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"Corinthians é o time do povo, não do povão", diz diretor de marketing

Gustavo Franceschini

Do UOL, em São Paulo

09/09/2014 06h00

A ideia de que o Corinthians atinge todas as classes sociais, e não apenas a base da pirâmide, é um dos pilares do departamento de marketing do clube, que em pouco mais de seis meses de trabalho duplicou a base de sócio-torcedores que encontrou ao assumir. Em entrevista ao UOL Esporte, Izael Sinem, responsável pela área, fala sobre a escassez de patrocinadores no mercado e explica por que discorda da maneira como se pensam os estádios no Brasil.

“Aqui se criou uma cultura de que a arena tem de ser barata e a TV é cara. No mundo inteiro você dá acesso à massificação do esporte pela TV ou a mídia em geral. Quem vai na arena são aqueles que podem pagar, porque vão ver o show ao vivo. Pagar ingresso para qualquer esporte no mundo é caro”, diz o dirigente, que assumiu o cargo no Corinthians no início desse ano.

A visão de Sinem se aplica à política que o clube vem adotando no Itaquerão. Hoje, só 11 mil dos mais de 45 mil lugares do estádio são vendidos a preços populares, e 7 mil deles são exclusivos das organizadas. Há, na torcida, quem pressione por um barateamento do tíquete com base no histórico de que o Corinthians é o “time do povo”. O velho slogan, na visão do dirigente, não pode ser mal interpretado.

“O Corinthians é o time do povo, do povo brasileiro. O Corinthians não é o time do povão, da classe C e D, só”, diz Izael, que explica melhor o raciocínio. “O Corinthians é o maior retrato da pirâmide brasileira. Se perguntar hoje qual é o clube que tem mais torcedores da classe A, é o Corinthians. Qual é o maior clube da classe média do Brasil? É o Corinthians. Maior nas classes D e E, na base da pirâmide? É o Corinthians. Por quê? Porque ele representa o extrato da população brasileira”, completa.

Acompanhado de Alexandre Ferreira, gerente de marketing, e Carlos Martins, responsável por licenciamento, Izael falou durante uma hora sobre temas variados, e opinou sobre o mercado em que está inserido e o futuro do Corinthians. Leia a íntegra da conversa abaixo:

UOL Esporte: Vocês assumiram no começo do ano. O que mudou desde então?
Izael Sinem:
Acho que o momento para a entrevista é oportuno porque tem mais de seis meses de trabalho. Eu comecei efetivamente no fim de janeiro. Aí veio a contratação do Alexandre, depois o Carlos. Foi o grande diferencial. Na gestão anterior, o departamento era uma coisa bem verticalizada, e posso dizer que até um pouco viciado, do ponto de vista de que as mesmas coisas eram encaradas sob o mesmo prisma. Com a vinda deles, isso deu uma nova dinâmica. Houve valorização de outras áreas do clube, porque o marketing não trabalha só para o futebol. É óbvio que o futebol é a pedra angular do clube, mas existem outros esportes, outras demandas, que na avaliação da diretoria têm funcionado bem. Então estou muito satisfeito com esses seis meses de trabalho. E tem alguns números que mostram crescimento. A gente mais que dobrou a base do Fiel Torcedor.

Alexandre Ferreira: Houve uma queda no começo do ano, isso foi revertido. Dobrou do momento que a nova diretoria assumiu até agora, é bom dizer. No passado o Corinthians já teve esse patamar.

Nota da Redação: Em fevereiro, o programa chegou a 20 mil sócios, afetado pelo mau futebol, as punições de 2013 e uma mudança nos preços praticados. No ano passado, eram 60 mil afiliados adimplentes.

UOL Esporte: Qual é a base de sócios hoje?

Alexandre Ferreira: Gira em torno de 54 mil, esse é o número que estamos trabalhando.

Izael Sinem: Acho que é importante colocar não só essa satisfação, mas também a própria prioridade do departamento, que é viabilizar recursos para o clube como um todo. Além de ter muita coisa encaminhada, o Corinthians hoje é o único dos grandes de São Paulo que tem patrocínio. E não só patrocínio máster, mas patrocínio na manga, no ombro, no número da camisa, internos. Isso ficou muito bem administrado também. Hoje a gente tem uma postura mais ativa em relação a patrocínio. Normalmente o clube de futebol está lá, aí vem alguém que conhece alguém, que indica alguém. Hoje não, o Corinthians está capacitado a visitar potenciais patrocinadores ou os atuais e estabelecer uma conversa com antecedência e planejamento. A gente tinha boleiros antigamente. A formação da maioria das pessoas que estavam aqui era de boleiro. Tanto o Alexandre como o Carlos vem da comunicação. Nesse aspecto acho que estamos muito bem servidos.

UOL Esporte: Em entrevista à Máquina do Esporte, um executivo da Carsystem reclamou que nunca havia sido procurado por um clube para negociar, isso justamente depois de ter fechado com o Corinthians. Hoje o clube consegue evitar esse cenário?
Izael Sinem:
Hoje o Corinthians é muito demandado. Eu trabalhei na Nestlé, saí de lá faz um ano e meio. Estou com o Corinthians há oito meses. São marcas muito demandadas, muito queridas, muito valorizadas. Você praticamente não precisa vender. Agora, existem formas de tratar isso e potencializar essa demanda. Isso se faz tendo noção de valores, se planejando, organizando e dando prioridade àqueles que já são parceiros sem abrir mão de valor de mercado. Você acaba tendo uma postura mais ativa que reativa.

UOL Esporte: Por que só o Corinthians tem patrocínio máster entre os grandes de São Paulo? A TV tem peso nisso?
Izael Sinem:
Não acho que seja a TV. É um conjunto de fatores. É a gestão, a forma como a gente trata isso. E a própria força da marca Corinthians. Tem mais de 30 milhões de fieis torcedores. Eu tenho outra atividade, mas se vou a reuniões pelo Corinthians ou para a minha atividade privada, o fato de poder falar em uma camisa do Corinthians, ou um ingresso, é impressionante o que mobiliza e o que valoriza. Com os outros clubes você não vê isso. A relação entre o torcedor corintiano e o seu clube é muito grande, é muito forte. Se você souber trabalhar isso... E a gente está aprendendo, mas acho que tem acertado mais do que errado. Essa massa é que brilha para os patrocinadores. Existe uma nação que abraça essa marca. Abraçar essa marca não significa estar distante das outras.

Alexandre Ferreira: Outro dia a gente estava brincando no clube por causa da nova pesquisa do Ibope. Se você levar em conta só os torcedores mesmo, e não simpatizantes, talvez o Corinthians fique em primeiro.

Carlos Martins: Seria interessante perguntar em que posição está o seu time e qual é o próximo jogo? O torcedor comum não saberia responder, o corintiano sabe.

Izael Sinem: E digo mais, se tem um clube que se beneficiou de TV nesse país é o Flamengo. A Globo sempre transmitiu para todo o Brasil os jogos do Flamengo. Eu não vejo como televisão. Jogar para cota de televisão é ridículo. É a mesma coisa que ficar perguntando quem veio primeiro, o ovo ou a galinha? Então a questão é tratar melhor seu torcedor, aumentar isso para ter mais espaço na TV. Mas você não tem espaço e não consegue fazer isso.

UOL Esporte: No fim do mês passado, patrocinadores de peso do esporte brasileiro pediram “ética e transparência” na gestão esportiva, criticando a condução do processo como ele é feito atualmente. Esse problema estrutural pode explicar por que o futebol brasileiro tem tão poucos patrocinadores?
Izael Sinem:
Pode ser. Eu trabalhei na Nestlé, fiquei no projeto do vôlei. Fomos campeões paulistas, da Superliga, do Mundial, ganhamos tudo, mas sempre tive críticas pesadas, e não eram só do Osasco não, em relação à imprensa. Estão matando a galinha dos ovos de ouro. Quem dá conteúdo a vocês? As equipes e campeonatos. Quem mantém as equipes e os campeonatos? As empresas. Então por que não falam os nomes das empresas? ‘Ah, porque a gente não recebe para falar’. Então vocês vão continuar falando do time do Rio, do time de Osasco, e as empresas que sustentam o campeonato e o esporte ficam fora, sendo que elas entram principalmente pela exposição da marca. A imprensa é a primeira a matar isso. Tem de falar do patrocinador, é o que viabiliza o trabalho de vocês. Para mim isso é o fim da picada, é a antítese da inteligência. Em qualquer país desenvolvido se fala o nome do patrocinador. Para mim o grande vilão não é só a gestão. Concordo que a gestão é amadora, que muitas vezes se faz com paixão e não com planejamento. Posso falar isso de forma tranquila, porque não pertenço a partido politico algum do clube. Fui convidado para uma gestão técnica e coloquei técnicos no clube, que estão lá para fazer o melhor trabalho. Agora, é óbvio que se você coloca uma pessoa com um apelo mais emocional, ela tem chance de acertar, mas tem muito mais propensão a errar. E é claro que isso preocupa as empresas. Por que ela vai colocar alguns milhões na mão de uma pessoa que vai fazer gestão da sua verba de maneira emocional? Nenhuma empresa quer isso.

UOL Esporte: No vôlei, por exemplo, as críticas são de que a estrutura da Superliga só permite a existência de dois times brigando pelo título. As outras experiências não duram muito...
Izael Sinem:
Mas isso abrange também as federações. Não dá pra ter cinco times numa cidade. Aliás, ter três times numa capital já é muito. Em qualquer país de primeiro mundo não tem três times em uma mesma capital. Não há massa crítica nem dinheiro para movimentar. O Brasil é concentrado nisso. Tem concentração de renda, poder, política e concentração de estrutura para o esporte. Você tem cinco times de São Paulo hoje. Vai, hoje em dia tem dois times de São Paulo, um do interior, que é o Santos, tem o Palmeiras que está suando que nem louco, e São Paulo e Corinthians um pouco melhor. Aí você vai pro Rio... Complicada a situação dos times do Rio, bem complicada. Tem de estruturar de alguma forma para que cada capital tenha dois times, mas com apoio. Se você concentrar, aí você vai ter problema, vai faltar patrocinador. Não faz sentido.

UOL Esporte: Mas como isso funciona no futebol, em que mudar não é uma opção? O Corinthians, por exemplo, canibaliza torcedores e consumidores de outras equipes?
Izael Sinem:
Não. Acho que não canibaliza. Esse movimento é muito mais lento. Por que algumas torcidas crescem mais que as outras? Crescem pela performance, pelo que o clube oferece de serviços, pela forma como ele trata sua marca. Mas é muito mais lento do que em função de ação mercadológica. Não é orgânico, é mais do que isso. Tem momentos na história de cada clube que a performance aumenta. O Corinthians tem esse crescimento porque ele é especial nesse sentido. Ele conseguiu, em 104 anos, se posicionar diferentemente. Ele criou uma mística para isso.

Alexandre Ferreira: Ele até popularizou a frase: ‘Corintiano não vive de títulos, vive de Corinthians’. É uma frase que irrita os rivais, porque soa arrogante, mas que é verdade. Foi nos 23 anos de fila que mais cresceu a torcida.

Izael Sinem: Se você quiser mudar um pouco o quadro, e não vou citar nomes para ser ético, eles têm de mudar bastante a forma como gerenciam sua marca. Não só o futebol, mas a comunicação das suas marcas com seus torcedores. Se mudar isso, tem chance maior de ter mais patrocinadores.

UOL Esporte: Dentro desse gerenciamento de imagem, um dos principais valores que vocês utilizam é o slogan de time do povo, e a gente está em um momento de adaptação ao novo estádio.
Izael Sinem:
Não é o time do povo, hein? O Corinthians é o maior retrato da pirâmide brasileira. Se perguntar hoje qual é o clube que tem mais torcedores da classe A, é o Corinthians. Qual é o maior clube da classe média do Brasil? É o Corinthians. Maior nas classes D e E, a base da pirâmide? É o Corinthians. Por quê? Porque ele representa o extrato da população brasileira. Os outros clubes têm menor número de participantes dessa pirâmide e acabam tendo uma participação menor. Falar que o Corinthians é o time do povo... Ele é o clube do povo brasileiro, de todos os extratos. Por isso que você pode ter Arena para quem tem condição de pagar muito ou pagar menos. Aliás, essa questão de Arena no Brasil é uma outra história que a gente trabalha muito mal. Porque aqui se criou uma cultura de que arena tem de ser barata e TV é cara. No mundo inteiro se dá acesso à massificação do esporte pela TV ou a mídia em geral. E quem vai na arena são aqueles que podem pagar, porque vão ver o show ao vivo. Pagar ingresso para qualquer esporte no mundo é caro. Vai pagar quem compra carnê, se organiza, quem quer investir. E a maioria das pessoas assiste pelos meios de massa. Todo mundo briga para colocar o ingresso desse tamanho [faz gesto de pequeno com os dedos], e aí você sabe como é que fica duro para o clube bancar segurança, higiene, limpeza e tudo o mais. E aí a TV é que cobra caro. Você paga uma fortuna para ver de casa. Está tudo invertido. A gente está de pé trocado.

UOL Esporte: Então, seu cenário ideal é...
Izael Sinem: Meu cenário ideal não é inventar nada, é só seguir para quem deu certo. Não precisa inventar nada novo. Veja como faz a Premier League [Inglês], a Primera [Espanhol], qualquer liga que está hoje bombando e tem clubes que faturam milhões.

UOL Esporte: Mas na Bundesliga há um espaço para ingressos populares.
Izael Sinem:
Tudo bem, mas esse espaço eu acho legal. Só que o conceito maior não é esse. Infelizmente, o que se pede hoje e se reivindica é tudo popular, tudo baratinho. Não segura a bronca.

UOL Esporte: Nós entrevistamos o Lúcio Blanco, gerente de arrecadação do clube, na semana passada. No Itaquerão, a oferta de ingressos populares é de 11 mil lugares. Tirando os 7 mil destinados às organizadas, são 3,5 mil para o torcedor comum. Você acha que é um bom número ou deveria ser mais?
Alexandre Ferreira:
Mas o Lúcio certamente te disse que isso não é uma decisão só do Corinthians. A Polícia pede para que a organizada fique separada do torcedor comum. Pela estrutura da Arena, são quatro prédios, e em um dos prédios cabe essa quantidade de pessoas. Então o clube fica amarrado. Ele tem de cumprir uma ordem superior que nesse caso acabou beneficiando.

Nota da Redação: Na ocasião, Lúcio Blanco deu a mesma explicação. A reportagem em questão também mostrou que, no Pacaembu, houve um ajuste com o Ministério Público para que a organizada se misturasse ao público comum. No Itaquerão, não há essa intenção.

UOL Esporte: Mas independentemente da organizada, o torcedor reclama que 11 mil para todos também é pouco. Essa é a medida certa?
Izael Sinem:
Foi o número que o consórcio que administra a arena acertou por bem para que ele se pague e seja uma operação lucrativa. Se a gente tivesse mais ingressos e lugares disponíveis, talvez tivesse mais espaço para ingressos populares. Foi assim, a gente tem limitações físicas, temos questões de segurança e questões financeiras que se impõem.

Alexandre Ferreira: E temos de olhar que, se você for ver, o único prédio que a gente está com dificuldade de encher é o mais caro, o Oeste. O que estão reclamando de preço, em todo jogo está cheio [Norte e Sul]. Existe demanda. O que tem de calibrar é o prédio Oeste, que tem os preços mais altos. Ali tem espaço para trabalhar e tentar acomodar as pessoas que estão fora do prédio. Agora, popularizar todos os prédios não... E tem outras coisas. A Arena tem de estar funcionando com tudo o que pode a partir de 2015.

UOL Esporte: E aí talvez até o prédio Oeste consiga atingir sua capacidade máxima.
Izael Sinem:
Exatamente. A Arena fica pronta em dezembro. A gente ainda está mexendo em muita coisa. Estamos tentando, com tentativa e erro, ver o que funciona.

UOL Esporte: E o quanto vocês, do marketing, participam disso?
Izael Sinem:
A gente ajuda no que pode. Nosso compromisso é com o clube. A gente ajuda na Arena, tem boa relação com o Andrés, atua, tem gente nossa lá ajudando. Mas lá é claramente dividida a responsabilidade, com autonomia. Para arena, que é uma baita operação, o Andrés é o responsável. Pelo Corinthians, o presidente é o Mário Gobbi. Eu sou ligado ao Mário Gobbi, o marketing é uma diretoria do Corinthians e a gente ajuda em todos os momentos requisitados a gestão da Arena, que hoje está com Andrés e Lúcio.

Alexandre Ferreira: A questão dos ingressos, por exemplo, sempre foi um assunto da arrecadação. O marketing é, no máximo, conselheiro.

UOL Esporte: O discurso do Corinthians de hoje é o de extrato da sociedade, mas em outros tempos, o clube já falou da importância de ser o clube do povo. Rosemberg, primeiro diretor de marketing dessa gestão, era um dos que defendiam essa visão lá atrás. Isso mudou?
Izael Sinem:
O Corinthians é o time do povo, do povo brasileiro. O Corinthians não é o time do povão, das classes C e D, só. Tão simples quanto isso. É o time do povo, todos participam. Aqui na agência mais da metade é corintiano. Tem gente de classe média, classe alta, classe C. Zero problema, porque é um time com mais de 30 milhões de torcedores. Tem 104 anos. E tem essa mística e um torcedor que, mais do que brasileiro, torce para o Corinthians. Se fizer um Corinthians contra seleção brasileira, ele vai torcer pelo Corinthians, é uma coisa de louco. É a primeira paixão. Quando você fala de povão, me perdoe, me perdoe o Rosemberg, acho um pouco de miopia, de demagogia. Quando você fala de povo, fala de povo inteiro. Não quero excluir o universitário nem o ajudante de pedreiro, é isso que faz do Corinthians um time diferenciado, na minha visão de corintiano e diretor de marketing. Dá para fazer trabalhos para todas as classes, porque tenho público para todas.

UOL Esporte: Dentro dessa visão, você vai poder oferecer o estádio mais para as classes mais altas que para as classes D e E. Como você vai contemplar as classes D e E, sem ser com o estádio? É com outros benefícios do programa de sócio-torcedor?
Izael Sinem:
Pode ser, existem outras formas também. Mas digo de novo, se for procurar em todos os lugares onde os clubes fizeram da sua casa uma fonte de receita, não foi barateando o ingresso, nem popularizando. Foi valorizando o jogo. O jogo é o mais importante. Quem vai ao jogo tem um privilégio diferente. Tem um valor isso. Se eu não valorizar o jogo ou o espetáculo, todos saem perdendo. Não posso servir a dois senhores, não dá. É a minha opinião, e eu sou só o diretor de marketing, não sou o presidente e nem o gestor da Arena, mas falo pela minha vivência. Já fui de agência, já fui de empresa e sou hoje do clube. Na minha visão o correto é valorizar o espetáculo. Eu vou ter de ter recursos, sem paternalismo. Tenho de gerar receitas.

UOL Esporte: Sim, mas o que você ofereceria para o torcedor que não tem tanto espaço na Arena. Quais são essas outras formas?
Izael Sinem:
Hoje a gente tem programas, pode premiar de formas intangíveis o torcedor. Ele não vai ficar feliz só de ir ao jogo, mas de ir ao treino, viajar, ter outras experiências com a marca Corinthians. A experiência vai além da marca futebol. Ali a gente vai satisfazer muito mais pessoas.

Alexandre Ferreira: O que a gente viu no Corinthians é que o que motiva o cara a virar sócio-torcedor é única e exclusivamente a oportunidade de comprar ingresso para o estádio. E a gente não pode ficar preso nesse modelo, porque tenho 45 mil pessoas no estádio e 30 milhões de torcedores. Se for só isso, vou ficar sempre limitado a ter cerca de 50 mil no programa. Nosso desafio é criar ativos que fujam do estádio.

UOL Esporte: Para isso serve o programa dos coríntios, que troca “milhagem” com o cartão do sócio-torcedor por esses benefícios?
Izael Sinem:
Tem os coríntios, mas não só a moeda. Você tem de arrumar valores que sejam percebidos assim e não sejam 110% focados no ingresso. É que nem programa de milhagem no Brasil. O que todo mundo quer fazer com milhas?

UOL Esporte: Voar.
Izael Sinem:
E só. Ninguém quer trocar por rádio, por uma roupa nova. Só quer trocar por passagem aérea. É uma miopia. Isso não é problema do consumidor. É muito fácil passar para ele. O problema é nosso de oferecer algo interessante para ele.

UOL Esporte: O Corinthians, é verdade, fala sobre isso desde o ano passado. O que vocês já ofereceram ao sócio-torcedor nesse sentido, que talvez tenha até justificado o aumento que vocês mencionaram antes?
Izael Sinem:
Eu não diria que foi isso. Para voltar aos patamares anteriores houve um choque de gestão. A estreia da Arena é um catalisador, um evento grande. É uma mudança de cultura. Não vou, de uma hora para outra, fazer as pessoas que só queriam comprar ingresso passarem a comprar outras coisas. Vou ter de fazer algumas coisas para colher isso. Mas isso já foi identificado e está sendo trabalhado.

UOl Esporte: Vocês ofereceram um cartão de crédito da Caixa para todo mundo do Fiel Torcedor, que seria a base do programa dos coríntios. As pessoas aceitaram e estão usando?
Alexandre Ferreira:
Sim. Hoje tem por volta de 3 mil pessoas que estão dentro desse plano. É trabalho de longo prazo, né?

UOL Esporte: Sim, porque 3 mil é bem pouco perto da base total de vocês, né?
Alexandre Ferreira:
De novo, é uma questão cultural. Isso é um efeito boca a boca. Se eu uso e troco por alguma experiência, vale a pena para mim e eu falo para outras pessoas. A questão é que até acumular pontos leva tempo né? Porque a pessoa tem de lembrar de usar o cartão, acumular pontos.

UOL Esporte: Nisso a Arena pode ajudar, porque é o lugar onde os sócio-torcedores se agrupam.
Izael Sinem:
Sim, mas quando a Arena estiver pronta. Quando ela estiver pronta, nós vamos ter uma serie de experiências que são mais do que simplesmente um encontro para um jogo de futebol.

Alexandre Ferreira: E aí entra outro componente cultural, que é o torcedor passar mais tempo antes e depois do jogo no estádio.

UOL Esporte: Mas nesse aspecto vocês devem ter problema, especialmente no meio de semana. O jogo das 19h30 tem o trânsito travado antes e às 22h a saída é apertada. Não são problemas criados pelo Corinthians, mas que o afetam.
Izael Sinem:
Sim, mas aí tem a condição da cidade e uma determinação da televisão. Se você me perguntar, eu gostaria de colocar o jogo em um outro horário.

UOL Esporte: Você disse que não tem ligação política no clube, mas seu cargo é político, e as eleições estão logo aí. É difícil você pensar em um trabalho a longo prazo sabendo que daqui a alguns meses você pode ser substituído?
Izael Sinem:
Eu gostei da experiência, achei que até o momento foi gratificante, mas o que espero é que as coisas plantadas continuem, porque a gente está montando uma equipe profissional, que está começando a implementar uma série de programas para o bem do clube. Eles não têm filiação política. Eu não sei quem será o próximo presidente e nem voto, não tenho cinco anos no clube. Dependendo de quem ganhar, ele pode achar que fulano ou Zezinho pode mandar melhor que o Izael.

UOL Esporte: O marketing é um dos cargos mais visados, pode ser usado politicamente.
Izael Sinem:
O que eu acho disso? Zero problema. O importante é que como corintiano eu estou ajudando o clube e me sinto extremamente gratificado de ter feito isso. E muito tranquilo e satisfeito de ter colocado pessoas profissionais lá dentro que estão sendo reconhecidas por diversas facções pelo bom trabalho. Isso me dá uma baita de uma tranquilidade. Se novo presidente tem questões políticas e quer usar o marketing como ponta de exposição, aí...

UOL Esporte: É que é difícil prever isso. Quando o Rosemberg saiu, no começo da gestão do Mário Gobbi, ele também esperava que as coisas fossem caminhar sozinhas, mas não aconteceu assim. Você está sujeito a esse tipo de mudança. O Ivan Marques, ex-diretor, levou vários programas que não passaram na presidência.
Izael Sinem:
O que eu posso dizer para você é que os projetos que nós levamos passaram. Todos.