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Não foi o comportamento que derrubou Sheik no Corinthians

Gustavo Franceschini

Do UOL, em São Paulo

12/04/2014 06h00

Em pouco menos de três anos de Corinthians, Emerson Sheik se caracterizou por duas coisas: as polêmicas e o bom futebol. Prestes a ser emprestado ao Botafogo, o atacante vê seu mau comportamento e o histórico de confusões ser apontado como explicação para o fim de sua passagem no Parque São Jorge. Não foi. Em má fase há meses, o camisa 11 deixará o elenco comandado por Mano Menezes porque seu desempenho parou de compensar os problemas.

A análise é feita desde o início do ano pela diretoria e pela comissão técnica. Emerson, inclusive, não tem dado tanto trabalho em 2014. Mais pontual, tem seguido à risca as orientações que recebe e não foi notícia por nenhuma polêmica. O problema é que, em campo, ele não tem rendido.

Emerson não marca desde agosto da temporada anterior, fez só nove jogos neste ano e foi titular em apenas três. A despeito de ser um dos poucos atacantes do elenco corintiano, é o sétimo melhor do time em finalizações e a quarta opção do técnico, que prefere Romarinho, Luciano e Guerrero. Se continuasse em queda, poderia perder a briga até para Malcom, jovem recém-promovido da base.

Só que Sheik nem sempre foi assim no Corinthians. O atacante chegou do Fluminense em 2011 e, depois de um começo claudicante, foi protagonista na conquista do Brasileiro daquela temporada, jogando ao lado de Liedson.

No ano seguinte, o ápice veio na conquista da Libertadores. Emerson marcou contra o Santos na semifinal, deu o passe para Romarinho no primeiro jogo contra o Boca e fez dois na grande decisão no Pacaembu. Em uma noite, entrou para a história do Corinthians, mas sempre sem se enquadrar no padrão politicamente correto.

Emerson chegou demitido do Fluminense por cantar uma música do Flamengo na concentração, respondia a um processo sobre compra de carro ilegal e havia adulterado sua identidade (ele se chama, na verdade, Márcio Passos de Albuquerque) no começo da carreira. O Corinthians, portanto, sempre soube das polêmicas que acompanham o Sheik.

No clube, ele somou outras à lista. Chegou seguidas vezes atrasado, já foi multado por isso e mais de uma vez usou um helicóptero para chegar ou sair do treino. Emerson provocou rivais em redes sociais, deu um “selinho” em um amigo e nunca escondeu seu gosto por baladas. Só que tudo isso, na verdade, tornou-se uma espécie de folclore do jogador.

“[A gente] vai fazer uma despedida aqui [no CT]. Uma pena que não vai poder ser na casa dele, porque minha mulher não vai liberar”, disse Fábio Santos na última sexta, brincando justamente com o lado “festeiro” do colega.

Emerson era o exemplo de uma política que deu certo no Corinthians. Em sua versão vencedora, o clube conviveu com outros jogadores com histórico de indisciplina, como Jorge Henrique e Chicão. O autocontrole do grupo, porém, sempre evitou medidas mais drásticas.

A conduta suave do elenco tinha o dedo de Tite, que chegou a se incomodar com Sheik, mas nunca rompeu a relação com o jogador, que é querido pelo elenco e pelos funcionários pelo bom trato diário.

Só que Emerson parou de corresponder. Em 2013, deixou de ser titular absoluto e passou a brigar por posição com Alexandre Pato e Romarinho. Sua última grande atuação foi na Recopa do ano passado, quando liderou o Corinthians no título contra o São Paulo, um dia depois de renovar seu contrato até o meio de 2015.

O novo compromisso já foi feito a contragosto. Àquela altura, o clube já entendia que Emerson era um investimento arriscado, mas tinha poucas opções de elenco, tinha acabado de liberar Jorge Henrique e não podia prescindir de um atacante desse porte sem reposição à altura.

Em 2014, nem esse papel Emerson conseguiu cumprir. Sua lesão na reta final do Paulista, justamente quando o Corinthians precisava vencer para se manter vivo, foi a gota d’água. Em seus momentos finais, o Sheik ainda deu trabalho para ser negociado por sentir-se confortável com um bom salário no ambiente familiar do Corinthians.

Para que o atacante topasse a mudança para o Botafogo, foi necessário que o presidente Mário Gobbi negociasse o empréstimo pessoalmente, deixando claro a Emerson que ele não estava mais nos planos. Com a garantia de que não perderia dinheiro e poderia voltar a atuar, o Sheik finalmente topou, e o negócio deve ser selado nos próximos dias.

Na nova casa, Emerson terá uma nova chance de mostrar que tem futebol para, se necessário, compensar as polêmicas que arrasta consigo.