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Em casa, Sócrates faz dieta rigorosa para entrar na fila de transplante de fígado em 70 dias

Raí acompanha a recuperação de Sócrates  - Divulgação
Raí acompanha a recuperação de Sócrates Imagem: Divulgação

Roberto Pereira de Souza

Em São Paulo

23/09/2011 07h00

Em 70 dias, Sócrates deverá estar na lista para receber doação de fígado, como exige o Sistema Nacional de Transplante. O anúncio poderá ser feito em novembro, informou uma pessoa que acompanha a recuperação do ex-jogador. A rotina diária na recuperação será rigorosa para evitar novos sangramentos.

O ex-jogador teve alta do hospital Albert Einstein, onde esteve internado duas vezes na unidade de terapia intensiva para estancar sangramento do estômago (a primeira, em agosto) e esôfago (em setembro). Até dezembro, o ex-jogador terá cumprido os seis meses de abstinência alcoolica e estará apto a entrar na fila para receber um fígado, como determina a legislação brasileira.  

A lei estabelece ainda que pacientes mais graves são passados na frente por razões humanitárias. Os mais necessitados costumam ser atendidos primeiro.

O médico que preside a Sociedade Brasileira de Hepatologia, Raymundo Paraná, chefe do Departamento de Fígado da Universidade Federal da Bahia, conversou com UOL Esporte para explicar como funciona o organismo de pacientes com cirrose alcoolica, de maneira genérica.

O profissional fez questão de ressaltar que não pode falar do caso Sócrates, por motivos éticos. E também disse que “a lei brasileira é bem feita para disciplinar os transplantes de órgãos em todos os estados”.

Sobre a dieta rigorosa imposta ao ex-jogador após a alta hospitalar, o hepatologista baiano destacou a importância da redução do uso do sal nas refeições.

“O sal é um inimigo do paciente com cirrose, porque o fígado doente não consegue enviar ao rim um sinal sobre quanto de sal pode ser eliminado na urina”, explicou Paraná.

Sem sinal do fígado, “os rins acabam assimilando todo o sal ingerido, o que provoca inchaço nas pernas e pés do paciente, pelo acúmulo de água no organismo”.

Os 70 dias de Sócrates antes do anúncio da entrada na fila do transplante deverão servir para o consumo diário de frutas e verduras. A dieta é estabelecida pela deficiência orgânica na assimilação de nutrientes básicos.

“O paciente com cirrose, que se recupera de sangramentos e eventos graves deve ingerir boa quantidade de proteína de alto valor biológico, existente no peixe, por exemplo”, explicou Paraná.  “O peixe traz aminoácidos de cadeia ramificada, que faltam no organismo do cirrótico”, concluiu.

 A falta de aminoácidos produz a diminuição muscular no organismo do paciente com cirrose alcoólica. Por isso, também, o período em casa reserva a Sócrates sessões semanais de fisioterapia.

“Aqui, temos duas situações onde a fisioterapia é necessária no pós alta”, explica Paraná. “O paciente que foi entubado e precisou de respiração mecânica pode sofrer com secreção pulmonar. Isso pode gerar um problema de infecção,  o que seria grave para um paciente com cirrose. A fisioterapia respiratória ajuda a controlar essa situação”, disse o médico.

Pacientes como Sócrates podem sofrer de câimbras por falta de cálcio e magnésio. Para evitar essas dores, a fisioterapia revitaliza a musculatura, melhorando também o tônus muscular.

Sócrates deve ser submetido à fila de doadores mortos. A doação é a mais segura em uso no Brasil, na opinião do presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia.

 As três modalidades de transplante existentes no Brasil são: doadores mortos, entre vivos e fígado marginal (órgãos rejeitados pelos protocolo do transplante mas que podem ser aproveitados em situações extremas).

“Temos excelentes equipes de transplante de órgãos vindos de doadores mortos. Não perdemos de nenhum país mais rico como Estados Unidos, Espanha, Inglaterra e França”, revelou, otimista, o médico Paraná. “É o sistema mais técnico e ético. No processo “intervivos” há o risco de morte (1%) do doador, que ainda pode enfrentar complicações cirúrgicas em até 20% dos casos”

No Brasil, segundo o presidente da SBH, equipes de Recife, Salvador, Curitiba, Fortaleza e São Paulo estão habituadas a realizar esse tipo de cirurgia de fígado.  “O procedimento dura cerca de quatro horas, sem transfusão de sangue. Nossos médicos são excelentes em transplantes”.

Apesar dos avanços, Paraná ainda vê problemas no sistema brasileiro. “Não temos equipes em todos os estados onde há morte cerebral. Não temos equipes de coleta no Acre e Rondônia, por exemplo. Não temos nem captação, nem transplantes nesses locais”.

Os pacientes que estão na fila para receber um fígado de doador morto (o mais eficiente do País) são chamados ao hospital assim que o órgão é oferecido. O transporte é feito por aviões e o fígado precisa ser implantado em até seis horas. O hospital Albert Einstein é um dos líderes em transplantes, no Brasil.