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Fifa só definirá futuro de empresários em 2015. No meio da sua eleição

Guilherme Costa e Gustavo Franceschini

Do UOL, em São Paulo

27/09/2014 06h00

A Fifa causou furor no mundo do futebol ao anunciar, na última sexta, que vai proibir que empresários invistam em jogadores. A medida muda muita coisa no cenário atual do esporte, e afeta todos os envolvidos: clubes, atletas, empresários de jogadores e investidores. Cada um à sua maneira, todos esperam que a nova lei seja regulamentada. A questão é que isso só acontecerá em 2015, quando a entidade estará às voltas com a sua eleição.

A decisão de banir os investidores do futebol mundial atende às pressões da Uefa, liderada por seu presidente, Michel Platini, que quer que os clubes voltem a ser os únicos donos dos direitos econômicos dos jogadores. Países como Inglaterra e França, que já possuem leis que barram esse tipo de negócio, são os principais interessados no assunto.

Do outro lado da mesa estão os países que usam bastante esse modelo. Todos os sul-americanos, incluindo o Brasil, se apoiam em investidores para tentar manter competitividade com o exterior. Quem recebe os atletas na Europa são os países com os quais quem investe costuma ter boas relações, como Portugal, Espanha e o Leste Europeu, que também teriam de rever seu sistema.

Estão diretamente interessados os empresários e investidores do futebol. São eles quem compram direitos de jovens para lucrar com vendas milionárias posteriores. Se a Fifa barrá-los, podem perder a galinha dos ovos de ouro e até dinheiro que já foi gasto.

Tudo depende do que a Fifa fará. Na última sexta, ela simplesmente definiu que vai banir. As questões são: Que tipos de negócio estão banidos? Qual o prazo e as condições para que isso seja colocado em prática? Como serão as punições?. Essas e outras perguntas terão de ser respondidas pelo grupo de estudos da entidade, que se debruçará sobre o assunto nos próximos meses e entregará um relatório na próxima reunião do Comitê Executivo da entidade.

“Agora, o desafio é regular o banimento. Acredito que haverá um prazo de pelo menos três anos, mesmo porque o banimento imediato e direto representaria um colapso. Eu estimo que hoje 80% dos jogadores da Série A do Brasileiro estejam compartidos”, disse Marcos Motta, advogado especialista em direito esportivo que compõe o grupo de estudos da Fifa como representante dos clubes. Além dele, estão no órgão representantes das confederações continentais e dos jogadores.

Esse processo deve desembocar em um período delicado para a Fifa. Em maio do ano que vem, em Zurique, na Suíça, a entidade decidirá seu novo presidente. Nesta semana, Joseph Blatter anunciou que concorrerá ao quinto mandato consecutivo. Seu rival será Jeróme Champagne, um ex-diplomata francês que até 2010 era executivo da própria Fifa.

O caos político pode influenciar o desfecho da questão dos investidores, já que, como diz Motta, a decisão pode provocar um colapso no mercado atual. É isso que preveem alguns dos empresários que trabalham com esse modelo no Brasil.

“Vai piorar para os clubes, que não têm dinheiro para comprar os jogadores. A gente investe de outra maneira, monta um clube. Acho que vai ser pior para os clubes. Hoje, o clube não tem dinheiro e aí pede para o investidor”, disse o ex-atacante Luizão, hoje um empresário/investidor que atua em parceria com o português Jorge Mendes. Maior agente do mundo, ele foi acusado, nesta semana, de ter usado paraísos fiscais para investir em grandes nomes do futebol europeu.

Os clubes concordam. Eles teriam de readequar salários, enxugar as contas e rever a gestão. Ainda assim, há quem veja tudo isso com bons olhos. “Eu acho bom. Os clubes têm de se adequar e procurar recursos independentemente dos investidores. Hoje o menino já chega no clube com o procurador querendo 30% ou 40% dos direitos. Com isso, você vai igualar um pouco mais os clubes”, disse Alexi Portella, presidente do Vitória.

Só que o caminho para que isso aconteça é tortuoso e demorado. Marcelo Robalinho, empresário de jogadores e autor de um livro sobre o modelo de negócios que permite a participação de investidores, prevê um retrocesso no futebol brasileiro.

“A qualidade dos times e do espetáculo está vinculada aos valores. Na França, toda a base é subsidiada pelo governo. Na Inglaterra, você tem 5 milhões de libras da TV a cada 3 anos. Não existem esses modelos no resto do mundo. No Brasil, isso vai propiciar uma volta a dez anos atrás, em que os jogadores saíam a preço muito baixo e que qualquer proposta de ligas bem pequenas eram mais atraentes”, disse o agente.

Entre empresários e investidores há um certo temor do que há por vir, embora todos evitem transparecer. Com a proibição em vista, eles pensam em soluções que driblem o banimento da Fifa e permitam que todos continuem ganhando dinheiro com o futebol. A mais citada por todos os que foram ouvidos pelo UOL Esporte foi a da criação de um clube de aluguel, que possa atuar como um investidor disfarçado, mantendo os direitos econômicos dos jogadores.

“Isso é uma desinformação. A Fifa já está monitorando os clubes hospedeiros, inclusive puniu alguns deles neste ano. Pelo sistema de transferência da Fifa [chamado de TMS], é muito fácil você monitorar. Não há transação internacional que não seja monitorada pelo TMS e não há transação nacional sem a CBF. Qualquer movimentação atípica cai na malha fina do TMS”, disse Marcos Motta, que também atua como advogado de clubes e empresários e acompanha de perto o sistema.

Uma outra solução seria um contrato cível, fora da esfera desportiva. É isso que prevê Roberto Moreno, advogado do grupo DIS, um dos que tem atuado com investimento de jogadores no país nos últimos anos. “O contrato cível é regulamentado pela Constituição, que está acima de qualquer regulamentação esportiva”, defende ele.