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Raça? Neurologistas veem perigo em nocautes como o de Alvaro Pereira

Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo

05/08/2014 06h00

Pela segunda vez em cerca de 40 dias, o uruguaio Alvaro Pereira foi a nocaute em uma partida de futebol. No empate do São Paulo diante do Criciúma, no sábado, bateu a cabeça no gramado e passou vários segundos desacordado; minutos depois, estava de volta no campo, dando carrinhos. Ouvidos pelo UOL Esporte, neurologistas disseram que o jogador não devia ter continuado na partida.

O próprio lateral havia protagonizado um lance parecido no jogo entre e Uruguai e Inglaterra, na primeira fase da Copa do Mundo. Atingido por uma joelhada, ficou inconsciente, mas voltou a jogar. Os médicos ouvidos pela reportagem afirmaram que o futebol não dá a devida atenção a concussões – pequenas lesões cerebrais causadas por impacto e perdas momentâneas de consciência.

“Não faz sentido o jogador retornar, deveria ser automaticamente substituído. Após uma primeira concussão, a situação fica mais delicada no caso de uma segunda, e ele pode, inclusive a curto prazo, ter uma sequela, problemas maiores”, disse André Felício, neurologista do Hospital Albert Einstein.

Para Felicio, o Brasil ainda não dá a mesma atenção que outros países às concussões. “Hoje está mais do que documentado que as concussões podem levar a prejuízos cognitivos e motores. Alguns jogadores de hockey e futebol americano já doaram cérebro para pesquisas. A gente no Brasil, no futebol na verdade, não tem uma regulamentação. No momento em que o jogador cai, a entrada do médico deveria ser automática, independente do juiz. Ele deve ficar em observação - não só por alguns minutos, mais tempo, querendo voltar ou não”.

Rubens Gagliardi, também neurologista, concorda que o jogador não deveria ter terminado a partida. Para Gagliardi, nesses casos, o ideal é mais cautela e observação.

“Acho que não deveria ter voltado. É um risco, se ele perdeu a consciência, isso tem que ser investigado. Com ele, felizmente, deu tudo certo. Não é aconselhável. Precisa ver porque ele desmaiou, e em que condições acordou: ver o que está acontecendo, checar as condições neurológicas, cardiológicas tem que passar por uma investigação. Eu não acho prudente”, afirmou. “Jogadores às vezes são raçudos, no calor do jogo as vezes não sentem nada, mas pode ter uma coisa escondida. Não acho prudente”.

Não são apenas os médicos que têm essa opinião. No UFC, um lutador recebe suspensão após um nocaute, e pode ficar meses sem competir. A própria Fifa tem em seu site diretrizes para casos como esse, prevendo, no mínimo, um dia de repouso – foram ignoradas pela própria entidade durante a Copa, no caso de Alvaro.

O próprio São Paulo reconhece que o uruguaio não deveria ter voltado ao gramado. Em entrevista à Rádio ESPN nesta segunda, o médico do clube José Sanchez afirmou que caso o caso se repita, o lateral será substituído.

“Quando ele voltou da Copa, ele foi extremamente orientado que não era o correto. A gente passou subsídios para ele entender a importância de obedecer a orientação médica. Ele entendeu, argumentou que está na adrenalina do jogo e sempre quer continuar. Mas a gente vai insistir e ele já admitiu que não deveria ter voltado, que se expôs muito. Ele está bem orientado, se houver nova situação dessa ele sabe que não deve continuar", disse.

O ideal, porém, é que isso não aconteça novamente tão cedo: com dois nocautes em 40 dias, Alvaro já superou o lutador brasileiro Anderson Silva, que, em 39 lutas, caiu apenas uma vez.