Como Luxa domina política e polêmicas para manter pose há 30 anos
Sem um grande título nacional desde 2003, com um passado recente recheado de polêmicas e mais de 30 anos de carreira, Vanderlei Luxemburgo poderia ser considerado “carta fora do baralho” pelos grandes clubes que procuram treinador. Mas não. Nada disso parece abalar o prestígio daquele que já comandou a seleção brasileira – 1998 a 2000 – e até mesmo galáctico time do Real Madrid – 2005.
Mas como o treinador que mais se parece com um dirigente e é tratado como camisa 10 sempre que chega a algum clube novo (ou não tão novo) sobrevive às críticas e, principalmente, aos resultados apenas medianos?
E é justamente o perfil de cartola que pode ajudar a explicar uma grife que se mantém inabalável desde 1983, quando Luxa iniciou a trajetória de treinador no Campo Grande, clube do Rio de Janeiro.
O jeitão brucutu daquele que lateral de pouca habilidade do Flamengo na década de 70 começava a ser deixado de lado. No lugar do calção, o corte alinhado de calças cada vez mais caras. Ao invés de chuteiras, sapatos de grifes estrangeiras passaram a chamar a atenção. E até mesmo o vocabulário é adaptado por Vanderlei na hora de sustentar sua pose.
“Eu hoje funciono como um head coach. Não sou apenas um técnico. E sempre pensei assim. Comecei isso lá em 1983 mesmo. Eu contratava, dava treino, montava departamento de futebol. Sempre fui assim. E sei que isso me valoriza. É muito pouco você ser técnico de futebol. Você precisa pensar mais”, explicou Luxa, atacando ainda os críticos que defendem sua maneira de comandar o futebol de um clube.
“Lá no Manchester [United], era lindo o [Alex] Ferguson fazer isso e ficar tanto tempo. Quando eu quero ser head coach [chefe de comissão técnica], eu sou ladrão, estou errado”, argumenta.
Parceiro de Vanderlei em alguns trabalhos, o gerente de futebol Isaías Tinoco tenta esclarecer como se dá o ciclo habitual de o técnico em um clube, chegando como salvador e saindo como um inimigo da diretoria.
“É sempre assim. E tudo porque as pessoas ainda não pensam de maneira moderna aqui no Brasil. Levam ele quando precisam de alguém para segurar a pressão e ele logo dá conta desta situação. Então dão carta branca e ele começa a montar o futebol do clube. É então que surgem os egos dos cartolas. As partes entram em choque, começam a tirar a liberdade do Vanderlei e ele sai como inimigo. E sem conseguir desenvolver um trabalho”, defende Isaías.
Nem todos os dirigentes, no entanto, defendem esse modo. Alguns, inclusive, citam que Luxemburgo usa a área política como escudo para possíveis fracassos no campo.
“A verdade é que ele hoje se garante muito mais nesses bastidores políticos do que em treinos e resultados em campo. Basta ver o passado recente. E tem hora que fica difícil defender. Ele sabe como se segurar dentro de um clube. É aquela história: ele diz que precisa de tempo e vai ficando”, atacou um dirigente que trabalhou com Vanderlei recentemente.
Mas Luxemburgo não ganha apenas os políticos em sua chegada a cada clube. Estrategista, o então salvador procura sempre conquistar torcida e elenco.
“Preciso ter esses garotos do meu lado. Sempre dou confiança a eles. São estes jogadores que vão nos ajudar”, disse, em recente entrevista à Rádio Globo, repetindo uma tática já adotada entre 2010 e 2012, na última passagem pelo Flamengo.
Para os torcedores, a barração de jogadores que não gozam de grande prestígio nas arquibancadas é vista com bons olhos. O goleiro Felipe e o meia Elano, além de André Santos, sentiram isso na pele nas últimas semanas. "Foram decisões da diretoria. Deixo nas mãos deles", se esquiva.
“Eu nem quero comentar o trabalho dentro de campo, mas sim fora dele. É um treinador que exerce um comando espetacular. Sabe ganhar o grupo. Bate no peito, compra a briga do elenco e briga por eles. É isso que os cartolas que o contratam esperam. O Vanderlei assume a pressão, traz para ele, tira o peso do time. São poucos que conseguem isso no meio do futebol, por isso está aí há tanto tempo. Isso é importante no mercado”, disse o preparador físico Antônio Mello, companheiro de Luxemburgo há mais de 15 anos.
Para tirar o foco do time e da crise, vale tudo. Até mesmo apelar para piadas e boas sacadas em entrevistas. É comum ver Vanderlei arrancando gargalhadas e quebrando o clima tenso durante coletivas em momentos de crise.
No Flamengo há pouco mais de duas semanas, o “head coach” se agarra ainda em números. “Preciso de 50% de aproveitamento para fugir do rebaixamento. Nosso campeonato é esse. E até agora consegui isso. Tenho uma vitória e uma derrota”, conta, evitando questionamentos sobre uma derrota fora de casa para a Chapecoense no último fim de semana.
Resta saber até quando números, discursos descontraídos, articulações nos bastidores e “projetos” sustentarão o status em mais uma passagem por grande clube. Ou se dessa vez o ainda contestado Vanderlei Luxemburgo reencontrará os grandes títulos para fazer o que mais gosta: calar críticos e vencer inimigos políticos.
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