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Vadão faz revezamento no banho e evita flagras na seleção feminina

Vadão dirigiu a Ponte Preta no início desta temporada, quando foi convidado pela CBF - Rafael Ribeiro/CBF
Vadão dirigiu a Ponte Preta no início desta temporada, quando foi convidado pela CBF Imagem: Rafael Ribeiro/CBF

Daniel Brito

Do UOL, de Brasília

10/10/2014 06h00

O técnico Vadão está realizando um sonho: treinar a seleção brasileira. Tudo bem que é a feminina, mas ele garante que é um "sonho realizado” de qualquer maneira. E lá se vão seis meses desde que o ex-treinador da Ponte Preta no começo desta temporada tem de lidar com as diferenças entre comandar homens e mulheres.

“No começo, cheguei cheio de receio, apalpando para não ultrapassar os limites e respeitar as diferenças no organismo, como menstruação, TPM [tensão pré-menstrual] e cólicas. Mas depois eu percebi que essas meninas [jogadoras da seleção] são demais”, contou, empolgado, Vadão. “Se elas estão menstruadas, nem entram nesse assunto comigo ou com a comissão técnica. Se elas estão com cólica, vão para o treino do mesmo jeito, para o jogo, não querem nem saber. Elas falam mais palavrão do que eu.”

O novo comandante admite que já está adaptado às idiossincrasias do cargo. Tanto que estabeleceu algumas regras de convivência no vestiário.

“Quando temos que ir para o aeroporto imediatamente após o fim do jogo, fazemos um revezamento. As meninas tomam banho primeiro e nós, da comissão técnica ficamos do lado de fora. Depois é nossa vez, ou vice-versa. Evita qualquer situação de flagrar alguma jogadora nua ou se trocando. Mas é totalmente normal que elas fiquem só de short e top no vestiário no aquecimento ou após a partida. Isso aí não é problema para ninguém”, relatou.

Coincidência ou não, a convivência com os hormônios femininos nos gramados tem proporcionado a Vadão seus dias mais tranquilos desde que decidiu tornar-se treinador de futebol, há 22 anos.

“É uma grande oportunidade dada pelo presidente Marin [José Maria Marin, atual presidente da CBF] e pelo Del Nero [Marco Polo Del Nero, presidente eleito da CBF]. Estou oxigenando a carreira, respirando novos ares”, explicou.

Ele está no cargo desde abril e foi anunciado pela CBF como treinador da equipe nacional feminina com os Jogos Olímpicos do Rio-2016 no horizonte. No feminino, a seleção pode contar com atletas do adulto, não apenas sub-23, como no masculino. A dupla Marin-Del Nero repete, assim, a fórmula adotada há 10 anos por Ricardo Teixeira, ex-presidente da confederação de futebol.

Para os Jogos Olímpicos de Atenas-2004, o cartola cooptou um treinador de renome no futebol masculino, Renê Simões. E ele foi o responsável pela primeira medalha olímpica das brasileiras na modalidade - prata, após derrota por 2 a 1 para os Estados Unidos na decisão pelo ouro.

De lá para cá, a equipe nacional faturou um vice-campeonato mundial (China-2007), o bicampeonato Sul-Americano (em 2010 e 2014, ambas no Equador) e a prata nos Jogos-2008. Conquistas que já vieram de trabalhos orientados por treinadores especialistas no futebol feminino: Jorge Barcellos e Kleiton Lima. 

vadão - Rafael Ribeiro/CBF - Rafael Ribeiro/CBF
Vadão conversa com jogadoras da seleção brasileira
Imagem: Rafael Ribeiro/CBF
Mas os últimos resultados nas principais competições internacionais foram preocupantes. A seleção caiu nas quartas de final dos Jogos de Londres-2012 e no Mundial-2011, na Alemanha. Para piorar, a equipe sub-20 foi eliminada na primeira fase do Mundial da faixa etária, já neste ano, com uma humilhante derrota para a Alemanha (5 a 1).

Vadão enfrenta problemas semelhantes ao do técnico Dunga, da seleção masculina, para convocação. Ele sofre com uma frequência regular com a ausência da alagoana Marta na equipe. O Rosengard, de Estocolmo, na Suécia, costuma travar a liberação da jogadora para defender a seleção.

O treinador não sabe, por exemplo, se poderá contar com ela em um importante teste preparatório para o Mundial do próximo ano, no Canadá. Em dezembro, Brasil, China, Estados Unidos e Argentina disputarão um quadrangular no estádio Mané Garrincha. “Não é que a seleção depende da Marta, é que ela é um baita reforço para qualquer time”, justificou Vadão. “Ele é o Neymar do nosso time. O jogador que desequilibra, que faz a diferença. E ela reúne as características de um Messi, de meio-campista que cai pelas pontas, vai na frente marcar gol. Essa característica está em falta no futebol brasileiro de uma maneira geral. Digo isso até no futebol masculino mesmo”, exaltou o treinador.

Foi sem Marta que Vadão entrou para a galeria dos treinadores que já levantaram um caneco com a seleção feminina. Foi há pouco mais de 20 dias, no Sul-Americano no Equador. A competição foi de pontos corridos e a campanha foi espetacular: sete jogos, cinco vitórias, um empate e uma derrota. O revés foi ante a Argentina na primeira fase (2 a 0). Mas o troco veio na fase seguinte, com uma goleada por 6 a 0. A seleção deixou o torneio com 22 gols marcados e apenas três sofridos.

O que Vadão não contava era com a falta de publicidade para o feito. “Ninguém deu uma linha da nossa conquista. Quando o sub-20 perdeu para a Alemanha, foi aquele alvoroço. A imprensa ignorou nossa conquista, é um absurdo”, reclamou. A Lei Pelé obriga a exibição de jogos da seleção brasileira em competições oficiais pelas emissoras de TV que adquirirem o direito de transmissão dessas competições.