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Museu do Futebol cria ilusões de ótica para provar que erro de árbitro é da natureza humana

Será que foi, seu juiz? brinca com trabalho do árbitro para falar dos limites do cérebro - Divulgação/Museu do Futebol
Será que foi, seu juiz? brinca com trabalho do árbitro para falar dos limites do cérebro Imagem: Divulgação/Museu do Futebol

Bruno Doro

Do UOL, em São Paulo

06/11/2012 06h00

Na nova exposição do Museu do Futebol, você poderá olhar para dois bonecos que estão lado a lado e jurar que um deles está à frente. Ou observar dois retângulos se movendo paralelamente com velocidades iguais e garantir que um é mais rápido. Seria apenas uma sala de ilusões óticas se ela não estivesse lá para mostrar uma coisa: algumas vezes, uma decisão errada da arbitragem em um jogo de futebol não é culpa do juiz. Mas do cérebro humano.

A mostra “Será que foi, seu juiz?”, que será aberta ao público nesta terça-feira, usa os desafios que os árbitros enfrentam em campo para mostrar como o mundo que vemos é, na verdade, o mundo que percebemos. Para isso, usa uma série de instalações que forçam o visitante ao erro. E ainda explica o que aconteceu.

No caso dos dois bonecos paralelos, por exemplo, o truque é fácil de entender. O vilão da situação é o paralaxe, a diferença aparente da posição de um objeto quando visto por observadores localizados em lugares distintos. Na prática, esse é o que todos vivenciamos quando tentamos dizer se um jogador está impedido ou não. Se você está olhando de um ponto atrás da linha de defesa, um jogador impedido pode parecer em posição legal. Mas se sua visão vem de um ponto à frente da linha, a situação inversa pode acontecer.

A ILUSÃO DE ÓTICA DO IMPEDIMENTO

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    O efeito paralaxe é a diferença aparente da posição de um objeto quando visto por observadores localizados em lugares distintos. Na prática, esse é o que todos vivenciamos quando tentamos dizer se um jogador está impedido ou não

Outro bom exemplo de como o cérebro pode trair o juiz é efeito de “flash lag”, em que o cérebro demora a perceber a entrada de um novo elemento em um campo de visão com elementos estáticos. Isso mesmo. Para entender é só lembrar de lances de impedimento em que os jogadores aparecem do nada, correndo aparentemente de uma posição legal e recebendo o passe completamente livre.

 “O Museu do Futebol não é só sobre futebol. Ele é o museu da história do Brasil contado pela paixão do futebol. E essa exposição não é apenas sobre os juízes. É uma exposição sobre o cérebro, sobre a natureza humana, o comportamento, erros humanos, vistos através dos erros de um árbitro e das deficiências e incapacidades que o cérebro humano pode nos permitir”, diz Leonel Kaz, curador do museu.

“A ideia da exposição é que o público vivencie a questão da percepção visual. O que queremos é que a pessoa entenda, por ela própria, que o juiz pode errar. Aliás, em um campo de 120 por 90 metros, o que eu pergunto é como é que eles podem acertar”, completa Vera Hamburguer, responsável pela cenografia da exposição.

Além das ilusões óticas, quem aparecer no Museu também poderá saber mais sobre a história da arbitragem, conhecer alguns truques que os árbitros usam (você sabia que a corrida diagonal dos juízes é um esquema tático pensado pelo ex-presidente da Fifa, Stanley Rous?) e até mesmo provar um pouco da emoção que os homens do apito sentem. Uma das atrações é um jogo com tecnologia touch que adapta um software que a própria Fifa usa para treinar seus árbitros: primeiro é exibido um vídeo com o lance e o usuário tem de decidir se foi falta, se foi dentro da área e se alguém merece cartão (amarelo ou vermelho). Tudo em dez segundos.

“Crítica ao juiz faz parte da vida. Se não criticar o juiz, vai criticar quem? Tem que criticar juiz, técnico, presidente, jogador. Isso é divertidíssimo. São esses os elementos que compõe todo esse imaginário. Tem ali uma frase que compõe muito bem o que é o futebol: o único juiz que não é criticado é aquele que apitou a final de time campeão invicto. Essa temática nunca vai deixar de existir. O que queremos é mostrar que a polêmica, que faz parte da condição humana e é deliciosa, pode ter visões e percepções diferentes. Nem sempre o juiz erra porque quer. Ele erra porque é igualzinho a você que está sentado assistindo ao jogo. Apesar de estar munido de uma bagagem grande de conhecimento, ele tem pequenos “defeitos” que não podem ser corrigidos. São os nossos defeitos cotidianos, da condição humana”, finaliza Leonel.

ARMADILHAS DO CÉREBRO TAMBÉM AJUDAM A EXPLICAR ERROS NO BRASILEIRÃO

Em agosto, em uma partida entre Corinthians e Santos, o atacante André marcou para o time do litoral em um lance com três impedimentos que não foram marcados. O assistente que deixou de levantar sua bandeira, Emerson Augusto de Carvalho, foi afastado e os erros deram início a uma mudança no comando da arbitragem. O problema é que a culpa no lance pode ser explicado por muitas das ilusões mostradas na exposição. O UOL Esporte ouviu um neurologista e um psicólogo especializado no trabalho com o futebol, que concordaram que os profissionais tenham caído em “armadilhas” do processo cerebral.