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Brasil tem camaronês candidato a ídolo no futebol. E só 3 meses para vê-lo

O atacante Joel faz sinal de positivo ao ser apresentado como jogador do Coritiba - Site oficial do Coritiba
O atacante Joel faz sinal de positivo ao ser apresentado como jogador do Coritiba Imagem: Site oficial do Coritiba

Guilherme Costa

Do UOL, em São Paulo

21/09/2014 06h00

O futebol brasileiro tem um novo candidato a estrela, mas apenas três meses para vê-lo em campo no país. Autor de dois gols na vitória do Coritiba por 3 a 1 sobre o São Paulo, na última quarta-feira (17), o centroavante camaronês Joel, 20, ratificou o início promissor de carreira. Ele já está negociado com um fundo de investimentos e vai deixar o Brasil em dezembro, quando terminar o contrato de empréstimo com a equipe paranaense – o destino é o futebol alemão, mas a equipe ainda não foi definida.

Os gols, contudo, não são o único motivo para Joel ser promissor. O camaronês já tem passagem comprada para a Europa, é inteligente e obstinado. Ele vive no Brasil desde os 15 anos, por exemplo, e ficou quase três temporadas apenas treinando no país antes de fazer sua primeira partida oficial.

“Um empresário camaronês trouxe três ou quatro garotos para o Brasil e deixou o Joel conosco. Ele começou a treinar, e nós gostamos do que vimos. Só que ele não podia participar de nenhuma competição até completar 18 anos porque era de fora. Então, fomos investindo nele”, relatou Sérgio Malucelli, gestor do Londrina Esporte Clube.

Malucelli e o empresário Juan Figer trabalhavam no Iraty quando Joel chegou ao Brasil. Foi lá que o camaronês ficou treinando inicialmente – o atacante acompanhou os dois agentes quando eles migraram para o Londrina.

“Ele ficou quase três anos sem poder jogar. Nós o colocávamos em alguns amistosos, e ele estava louco para fazer uma partida oficial. Quando ainda estávamos no Iraty, como estávamos com uma distância muito grande para o segundo colocado de uma competição, dedicimos colocar o Joel em campo num jogo, mesmo sabendo que perderíamos pontos. Ele entrou e foi expulso”, disse Malucelli. “Ele foi expulso porque fez uma falta e reclamou. Depois, pediu desculpas e disse que estava muito nervoso pelo tempo sem jogar”, completou o empresário.

A despeito de ter prejudicado o Iraty duplamente na estreia, Joel foi destaque nas equipes amadoras do clube e no Londrina. Foi artilheiro em quase todas as categorias de base, e em 2011 representou Camarões na versão sub-20 da Copa Africana de Nações. O centroavante foi titular da equipe que perdeu para a Nigéria por 3 a 2 na decisão.

“Ele é um cara de muita qualidade”, avaliou João Severo, supervisor de futebol do Londrina. “Acho que ele ainda devia melhorar em alguns aspectos, como a parte técnica e o domínio de bola, mas é um excelente cabeceador. Nesse fundamento ele é muito bom”, adicionou.

Joel chegou aos profissionais do Londrina em 2013. Pela equipe, o camaronês marcou dois gols numa vitória por 2 a 1 sobre o Santos em julho deste ano, em duelo válido pela terceira fase da Copa do Brasil.

No início de setembro, Joel foi emprestado ao Coritiba. O centroavante assinou contrato com o time da primeira divisão do Campeonato Brasileiro até 31 de dezembro e não custou nada aos cofres do clube – a diretoria paga apenas os salários.

“A gente esperava que ele ia render mais estando num clube de primeira divisão, num futebol mais cadenciado. A primeira divisão é diferente da segunda e da terceira, tem mais espaço para jogar, e nós sabíamos que ele ia se desenvolver”, opinou Severo.

No Coritiba, Joel já anotou três gols em quatro jogos – apenas um como titular. Ele não vai deixar nada nos cofres da equipe quando for para a Alemanha, em negociação similar ao que o Londrina fez recentemente com o lateral esquerdo Wendell, que foi emprestado gratuitamente ao Grêmio e trocou o time gaúcho pelo Bayer Leverkusen.

Família camaronesa e família brasileira

Diederrick Joel Tagueu, 20, é natural de Nkongsamba, em Camarões. O jogador nasceu numa família muito pobre e deixou o país de origem aos 15 anos. Pessoas que conviveram com ele no Brasil dizem que é notória a ligação do atacante com os parentes.

“Eu dei um computador para ele logo que ele chegou ao Brasil. Ele falava com a família em todos os dias. Até hoje, sei que eles mantêm contato sempre”, contou Malucelli.

Joel destina à família quase todo o dinheiro que recebe para jogar futebol no Brasil. Por isso, tem um estilo de vida modesto para o padrão de um atleta profissional.

No Brasil, Joel já deu um passo importante para criar a própria família. Ele tem um filho de quatro anos com uma mulher de Iraty, no Paraná. O atacante e a moça não vivem mais juntos.

Ainda em setembro, Joel deve cumprir mais uma etapa para criar raízes no Brasil. Ele tem processo em andamento em Brasília para obter nacionalidade brasileira, e a previsão inicial é que o resultado seja divulgado nas próximas semanas.

“Por ser jogador de fora, ele só pode fazer um contrato de dois anos. Por isso, demos entrada na papelada antes mesmo de saber que ele sairia do Brasil em dezembro”, disse o gestor do Londrina.

Poliglota, bom aluno e fã de moda

Além do francês, língua nativa, Joel fala italiano e inglês. Ele aprendeu português em seis meses, após ter se mudado para o Brasil, e foi matriculado em uma escola depois disso.

“Quando colocamos na escola ele foi muito bem. Até em língua portuguesa. Ele é um menino quieto, que sempre estudou bastante. Era um dos primeiros colocados da escola”, relatou Malucelli.

O camaronês é descrito por pessoas que convivem com ele como uma pessoa tímida e de poucas palavras. “O que ele tem de diferente é a vaidade. Ele gosta de se vestir bem e de um jeito diferente dos brasileiros. O visual é bem marcante”, disse João Severo.

No buraco

Além dos dois gols, Joel chamou atenção no jogo contra o São Paulo pela comemoração. Ele pulou uma placa de publicidade após ter feito o terceiro do Coritiba, mas não percebeu que o que havia do outro lado era o fosso de um dos vestiários. O atacante sumiu no buraco, enquanto seguranças colocaram as mãos na cabeça.

“Ele me ligou assim que o jogo acabou. Nós ficamos bem preocupados, com medo de que ele tivesse se machucado ou que tivesse acontecido algo sério. Ele disse que ficou um pouco dolorido, mas que estava bem”, afirmou Malucelli.

Ainda nos vestiários, quando os outros jogadores perceberam que não tinha acontecido nada sério, Joel virou motivo de piadas no elenco do Coritiba. “Fui comemorar com a torcida e acabei pagando mico”, disse o camaronês em entrevista coletiva.

A cena de Joel caindo repercutiu até fora do país. Jornais como “Daily Mail” e “The Guardian” publicaram notas relatando o episódio, com o vídeo do camaronês comemorando o gol. De certa forma, a fama do atacante na Europa já começou a ser construída.