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"Bolha" e até Copa do Mundo explicam crise no mercado do futebol

Guilherme Costa, Guilherme Palenzuela e Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

12/01/2014 06h00

A lista de explicações ainda é tão extensa quanto inconclusiva, mas a sensação está cada vez mais disseminada no mercado do futebol brasileiro: o volume de negociações de jogadores na atual janela de transferências tem sido menos intenso do que o de anos passados. Depois de uma avidez diretamente relacionada ao incremento de receita graças aos novos contratos com a TV, os principais clubes do país resolveram repensar investimentos em atletas.

“No passado, quando os clubes fizeram a negociação de direitos de TV, receberam valores altos e contrataram bastante. Jogadores de qualidade geraram uma inflação na folha salarial, e agora os clubes estão tendo de fazer uma política para diminuir isso”, disse Nick Arcuri, empresário que representa a Base Soccer. “Hoje o mercado nacional está mais fraco. Tanto é que clubes estão sendo muito criativos para buscar oportunidades. Estão fazendo mais trocas, por exemplo”, completou o agente.

A ascensão do faturamento dos times tem relação direta com a mudança na negociação de direitos de mídia. O processo que implodiu o Clube dos 13 em 2011 e deflagrou acordos individuais com a TV Globo também aumentou o peso desse dinheiro nas receitas das equipes.

Em 2008, segundo levantamento da consultoria BDO, os 24 principais times do Brasil somaram R$ 1,4 bilhão em faturamento. A TV respondeu por 24% disso. Em 2012, o valor saltou para R$ 3,19 bilhões. A participação dos direitos de mídia subiu para expressivos 40%.

“Os valores de negociações foram inflacionados nos anos passados, mas isso também foi fruto de um acréscimo de receita que os clubes tiveram com cotas de TV. Por causa disso, criou-se um cenário ilusório de que a coisa se manteria, mas foi um período atípico e os contratos assinados seguiram”, ponderou o empresário de atletas Bruno Paiva.

Os contratos de direitos de mídia ainda têm outra particularidade. Em 2012, o valor anual recebido pelos clubes foi turbinado pelas luvas referentes aos novos acordos com a Globo. Isso possibilitou negociações como os 20 milhões de euros (R$ 65,07 milhões) que o Corinthians investiu no atacante Alexandre Pato ou os R$ 24 milhões que o São Paulo desembolsou para ter o meia Paulo Henrique Ganso.

Os dois times são bons exemplos do quanto o mercado está menos aquecido em 2014. O Corinthians, que um ano antes havia contratado Patoe mais dois jogadores, fechou apenas com o lateral esquerdo Uendel neste ano – o volante Bruno Henrique também tem acerto alinhavado com a equipe, mas ainda não assinou. No São Paulo, Luis Ricardo é a única novidade para esta temporada. Na primeira semana de 2013, a equipe já tinha fechado com o zagueiro Lúcio e outros três reforços.

“Nós também não fizemos uma grande busca no mercado. Não é porque existe uma janela aberta que nós precisamos contratar. Não temos essa necessidade. Nosso grupo é qualificado, e contratações só serão feitas de forma pontual”, disse Roberto de Andrade, diretor de futebol do Corinthians. 

No futebol paulista, o reforço mais caro até o momento é o centroavante Leandro Damião. O jogador trocou o Internacional pelo Santos em negócio que movimentou R$ 41 milhões, mas o montante não foi desembolsado pela equipe da Vila Belmiro. O negócio foi viabilizado pelo Doyen Sports, fundo de investimentos sediado em Malta.

“O futebol precisa equilibrar as finanças. É uma tendência. Os negócios estão mais devagar porque estão tentando pagar menos. Uma parte entende isso, que são os clubes, mas outra, formada por procuradores e jogadores, ainda não está consciente”, afirmou Newton Drummond, diretor-executivo de futebol do Internacional.

A equipe colorada e o Grêmio também iniciaram um processo de redução da folha salarial. Nos dois rivais gaúchos, os cortes já chegaram a pelo menos 20% antes do início da temporada 2014.

Patrocinadores realocam investimentos na Copa do Mundo

Para Sandro Pallaoro, presidente da Chapecoense, a explicação também passa por dívidas antigas e pelo calendário. “Os clubes estão começando a trabalhar com times mais modestos para fazer uma reestruturação. Depois, para o Brasileiro, pode pintar alguma contratação”, analisou o mandatário da equipe catarinense, que estará na elite do Brasileiro em 2014.

“É notório que os clubes estão com dificuldade financeira por conta do calendário. No primeiro semestre, por causa da Copa do Mundo, eles vão jogar menos e vão perder muita receita de bilheteria”, corroborou o empresário Bruno Paiva.

Newton Drummond, diretor-executivo de futebol do Internacional, acrescentou mais dois fatores ao debate. “Na verdade, o mercado sofre um impacto da Copa do Mundo. Pode não parecer diretamente isso, mas há um impacto. Os grandes patrocinadores estão focando recursos na Copa do Mundo e não no Campeonato Brasileiro ou nos regionais. Há uma fuga de recursos, e o futebol tem menos dinheiro", teorizou inicialmente. “O pedido do Bom Senso F.C. para a adoção do fair play financeiro também pode fazer com que haja uma retração. Se você oferecia dez por mês, hoje só pode oferecer cinco”, completou.

Também há uma corrente de profissionais que condicionam o atual momento a uma crise no nível técnico. “Está difícil de você conseguir jogadores de qualidade. O mercado está aí, com os clubes correndo atrás de reforços, mas eles não encontram opções. Você vê que praticamente ninguém fez grandes contratações”, lembrou Marcos Figueiredo, diretor de futebol do Goiás.

Sob condição de anonimato, um empresário de jogadores revelou análise muito similar ao pensamento do dirigente: “A verdade é que faltam opções no mercado. Não tem nada de Copa do Mundo ou de valores inflados”.

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