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Havelange chama Mano de 'imbecil' e diz que escolheria Scolari e Parreira para a seleção

João Havelange, então presidente da Fifa, e Joseph Blatter, atual mandatário, na Copa - Getty Images
João Havelange, então presidente da Fifa, e Joseph Blatter, atual mandatário, na Copa Imagem: Getty Images

Rodrigo Durão Coelho

Do UOL, em São Paulo

29/10/2012 14h01

Em entrevista feita em março, um dia após a má atuação da seleção brasileira na vitória contra a Bósnia por 2 a 1 (leia aqui como foi), o presidente de honra da Fifa, João Havelange, teceu duras críticas ao time, em especial ao goleiro Júlio César, e disse que gostaria de ver Luiz Felipe Scolari e Carlos Alberto Parreira no lugar de Mano Menezes, a quem chamou de “imbecil”.

As declarações integram um projeto do Museu do Futebol em parceria com a Fundação Getúlio Vargas para registrar depoimentos de jogadores que já defenderam o Brasil em Copas do Mundo. O UOL Esporte teve acesso à entrevista de Havelange, único dirigente ouvido no projeto.

Na Fifa, acabei com um princípio. Antigamente, o time que ganhava recebia a Copa no campo, o capitão; o presidente descia. No meu tempo, tinha que subir na tribuna. O senhor já imaginou, o time perdedor e eu levar uma laranja, levar um mamão em cima ou uma jaca?

Em meio a considerações sobre sua trajetória como atleta e dirigente, Havelange pergunta ao entrevistador se este havia assistido ao jogo do dia anterior e comenta: “gostou do gol da Bósnia? Foi um frangaço, está certo? Com quantos anos ele (Júlio César) está? Está com mais de 32. Então nosso goleiro já não poderia estar lá, no meu entender ”.

“Acho que o técnico fez uma análise, alguma coisa nesse sentido, mas é um imbecil, me perdoe a expressão. E tudo isso, se não modificar, nós não vamos chegar a nada. Eu, se fosse presidente, o meu técnico seria o Scolari, com o Parreira em cima. Experiência total, dois homens de personalidade, retos e corretos. Eu não tenho nada a dizer desse porque não o conheço, mas não está conseguindo nada, o senhor me perdoe, e nós estamos em cima do lado.”

O ex-dirigente do futebol brasileiro entre 1958 e 74 prossegue nas críticas ao desempenho da equipe, afirmando que o que viu no amistoso o “entristeceu e preocupou muito. Aquilo não é um time. O senhor faz aquilo no campeonato nacional ou no campeonato paulista ou do Rio, não vai ganhar nada”.

No depoimento, Havelange ressalta o poder construtivo do futebol e lamenta o que considera aspectos negativos. “Às vezes fico triste, porque todo mundo só vê o futebol hoje para ver onde é que pode ganhar uns trocados. Quantos técnicos e dirigentes têm os contratos do jogador no bolso! Depende deles. Vendem e depois: ‘Não, é o clube’”.

“Agora, o Scolari não tem isso, é reto. O Parreira não tem isso, o Dunga não tem isso. Mas os outros todos eu tenho minhas dúvidas. O sujeito faz o time de acordo com o interesse do bolso dele”, completa.

O Lula não tinha condições para ser um presidente, mas foi um homem de personalidade, o senhor não pode deixar de reconhecer e aplaudir, não é verdade? Goste ou não goste.

A entrevista aborda inúmeros temas da trajetória de Havelange, incluindo seu relacionamento com estadistas a quem elogia como Juscelino Kubitschek e Emílio Garrastazu Médici e menção à administração de Dilma Rousseff.

“Ainda há pouco, no governo dessa senhora, por nenhuma razão, me retiraram o passaporte diplomático. Eu entreguei. ‘O senhor vai receber outro’. Estou esperando até hoje”, diz ele.

No depoimento ele se diz apolítico, característica que o permite apreciar a organização da Olimpíada de Berlim de 1936, na qual competiu como nadador, organizada pelo regime nazista de Hitler. “Não entro na questão do regime da época porque nunca fiz política na minha vida, mas me lembro da organização. Até hoje é uma das melhores que já assisti.”

 

Em março, dias após a entrevista que concedeu, Havelange foi internado em um hospital no Rio de Janeiro com uma infecção no tornozelo direito, que o deixou em estado grave. Depois de 64 dias, ele recebeu alta em 21 de maio, quando se prepararia para receber, em casa, uma dura notícia.
 
No início de julho, a Justiça suíça determinou a divulgação dos detalhes do processo que examinou os casos de corrupção da Fifa na década de 1990. Com isso, tornou oficiais as suspeitas de que João Havelange e Ricardo Teixeira receberam propina de uma agência de marketing ligada à entidade-mor do futebol mundial.
 
O episódio manchou a reputação mundial do cartola. Durante os Jogos Olímpicos de Londres, autoridades brasileiras foram muito questionadas sobre a relutância delas em romper com Havelange mesmo após o escândalo.

No começo deste mês, o presidente da honra da Fifa fez sua primeira aparição pública desde a internação em março. Debilitado, ele foi a sede do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) participar da reeleição do presidente Carlos Arthur Nuzman. Procurado pelo UOL Esporte, sua assessoria disse que ele está em convalescença e não comentaria as declarações.