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Corintiano, narrador-animador da Lusa apela à polícia para conter rivais

Paulo Sodate é narrador da Lusa - Reprodução/Facebook
Paulo Sodate é narrador da Lusa Imagem: Reprodução/Facebook

Luis Augusto Simon

Do UOL, em São Paulo

23/10/2013 06h00

Quando Paulo Sodate narra jogo da Portuguesa – e ele está em todos há muitos anos –, não existe grito de gol. Existe berro de gol, exagerado, apaixonado, quando é a favor da Lusa. Quando é do adversário, é preciso estar atento para ouvir o sussurro do narrador. Quem não presta atenção fica sem saber que houve mudança no placar.

Tudo começou em 1984, quando Sodate foi convidado por Armando de Barros para ser o narrador da Equipe Líder, que acompanha a Portuguesa em todos os campos do Brasil. No início, só fazia jogos do estúdio, até que surgiu a primeira escala diretamente no campo. Em Novo Horizonte, interior de São Paulo.

Problema à vista. “Eu trabalhava em uma revendedora de carros e ia para Novo Horizonte com a Portuguesa. Faltei no serviço e no outro dia levei um atestado médico. Quando cheguei no trabalho, o guarda, que era meu amigo, avisou que o patrão tinha ouvido a narração do rádio e ia me demitir. Fiz um acordo e fui embora. Se mostrasse o atestado, era capaz de levar justa causa”, afirmou.

Sodate começou a se dedicar à rádio com mais frequência e construiu a fama de ser a voz da torcida. No início, era mais contido, mesmo porque – grande surpresa – não é torcedor da Lusa. “Sou corintiano. O corintiano mais lusitano que existe”, diz Sodate. Em 2006, porém houve a virada, houve o bico na imparcialidade.

Foi no dia 25 de novembro. A Portuguesa foi a Recife enfrentar o Sport. Precisava vencer para não cair para a Série C do Campeonato Brasileiro. Perdia por 2 a 1 e empatou aos 33 minutos do segundo tempo. Aos 40 minutos, o goleiro Tiago chutou uma falta no travessão do Sport. E aos 44, Alex Alves sofreu um pênalti.

Os que acompanham a Portuguesa, sabendo da crônica má situação financeira do clube, tinham bem claro as duas opções: fazer o gol ou ver o clube acabar, caminhar rapidamente para ser um novo Juventus. Sodate sabia disso e narrou o pênalti que se tornou "cult". Ainda hoje é toque de celular de muitos torcedores.

“Comecei a chorar quando o Alex Alves correu para a bola. Era uma emoção muito grande. Quando o gol saiu, berrei como louco. O Alexandre de Barros, que é o repórter e chefe da equipe, também chorava. E o Luciano, irmão dele, que estava na cabine, começou a dar murros na parede. Uns guardas quiseram tirar a gente de lá, mas houve um que acalmou todo mundo. 'O cara tá chorando, respeita ele, o time dele se salvou, nem vai afetar o nosso que já tá salvo'. Foi nossa salvação”, afirmou.

A partir desse jogo, Sodate cumpre um ritual quando transmite jogos fora do aconchegante Canindé. “Procuro a polícia e explico que faço uma narração direcionada para a torcida da Portuguesa e que sou um narrador torcedor. Peço para ele acalmar a torcida adversária”, contou.

Em 2011, em Arapiraca, a Lusa foi enfrentar o Asa e Sodate, antes de procurar os guardas, foi ver a cabine. E não havia cabine. Todas estavam reservadas para as rádios locais. Sentou-se no meio da torcida, com dois guardas fazendo a proteção.

Logo no início do jogo, sob o olhar desconfiado dos torcedores, irritou-se com um gol perdido pelo atacante Ronaldo e lembrou-se de uma música da dupla sertaneja César e Paulinho. “Chuta pro gol de bico, lazarento”, bradou. A torcida gostou começou a rir, e ele soltou os seus outros bordões: “água na panela que vem pimenta nela”. “Vai lusa veneno”,  "aqui não é a toca do Leão, mas precisa ter raça e coração”

O inusitado de ter um narrador-animador ao seu lado conquistou a torcida. Sodate pôde narrar a plenos pulmões os dois gols da Barcelusa – termo que ele inventou –, lamentar o gol do Asa e no final do jogo, como faz sempre, pedir para subir o “hino mas lindo do mundo”, em versão de Roberto Leal.

Com Sodate, todo esbarrão na área do adversário é pênalti. Toda falta dentro da área da Portuguesa é fingimento. O repórter Alexandre Barros e o comentarista Antonio Quintal imediatamente o trazem de volta à realidade. Sodate não se dá por vencido. “Eles me corrigem, eu anoto o minuto da jogada e vou ver na televisão. No outro dia, se eu achar que estou certo, ligo para tomar satisfação com eles”, afirmou.

Muito emotivo e também muito brincalhão, Sodate não esconde de ninguém que não tem uma perna, perdida em um acidente automobilístico há 50 anos, dias após completar seu nono aniversário. Mesmo assim, joga no gol. Ganhou alguns troféus e, sem nenhum compromisso com o politicamente correto, define-se como um bom goleiro que se orgulha de nunca ter levado um gol no meio das pernas.

DESAFIO: A QUAL NARRADOR PERTENCE ESTE BORDÃO?