equipe que brilharia nos anos seguintes. Ao se aposentar em 1974, deixou com Bob Paisley, um de seus auxiliares – e ídolo do clube -, a responsabilidade de conduzir o time aos títulos. E não se decepcionou. Com um forte poder de liderança e um olhar cirúrgico para fazer contratações, o novo treinador entrou para a história do Liverpool e da Liga dos Campeões, ao ser o primeiro a levantar o caneco em três oportunidades (1976-77, 1977-78 e 1980-81).

Com grandes nomes do futebol inglês, Paisley montou dois times do Liverpool que dominaram as edições 1976-77 e 1977-78 da Liga dos Campeões. No primeiro título, ainda levou consigo muito dos jogadores e do estilo de jogo de Shankly. No segundo, no entanto, deu a sua cara ao time, trouxe nomes como o escocês Graeme Souness e seguiu colecionando troféus.

Vestindo a camisa do Liverpool entre 1978 e 1984, Souness conquistou cinco vezes o Campeonato Inglês e três Ligas dos Campeões. Somava-se a ele naquela fase de glórias da equipe outros dois escoceses: Alan Hansen e Kenny Dalglish.

A dinastia do time de Bob Paisley só foi interrompida por um fenômeno chamado Nottingham Forest, do técnico Brian Clough. Campeão de maneira surpreendente do Campeonato Inglês de 1978, o time chamaria ainda mais atenção ao desembolsar US$ 1,5 milhão (uma fortuna para a época) para contratar o atacante inglês Trevor Francis.

E foi liderado por Francis que o Nottingham Forest conquistou de maneira consecutiva duas Liga dos Campeões (1978-79 e 1979-80), em suas duas primeiras participações na competição.

O incrível feito resultou na consagração de Brian Clough. Até os dias de hoje, é considerado um dos maiores treinadores ingleses de todos os tempos. Sua história, que conta com uma rápida passagem fracassada pelo Leeds United, foi retratada no filme “Maldito Futebol Clube”.

Passado o furacão Nottingham Forest, o Liverpool ainda conquistaria a Liga dos Campeões em 1980-81, sobre o Real Madrid. Uma temporada depois, coube ao Aston Villa derrubar todos os prognósticos e, em sua primeira participação no torneio, bater o poderoso Bayern de Munique, que tinha em seu elenco a estrela Karl-Heinz Rummenigge, atual presidente do clube alemão. Chegava ao fim, assim, a dinastia inglesa na Europa.

Apesar de bons jogadores, Inglaterra acumulou fracassos nos anos 1970 e 1980 - Getty Images - Getty Images
Imagem: Getty Images

Uma dinastia que não se refletia na seleção

Enquanto Liverpool, Nottingham Forest e Aston Villa figuravam no posto mais alto do futebol europeu, a seleção inglesa acumulava vexames: não se classificou para a Eurocopa de 1976 e para a Copa do Mundo de 1978, além de uma eliminação ainda na primeira fase do torneio continental em 1980.

“Muitos ingleses se apegam à ideia da supremacia da Inglaterra muito depois disso ter deixado de ser verdadeiro. O espanto a cada vez que a Inglaterra não ganhava a Copa do Mundo só terminou com os abjetos fracassos da seleção nos anos 1970”, afirmam Simon Kuper e Stefan Szymanski, no livro “Soccernomics”, que ainda citam fatores sociais, culturais e históricos para explicar o porquê de a seleção inglesa acumular vexames.

“O país deixou de ser a potência econômica suprema do período vitoriano para estender a mão ao Fundo Monetário Internacional no final dos anos 1970. A posição do país entre as dez maiores economias nunca foi questionada. Mas no futebol, ficou claro em 1970 que a supremacia atravessara o Canal para o centro da Europa Ocidental. Durante os trinta anos seguintes, essa parte do continente foi a rede mais fértil do futebol. E a Grã-Bretanha ficou fora dela”, completa.

Apesar dos fracassos, a equipe da Inglaterra contava com grandes nomes em seu elenco, como o goleiro do Nottingham Forest Peter Shilton (jogador com mais convocações da história da seleção), os atacantes Trevor Francis, Kevin Keegan e o meia Bryan Robson, capitão durante nove anos.

Torcedor é carregado ferido no episódio que ficou conhecido como "A Tragédia de Heysel" - NICK DIDLICK/REUTERS - NICK DIDLICK/REUTERS
Imagem: NICK DIDLICK/REUTERS

Tragédia encerra domínio

Depois de seis anos de dinastia inglesa, o Liverpool chegava mais uma vez à final da Liga dos Campeões, em 1985, para enfrentar a Juventus, no Estádio Heysel, em Bruxelas, na Bélgica. Com um gol de Michel Platini, a equipe italiana conquistava o título e colocava ponto final na soberania inglesa. Mas não foi apenas por isso que aquele dia ficou marcado.

Pouco antes do início da partida, torcedores da Juventus foram agredidos por torcedores britânicos – foram permitidos que 200 “hooligans” ficassem no mesmo setor do estádio que os italianos. Com o pânico causado pela situação, os fãs da equipe da Itália tentaram deixar o local, o que resultou na queda de um dos muros de proteção e na morte de 39 pessoas por asfixia e esmagamento. Além disso, outras 600 ficaram feridas.

Por causa da tragédia, os clubes ingleses foram banidos das competições europeias por cinco anos – o Liverpool foi suspenso por seis anos. Fato esse que ajudou no fim da soberania inglesa na Europa. Soma-se a isso a mudança no estilo de jogo durante este tempo.

Se os clubes ingleses se posicionavam sempre no tradicional 4-4-2, fazendo uso da força e do “chuta e corre”, a partir de 1985, já sem eles na competição, deu-se início o retorno da supremacia latina, com um futebol mais veloz e melhor tecnicamente. Além disso, a reabertura do mercado para estrangeiros na Itália ajudou no fortalecimento do futebol por lá e colocou representantes do país em nove finais nos 12 anos seguintes, com quatro títulos.