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Chuteira usada por Serginho no dia da morte vira "troféu" do São Caetano

Chuteira de Serginho está exposta na sede do São Caetano - Reprodução
Chuteira de Serginho está exposta na sede do São Caetano Imagem: Reprodução

Fábio Aleixo

Do UOL, em São Paulo

23/10/2014 06h00

Em meio aos troféus de campeão paulista de 2004, vice da Copa João Havelange de 2000 e vice da Libertadores de 2002, um objeto atípico para uma sala de troféus se destaca na sede do São Caetano, localizada na Rua Eduardo Prado, nº8, no Bairro Cerâmica.

Em um lugar de destaque, em um quadro, se encontra a chuteira utilizada pelo zagueiro Serginho na última partida de sua carreira, o fatídico encontro com o São Paulo no dia 27 de outubro de 2004. Aos  14 minutos do segundo tempo, o jogador desabou no gramado, sofreu uma parada cardiorrespiratória e jamais levantou. Seu óbito foi declarado apenas algumas horas depois no Hospital São Luís. 

“Eu estava presente no hospital no momento da morte do Serginho, estava do lado dele.  Ele estava com uniforme do São Caetano todo rasgado por conta das intervenções médicas, tiveram de abrir o peito dele. Fui tirar a chuteira do pé, só queria ela. Acabei ficando com ela, e pus dentro de um quadro aqui na nossa sala de troféus. É a única lembrança física que tenho do Serginho. Guardo como uma forma de homenagem”, disse Nairo Ferreira de Souza, presidente do São Caetano em entrevista ao UOL Esporte.

O fato de a chuteira estar guardada na sede como uma espécie de troféu é desconhecido por muitos dos personagens que estiveram envolvidos naquele episódio, como Paulo Forte, o médico do São Caetano e responsável pelo atendimento a Serginho.

“É mesmo? Não sabia disso não”, disse Paulo Forte quando questionado pela reportagem sobre a chuteira enquadrada na sede.

A chuteira pendurada na parede do clube faz Nairo se emocionar cada vez que passa pela sala de troféus. O presidente disse que tinha uma relação paternal com o zagueiro, que havia chegado ao clube em 1999, contratado do Araçatuba, clube já extinto do interior de São Paulo.

“Tinha um carinho muito grande pelo Serginho. Tratava ele como um filho. Quando falo do Serginho, me emociono ao lembrar de seu caráter. Era um bom marido, um bom pai, um bom filho. Uma pessoa maravilhosa, que tinha muita história para contar, adorava fazer piada. Era ‘o cara’, e  falo isso porque tenho esta liberdade”, afirmou Nairo, relembrando que a indicação para o São Caetano contratar Serginho partiu de Luis Carlos Martins, que era treinador do clube na época e comandará o time em 2015.

Apesar de dez anos terem se passado, a voz de Nairo se embarga ao lembrar do ocorrido.

“Foi um momento muito difícil e triste. A gente lembra todos os episódios. A saída para ir ao Morumbi jogar contra o São Paulo, um jogo bom, importante. Tudo passa pela memória, foi muito comovente ver o Morumbi todo gritando o nome do Serginho. Foi um começo de noite bom e um fim muito triste”, afirmou o presidente do São Caetano.

Nairo também refuta incessantemente que o São Caetano tenha sido negligente no caso. Segundo o presidente, era sabido que Serginho tinha uma arritmia cardíaca (o que foi apontado em exame realizado em fevereiro de 2004 no Incor), mas nada que colocasse em risco a sua vida. Tanto que o jogador não morreu por conta da arritmia. A autópsia revelou uma cardiomiopatia hipertrófica.

“O resultado surpreendeu a todo mundo. Tanto que o Dr.Paulo (Forte) tem um documento emitido pelo Incor falando que foi uma fatalidade. Da arritmia sabíamos, fui alertado pelo cardiologista. Mas esta arritmia não era nada que o impedisse de jogar futebol, correr, levantar peso. Nunca foi falado no São Caetano que ele estava proibido de jogar. Por isso estava em atividade normal. Na época foi falado por aí que ele tinha 1% de chance de morrer, mas isso nunca existiu”, garante o presidente.

Presidente diz que pagou ingresso para poder ver jogos

Por conta da morte de Serginho, Nairo foi punido com um gancho de dois anos pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) e foi impedido de exercer qualquer atividade relacionada ao futebol. Depois, conseguiu a diminuição para um ano. Porém, no período que ficou suspenso não podia assinar nenhum documento oficial, nem frequentar estádios como membro da delegação ou entrar em vestiários.

“Segui trabalhando dentro do clube, não tive problema. Para ir a jogo, eu pagava ingresso, não ficava no camarote e nem ia para o vestiário”, disse Nairo, que condena a atitude tomada pelo STJD. O Tribunal ainda puniu o São Caetano com a perda de 24 pontos.

“Foi exagero do STJD de querer pegar um clube e fazer sensacionalismo e mostrar algo para o futebol brasileiro, mesmo porque fomos absolvidos na Justiça Comum. Nos tiraram 24 pontos, quase caímos naquele ano. Naquele momento, acho que foi mais um ato do STJD para querer mostrar algo para o povo brasileiro do que analisar tudo. Não tínhamos culpa de nada. Qual era função do São Caetano? Era fazer os exames. Poderíamos pagar se tivesse negligência de nossa parte. Mas cumprimos com todas normas legais para ter o atleta em atividade”, afirmou.

Nairo conta ainda que hoje tem pouca relação com Elaine Cristina, viúva de Serginho, mas que o São Caetano honrou com todos os seus compromissos.

“O São Caetano honrou os 13 meses restantes em contrato. Pagamos o salário em dia para não deixar a  famíla desamparada. O São Caetano deu toda a assistência enquanto o contrato permanecia. A Elaine nunca precisou do São Caetano, mas estaríamos sempre persentes pelo que ele (Serginho) representava para nós. Estamos sempre às ordens da família”,  concluiu.