Topo

Sede da final europeia é berço de guru soviético fã da "folha seca" de Didi

Caio Carrieri/Colaboração para o UOL
Imagem: Caio Carrieri/Colaboração para o UOL

Caio Carrieri

Colaboração para o UOL, em Kiev (UCR)

24/05/2018 11h00

Quando Andriy Shevchenko conquistou a Liga dos Campeões com o Milan, contra a Juventus, no Old Trafford, em 2003, ele voltou a Kiev (UCR), sua cidade natal, decidido a fazer uma homenagem. Por isso, visitou o cemitério de Baikove e colocou sobre um túmulo a medalha de campeão. Na lápide, duas palavras carregam um significado especial para o atacante, a Ucrânia e a antiga União Soviética: Valeriy Lobanovskyi.

Em 33 anos como treinador, Lobanovskyi moldou o futebol ucraniano. Venceu oito títulos soviéticos, seis Copas da URSS, cinco Campeonatos Ucranianos, três Copas da Ucrânia e duas Copas dos Campeões da Europa – a de 1975, diante dos húngaros do Ferencváros, foi a primeira conquista continental de um time soviético, do Dynamo de Kiev, o clube mais vencedor da URSS.  Mais do que um currículo recheado de títulos, o Coronel inovou na abordagem do futebol no país.

Os times de Lobanovskyi são considerados a versão comunista do futebol total de Rinus Michels e Johan Cruyff, que surgiu na Holanda praticamente ao mesmo tempo, na década de 70. A essência passava pela marcação pressão nos adversários, troca rápida de passes, constante mudança de posição dos jogadores e atenção especial à ocupação de espaços. Enquanto a geração de Cruyff esbanjava qualidade técnica, os pupilos de Lobanovskyi se destacavam pela grande imposição física.

Matemático e formado pelo Instituto Politécnico de Kiev, ele também introduziu a prática de monitoramento de condição física dos atletas por computador. Jogador profissional até os 29 anos, tinha prazer em estudar os jogadores brasileiros do fim dos anos 50. Conhecido pelas cobranças de escanteio e os chutes de efeitos venenosos  com a perna canhota, nutria admiração especial por Didi, bicampeão do mundo em 1958 e 1962. Assim, desenvolveu a própria versão da “Folha Seca”, arremate característico do ídolo do Botafogo que tornava a trajetória da bola imprevisível.

Vice-campeão europeu no comando da URSS diante da Holanda em 1988, ele deixou o comando da seleção após atuação desanimadora na Copa da Itália, em 1990. Passado o período nos Emirados Árabes, retornou à Ucrânia seis anos depois para dirigir o Dynamo de Andriy Shevchenko, prata da casa.

Um ano antes, no entanto, o clube havia sido suspenso de competições europeias por três temporadas por ter tentando subornar o árbitro espanhol Lopez Nieto no confronto com o Panathinaikos, da Grécia. A sanção, porém, foi suspensa após 12 meses com o argumento de que poderia limar o desenvolvimento do futebol ucraniano. Uma clara demonstração de poder e da dimensão do Dynamo no país.

Shevchenko em jogo contra o Real Madrid, pelo Dynamo de Kiev - AFP PHOTO - AFP PHOTO
Imagem: AFP PHOTO
Na sequência, Lobanowskyi levou o time à semifinal da Liga dos Campeões de 1999, com o brilho de Shevchenko, artilheiro do torneio com 8 gols. O hoje técnico da Ucrânia dividiu o posto de goleador com Dwight Yorke, campeão pelo Manchester United.

Ele morreu em maio de 2002, aos 63 anos, e milhares de pessoas foram às ruas prestar tributo no dia do funeral. Na região central de Kiev, o estádio do Dynamo leva o nome de Lobanovskyi, que também tem uma estátua em grande destaque na entrada. A final da Liga dos Campeões, no entanto, será disputada no Estádio Olímpico, que passou a ser utilizado pelo clube que o guru soviético revolucionou.