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Especialistas discordam das soluções da polícia para banir violência entre torcidas

Pedaços de ferro e rojões usados em briga entre corintianos e palmeirenses no domingo - Pedro Taveira/UOL Esporte
Pedaços de ferro e rojões usados em briga entre corintianos e palmeirenses no domingo Imagem: Pedro Taveira/UOL Esporte

Danilo Lavieri e Gustavo Franceschini

Do UOL, em São Paulo

28/03/2012 14h00

Dias depois de mais um caso de conflito violento entre torcidas organizadas, o debate sobre o problema, que vitimou duas pessoas nessa semana, ganhou corpo. O UOL Esporte conversou com quatro personalidades para ouvir as opiniões sobre temas polêmicas, e em geral todos discordaram das medidas mais conhecidas tomadas pelas autoridades, apontando caminhos distintos para a solução.

Os entrevistados foram Coronel Marinho, chefe do núcleo de segurança da FPF (Federação Paulista de Futebol); Paulo Castilho, promotor do Ministério Público do Estado de São Paulo; André Azevedo, presidente da Dragões da Real e vice-presidente do conselho da Conatorg (Confederação Nacional das Torcidas Organizadas) e José Luiz Portella, criador do Estatuto do Torcedor.

Cada um deles opinou sobre uma das três soluções mais comuns para o problema da violência no futebol. Ideias como o clássico para uma só torcida, o veto a bebidas e bandeiras nos estádios e até o cadastramento são consideradas soluções paliativas ou ineficazes. Em geral, os quatro apontam o mesmo erro.

“A briga é fora do estádio. Não tem nada a ver se o cara vai ao estádio ou não. Não é o cara que vai ao estádio que briga. São no máximo 300 pessoas em facções que usam o futebol como palco de guerra”, disse Portella, resumindo uma crítica presente no discurso de todos os entrevistados. 

Clássico com uma só torcida
"Sou contra. A gente não pode ceder em algumas coisas. Se você admitir que essa é a solução, atesta um problema no Sistema. Você pode ver que não tivemos problemas no estádio ou no entorno. O problema do clássico foi às 10h, na zona norte, horário em que o torcedor não estaria indo para o estádio", diz Marcos Marinho. 

A briga é fora do estádio. Não tem nada a ver se o cara vai ao estádio ou não. Não é o cara que vai ao estádio que briga

José Luiz Portella

"É uma medida que, na realidade, atesta o fracasso das autoridades e acaba com o futebol. A medida de 5% de torcedor visitante que existe já está meio sem graça. O foco teria de ser outro, e não bater o martelo e atestar a falta de competência do sistema", diz André Azevedo. 

"É uma medida que não vai resolver nada, é paliativa. Temos de combater a causa e não ter medidas emergenciais e transitórias. Precisamos entender a torcida organizada como um reflexo da sociedade. Todo setor tem problemas, na organizada também. Temos de combater os marginais que usam essas instituições para praticar a violência", diz Paulo Castilho. 

Proibição ao álcool
"O álcool é um fator indutor da violência. É um tempero a mais. Sou contra o álcool. Acho que o álcool deveria ser disciplinado. Poderia, por exemplo, permitir cerveja até o inicio e depois do jogo", diz Paulo Castilho.

Acho que, se usar as estatísticas, você precisa ser contra. Mas poderia usar uma medida como abrir os bares no intervalo e antes e depois do jogo

Marcos Marinho, sobre álcool nos estádios

"O álcool não está permitido? Não tem problema. Você pode vetar por outros motivos, mas esse tipo de coisa não é causada por álcool. Toda vez que você pega alguém atropelando alguém na calçada. Isso você pode evitar tirando o álcool, mas não essas brigas", diz José Luiz Portella. 

"Acho que, se usar as estatísticas, você precisa ser contra. Mas poderia usar uma medida como abrir os bares no intervalo e antes e depois do jogo, para dar uma pausa, não ficar bebendo constantemente", diz Marcos Marinho.

Proibição a bandeiras nos estádios
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Eu sou contra a entrada de bandeira, bandeirões e outras coisas. A briga que teve no setor verde do Pacaembu, entre corintianos, foi por causa disso. Nem todo mundo quer ficar com a bandeira na frente. Acho que isso não deve mais entrar nos estádios", diz Marcos Marinho. 

O mastro, a bandeira, o bambu, tudo são medidas emergenciais. Você precisa combater a causa. Tirar os marginais da torcida organizada e não a instituição dos estádios

Paulo Castilho

"Volto a dizer. O mastro, a bandeira, o bambu, tudo são medidas emergenciais. Você precisa combater a causa. Tirar os marginais da torcida organizada e não a instituição dos estádios", diz Paulo Castilho. 

"Em relação aos bandeirões com bambus, antigamente a gente tinha pessoas responsabilizadas por cada item. Esse é o modelo ideal, porque valoriza a festa. Antes, cada item que entrava no estádio precisava ter cadastro. Ou seja, entrava um bambu, a pessoa precisava ser responsabilizada. Qualquer coisa que acontecia com ele, a polícia tinha a quem culpar", diz André Azevedo. 

Cadastramento de torcidas
"Essa é uma medida feita sem pensar. É muito difícil, operacionalmente, fazer isso. Você está se preocupando com um montante enorme quando poderia focar na sub-facção da torcida", diz José Luiz Portella. 

É muito difícil, operacionalmente, fazer isso. Você está se preocupando com um montante enorme quando poderia focar na sub-facção da torcida

José Luiz Portella, sobre cadastramento de torcidas

"Temos uma ferramenta que foi testada no clássico entre Corinthians e Palmeiras, que veio de Israel. Vai ter a leitura da face da pessoa e quem se envolver em confusão nunca mais volta ao estádio. Ele seria identificado na mesma hora. Falta alguém bancar esse sistema, que ainda pode ser integrado com polícia militar, civil, federal, com lugares como aeroporto... Seria perfeito", diz Marcos Marinho. 

Escolta da polícia
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Claro que ajuda. Mas não adianta, por exemplo, levar dois carros de polícia para cobrir dois ônibus indo para o estádio. Tem coisa que o número de torcedores supera a polícia. Se educar a torcida como a sociedade, não precisamos nos preocupar com isso", diz André Azevedo. 

Claro que ajuda. Mas não adianta, por exemplo, levar dois carros de polícia para cobrir dois ônibus indo para o estádio.

André Azevedo, sobre escolta policial

"A escolta ajuda, a polícia ajuda. Mas se a gente educar a organizada, eles não vão precisar ter trabalho extra. Só o normal, de um cidadão, como em qualquer parte da cidade", diz Paulo Castilho. 

"Claro que a escolta ajuda. Mas nem sempre o policial pode dar conta de toda uma armação. Para situações normais, a polícia é preparada. Para a guerra, precisa de preparação extra", diz Marcos Marinho.