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No campo do marketing, Barcelona é mais o time de Neymar que de Messi

Neymar fez sua estreia pelo Barcelona em amistoso na Polônia - Adam Nurkiewicz/Getty Images
Neymar fez sua estreia pelo Barcelona em amistoso na Polônia Imagem: Adam Nurkiewicz/Getty Images

Fernando Duarte

Do UOL, em Barcelona

01/08/2013 06h00

Na temporada de 2012/13, o Barcelona teve sérios problemas em campo. O principal deles, uma fragilidade defensiva escancarada pelo Bayern de Munique na Liga dos Campeões. O que levou muitos comentaristas a questionar a obsessão com que a equipe catalã estava buscando tirar Neymar do Santos. Além de não levarem em conta a necessidade de um jogador mais incisivo para fazer companhia a Messi, Xavi e Iniesta, as análises ignoraram largamente o que começa a ficar bastante claro: para o Barcelona, mesmo antes de jogar uma partida inteira pelo clube, Neymar já é um jogador crucial para os planos de faturamento, especialmente fora de campo.

A vinda do jogador está sendo vista por especialistas em marketing e gestão esportiva como uma intensificação de uma investida comercial feita pelo clube nos últimos dois anos, e que até o anúncio da contratação de Neymar tinha como símbolo a decisão de pela primeira vez na história blaugrana usar um patrocínio estritamente comercial na camisa de jogo – a companhia aérea Qatar Airways.

NEYMAR EXALTA MESSI EM PRIMEIRA ENTREVISTA COLETIVA NO BARÇA

  • Se na seleção brasileira Neymar já teve seu batismo de fogo em termos de holofotes, em sua primeira entrevista coletiva desde sua chegada definitiva a Barcelona o brasileiro mostrou na manhã desta quinta-feira um pouco de nervosismo, expressado pelas risadas rápidas no final de perguntas. Mas o ex-santista adotou uma tática de humildade que se pareceu calculada do discurso de futebol solidário, foi de uma espontaneidade inesperada no momento de relatar a experiência dos primeiros dias na Catalunha.

Uma transação que começa a ser ofuscada pelo desembarque do ex-santista na Catalunha. E que faz David Cushnan se sentir vingado. Editor da SportsPro, publicação nos últimos dois anos pôs Neymar no topo de uma lista de 50 atletas em ordem de potencial de marketing, à frente de Lionel Messi e outros monstros do esporte como LeBron James e Usain Bolt, o inglês vê na ida de Neymar para o futebol europeu um divisor de águas que encontra paralelos com a ida de David Beckham do Manchester United para o Real Madrid em 2003.

“Assim como Beckham, Neymar é um jogador que interessa a clubes europeus também por motivos comerciais. Ninguém está questionando a habilidade dele, mas antes mesmo de jogar ele já tem uma importância para o clube nessa fase em que o Barcelona traça uma estratégia de aumento de receita”, afirma Cushnan.

Menções a Beckham são parte da nova realidade potencial de Neymar na Europa. E comparações com a ida do inglês para o Manchester United em 2003 já começaram a proliferar. Comprado por 35 milhões de euros, Beckham fez parte de uma série de supercontratações que ajudaram a alavancar o suficiente a receita do Real Madrid para que o clube, em apenas uma temporada, saltasse do quarto para o segundo lugar no ranking dos clubes mais ricos do mundo, divulgado anualmente pela consultoria Deloitte e aceito como a medida mais ‘’oficial” das finanças do futebol mundial.

“O volume e o valor monetário dos acordos comerciais feitos por Neymar em sua carreira sugerem que o Barcelona adquiriu um trunfo único de negócios com a compra dele. Algo que só acontece uma vez por geração”, afirma Drew Barrand, diretor da Pitch PR, agência de relações públicas e marketing esportivo de Londres cujo portfólio de projetos inclui trabalhos com Beckham.

Na mais recente lista, o Real Madrid aparece em primeiro. O Barcelona, em segundo, com uma receita de 483 milhões de euros que ainda está quase 30 milhões atrás do rival, apesar de um número bem maior de conquistas nos últimos anos – os madrilenhos, por exemplo, não vencem a Liga dos Campeões desde 2002, ao passo que os catalães levaram o troféu três vezes nos últimos sete anos.


“O Barcelona na temporada passada teve média de público de 73 mil pessoas num estádio em que cabem 98 mil. Como garantir que mais gente compre ingressos? Contrate um dos maiores superstars do momento e ofereça  a possibilidade dele formar uma dupla infernal com o maior jogador do mundo na atualidade”, explica Diego Valdes, diretor do Instituto de Estudos em Negócios do Esporte, em Barcelona.

E se em campo houve quem na temporada passada visse Messi sobrecarregado, fora das quatro linhas o jogo é amplamente favorável a brasileiro. Para Cushnan, o potencial comercial do brasileiro põe o do argentino na sombra, a começar por uma questão de personalidade. “Neymar está no que podemos chamar de situação perfeita. Messi não tem a mesma espontaneidade ou segurança de Neymar diante das câmeras, por exemplo. Sem ter jogado na Europa, Neymar tem uma coleção de patrocinadores de fazer inveja a jogadores consagrados. E ele vem de um país que é um mercado em crescimento e atraente para meio mundo”.

Inclusive o Barça, que agora tem no brasileiro uma chance de fazer frente à entrada que concorrentes como Real Madrid e Manchester United têm fora da Europa. Apesar de todo o sucesso dos últimos anos, os catalães ainda estão atrás de madrilhenhos e ingleses na venda global de camisas. Um relatório divulgado no final do ano passado pela consultoria alemã PR Sports Marketing mostrou que Real e Manchester tiveram venda média global anual de 1,4 milhão de camisetas entre 2007 e 2012, quase 300 mil a mais que o Barcelona.

Neymar também é visto pelo mercado como ‘’mais bonito’’ que Messi. ‘’O apelo dele junto ao público feminino parece maior e abre uma nova frente de oportunidades para o Barcelona. “O Brasil também é um mercado com muito mais apelo na América do Sul. Não vai ser surpresa se as turnês do Barcelona começarem a incluir o Brasil”, opina Valdes.

Há um detalhe fundamental para separar a dupla fora do campo: Messi pode ser o dono do Barcelona nas quatro linhas, mas ainda é um atleta da Adidas num time cujo relacionamento com a Nike é base de seus planos para domínio econômico. “Neymar é uma estrela em ascensão da Nike. Não poderia estar num time mais adequado em vários aspectos”, finaliza Cushnan.