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Neymar destoa da seleção e repete discurso da Rio-2016 "contra haters"

João Henrique Marques, Danilo Lavieri, Dassler Marques, Pedro Ivo Almeida e Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo e São Peterburgo

22/06/2018 21h00

Poucas vezes uma seleção brasileira chegou a uma Copa do Mundo cercada de tanta paz e estabilidade como a de 2018. Da preparação a este início de competição, o grupo encabeçado por Tite é marcado pela postura serena, uma relação aberta e amistosa com a imprensa e um comportamento politicamente correto dentro dos gramados. A exceção é Neymar, camisa 10 e referência técnica do time.

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Mesmo depois de uma estreia abaixo do esperado, o Brasil conseguiu manter a calma. Polêmicas com arbitragem, por exemplo, foram debatidas por Tite e jogadores sem fervor, em tom de aceitação. Dentro da Copa do Brasil, entretanto, existe um universo à parte. A Copa de Neymar tem sido cercada de tensão, com debates de diversas ordens, xingamentos a árbitros, choro e recados aos críticos, ecoados por amigos e seu entorno. É quase uma repetição da narrativa das Olimpíadas de 2016.

Lutando para encontrar seu ritmo depois de três meses afastado dos gramados com uma lesão séria, Neymar foi alvo de críticas e de dez faltas no empate contra os suíços. A caça dos adversários se repetiu nesta sexta, contra a Costa Rica. Contrariando as orientações expressas de Tite e sua cartilha (o treinador vem sendo comedido nas críticas à arbitragem, e insistindo que seus atletas se distanciem do tema), foi flagrado irritado, xingando com palavrões o juiz e os rivais por mais de uma vez.

A atuação foi marcada pela falta de ritmo, mas o gol veio aos 52 minutos do segundo tempo, acompanhado de choro e abraços dos companheiros. O que se seguiu a partir daí foi o retrato detalhado do paradoxo que se tornou o Mundial do Brasil, seleção e Neymar.

Enquanto um sorridente Tite brincava com a imprensa na sala de coletiva e exaltava o segundo tempo brasileiro, subia nas redes sociais do camisa 10 brasileiro uma resposta forte a críticos não nominados. “Falar, papagaio fala”. Minutos depois, na zona mista, em meio a elogios à vitória por 2 a 0, Coutinho e Gabriel Jesus falaram sobre a alegria de Neymar. O companheiro preferiu passar calado e evitar o contato com a imprensa.

De um lado, o discurso de calma, tranquilidade e evolução do time. Do outro, tensão e uma revolta reprimida que extravasou em choro e a preocupação em responder aos “haters”.

Craque consome críticas e amigos ajudam no contra-ataque

Neymar trata as críticas que recebe como algo que beira o insuportável. É consumidor contumaz de noticias, e em grupo de Whatsapp com amigos recebe vídeos de programas de televisão no Brasil com comentários sobre sua atuação. Em alguns momentos, chegam notícias falsas sobre sua carreira tratando de intrigas com outros jogadores.

O brasileiro passa longe do ex-colega Messi, conhecido por ignorar transmissões de futebol ou programas de mesa redonda. A televisão de casa em Paris está ligada em jogos ou programas de esporte no Brasil mesmo quando ele está reunido com os amigos em uma roda de pôquer. No celular, recebe informações de futebol por aplicativos.

Parças de Neymar se revoltam com críticas após vitória do Brasil - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Parças de Neymar se revoltam com críticas após vitória do Brasil
Imagem: Reprodução/Instagram

Os amigos podem ser considerados os termômetros da revolta do jogador. Os mesmos que enviam ao camisa 10 os conteúdos com críticas são os que usam as redes sociais pessoais para provocar os “anti-Neymar”.

Nesta sexta, veio do melhor amigo Gil Cebola a hashtag “chupabandodeanti”, logo que o jogo contra a Costa Rica acabou. Outros se voltaram contra Galvão Bueno por críticas feitas durante a transmissão da Rede Globo.

A revolta já passava por processo de fervura antes da partida, mas o uso de termos como “fominha” e “imaturo” em programas de debate esportivo no Brasil que tratavam sobre a estreia contra a Suíça elevou a mistura à ebulição.

Entorno repete narrativa da Olimpíada e espera resposta 

A frase “vai ser o mesmo que na Olimpíada” é repetida por várias pessoas próximas de Neymar durante a Copa do Mundo. Foi construído um cenário de perseguição, que tem como desfecho ideal a superação da adversidade por meio de uma conquista que cale os críticos.

Na Rio-2016, ao passar em branco nos dois primeiros jogos do Brasil – empates por 0 a 0 contra África do Sul e Iraque -, Neymar orientou todo o grupo a não conceder entrevista na zona mista do gramado e saiu emburrado para o vestiário. Desta vez, contra a Costa Rica na Copa do Mundo, a distância da imprensa é algo individual: “Hoje não”, disse.

A história olímpica terminou em medalha de ouro, seguida de lágrimas muito parecidas com as derramadas nesta sexta-feira. Os críticos, porém, não foram esquecidos. O monólogo de Galvão Bueno após o empate contra o Iraque, na fase ruim, chegou a abalar a relação do narrador e da Globo com o estafe do jogador. Liderados por Neymar, os jogadores também lembraram de Neto, comentarista da Band, que criticou bastante o grupo. Após o ouro, o campeões fizeram um "medalhaço", postando mensagens ironizando o ídolo corintiano. 

Os próximos passos do brasileiro no Mundial irão mostrar se o choro e o gol em São Petersburgo foram suficientes para furar a bolha de tensão que tem cercado Neymar na Rússia. Na próxima quarta, às 15h, o Brasil enfrenta a Sérvia precisando da vitória para avançar como líder do Grupo E. Embaixador do lema “ousadia e alegria”, o camisa 10 tem boa dose de responsabilidade por instaurá-lo na seleção. Em 2018, falta ele próprio se deixar contagiar.