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Copa 2018

Autor que chamou russas de 'putas' se explica: "é só um grupo que se vende"

Colunista do jornal Moskovskiy Komsomolets, Platon Besedin - Reprodução
Colunista do jornal Moskovskiy Komsomolets, Platon Besedin Imagem: Reprodução

Luiza Oliveira

Do UOL, em Moscou (Rússia)

07/07/2018 10h00

O colunista do jornal Moskovskiy Komsomolets, Platon Besedin, causou revolta ao chamar as russas de prostitutas em um artigo sobre o comportamento sexual das mulheres no período da Copa do Mundo. Dias depois, o jornalista se explicou. Para ele, o artigo não era contra a liberdade sexual, mas discutia a objetificação da mulher.

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Em contato com o UOL Esporte, Besedin falou sobre a repercussão do texto publicado no último dia 27. O artigo intitulado "A hora das putas: as russas se envergonham e envergonham o país na Copa" criticava as russas por se relacionarem com estrangeiros e "se venderem" no período do Mundial.

Besedin disse que sofreu assédio moral pesado com ameaças de mulheres. Ele usou o exemplo de Neymar para se defender. Segundo ele, o artigo falava sobre um grupo específico de mulheres, não sobre todas. Ele defende-se dizendo que seria o mesmo que dizer que alguém odeia todos os brasileiros apenas por fazer uma crítica ao atacante da seleção pelas simulações. Por fim, afirmou que o seu artigo representou uma agulha que perfurou uma bolha com pus, em relação aos problemas da sociedade russa atual. Confira a entrevista:

Mulher em frente a cartaz da Copa de 2018 - AFP/MARTIN BERNETTI - AFP/MARTIN BERNETTI
Mulher em frente a cartaz da Copa de 2018: nesse Mundial, russas já foram assediadas por torcedores, criticadas por jornais e ameaçadas por grupos extremistas
Imagem: AFP/MARTIN BERNETTI

Comportamento sexual das mulheres na Copa do Mundo

"Está tudo mais ou menos normal com a liberdade sexual das russas na Copa. Eu acho que as nossas mulheres estão felizes porque podem ter muitos contatos interessantes durante a Copa. E não tem nada de estranho, nem ruim nisso. Quem tenta ficar contra a liberdade sexual das russas, na minha opinião, está errado. A Rússia é um país livre com meninas muito bonitas. A outra pergunta é que essa liberdade frequentemente passa o limite. E quase sempre ela é relacionada com o dinheiro. Vou falar direto: muitas russas consideram a Copa um jeito de ganhar dinheiro. Fazendo sexo também. Isso é errado, por que isso cria uma imagem errada das russas fora do nosso país."

A liberdade sexual das mulheres

"A mulher pode fazer sexo com quem ela gostar. Isso não é pedofilia, necrofilia, zoofilia. Ela tem o direito de escolher o parceiro com quem quer fazer sexo. Ninguém pode criar uma regra para ela aqui. Eu sou contra a venda. Eu sou contra a percepção de uma mulher como um objeto sexual, como um brinquedo sexual. Infelizmente, a gente vê que no seu país e no nosso país este tipo da imagem está sendo criada. Na minha opinião, isso destrói a mulher como um indivíduo."

A repercussão do artigo

"O meu artigo é como uma agulha que perfurou uma bolha com pus. Alguém deveria fazer isso. Eu já estou falando sobre estes problemas há muitos anos. O mais importante é o fato que os russos se cansaram de tudo que eles assistem na TV, que mostra os exemplos viciosos e estranhos de comportamento. A moral que a mídia cria hoje em dia não é aceitável. Isso vai contra os valores da Rússia. E as pessoas entendem isso. O meu artigo não era sobre promiscuidade sexual ou sobre a prostituição das russas. Eu falei que o sistema de valores que está sendo criado hoje em dia no nosso país é vicioso. E ele é maldoso para a Rússia."

A petição das mulheres contra o autor e as consequências do artigo

"É o direito delas. No nosso país, cada pessoa pode fazer o que quiser. Claro, se não for proibido pela lei. A petição mesmo me pareceu estranha. Lá, as meninas apoiam os valores feministas, mas não tem nada de feminismo de fato. Ao contrário! Essa petição está rebaixando as próprias mulheres, porque as mostra como um produto. Além disso, no final do texto, essa petição se tornou uma crítica mal educada aos homens russos. Eu não tive consequências sérias por enquanto. Provavelmente vá ter no futuro. Mas sofri assédio moral bem agressivo. Recebi ameaças."

As críticas recebidas

"Eu não acho que tinha sexismo no meu artigo. O sexismo é discriminação das pessoas em relação ao sexo. Mas eu não falei que todas as russas são tão soltas. Eu falei sobre apenas um grupo específico de pessoas. Este grupo é criado não de acordo com o sexo das pessoas, mas de acordo com o comportamento. Jogar a culpa em mim por isso seria a mesma coisa que culpar uma pessoa por ter ódio em relação a todos os jogadores brasileiros quando essa pessoa, uma vez, comentou que o Neymar faz muita simulação. As acusações de sexismo me parecem extremamente estranhas porque no mesmo artigo eu condenei o comportamento agressivo de alguns homens russos. Particularmente aqueles que perseguem as russas porque elas saem com os estrangeiros. Essas perseguições são inaceitáveis."

O comportamento dos homens na Copa do Mundo

"Os homens se comportam de jeito diferente. Mas não podemos ver isso bem, pois recebemos mais homens estrangeiros na Copa em geral. Acho que as demandas aos homens e às mulheres sobre a moral sexual têm que ser iguais. Não podemos dizer que se uma mulher dorme com 100 homens está errada enquanto um homem que dorme com 100 mulheres está correto. O que eu não gostei dos homens nesta Copa é que eles começaram a perseguir as mulheres que, como eles acharam, se comportaram como putas. Isso não é aceitável."

A Rússia depois da Copa

"O comportamento das mulheres não é a consequência da organização da Copa. A Copa foi apenas um catalisador que mostrou os problemas. E estes problemas não foram criados pela Copa, mas foram criados pelo sistema de valores que está apoiado hoje na Rússia. Hoje, mostram na TV as putas que ensinam a se vender e serem vendidas. Isso não poderia passar sem as consequências. A moral desapareceu. Os valores estão destruídos. Criamos uma sociedade que apenas quer o sucesso. E um dos jeitos de fazer sucesso é se vender."

A importância da Rússia como sociedade conservadora

"A Rússia, claro, é um país conservador. Isso aconteceu de acordo com a nossa história e a civilização. Temos as nossas tradições. E isso é certo. A outra questão é que durante os últimos 30 anos começamos a aceitar a moral dos outros países sem a responsabilidade. Acreditamos que é melhor, que vamos viver tão bem como no Ocidente se a gente copiar tudo isso. Mas acreditar nisso é errado. Temos uma expressão: o que é bom para o russo, é a morte para um alemão. E essa expressão está certa ao contrário também. Não podemos acreditar que se aceitar os valores ocidentais vamos viver melhor. Existe também o problema que copiamos apenas as coisas negativas do Ocidente ao invés das coisas positivas. Isso não é aceitável."

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