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Seleção é outra, mas Dunga atual ainda é bem parecido com o de 2010

Do UOL, em São Paulo

19/11/2014 12h00

Dunga assumiu a seleção quatro anos depois de deixá-la pela porta dos fundos. Assumiu falando de sua evolução no aspecto tático e sua relação com a mídia. Deu sinais de que até o temperamento, eternamente quente, também estava arrefecido. Quatro meses depois de ser anunciado, porém, o treinador já teve tempo de mostrar que não mudou tanto assim.

Veja, nos tópicos abaixo, quais características ligam o Dunga de hoje e aquele que caiu diante da Holanda há quatro anos, na Copa do Mundo de 2010:

Choque de gestão:

03. set. 2014 - Filipe Luis e goleiro Jefferson participam de coletiva de imprensa nesta quarta-feira (3), em Miami, onde seleção brasileira enfrenta a Colômbia na sexta (5) - Bruno Domingos/Mowa Press - Bruno Domingos/Mowa Press
Imagem: Bruno Domingos/Mowa Press
Tanto em 2006 como agora, Dunga assumiu depois de um fracasso retumbante. Embora a queda do quarteto mágico seja fichinha perto do 7 a 1, o treinador teve de promover, nos dois casos, uma revolução.

Há oito anos, barrou veteranos como Cafu, Roberto Carlos e Ronaldo e deixou craques como Kaká e Ronaldinho Gaúcho em uma espécie de “quarentena”. Agora, igualmente tirou pilares da seleção anterior, como Júlio César, Daniel Alves, Marcelo, Paulinho e Fred e ainda deu chá de cadeira em Thiago Silva, que terá de encarar o banco de reservas depois de uma lesão na hora errada.

Time competitivo:

Jogadores da seleção, com Neymar ao centro posam para fotos com o troféu do Superclássico das Américas, conquistado após a vitória por 2 a 0 sobre a Argentina em Pequim - HEULER ANDREY/Mowa Press - HEULER ANDREY/Mowa Press
Imagem: HEULER ANDREY/Mowa Press
Como em 2006, quando assumiu a seleção pela primeira vez, Dunga não tardou a deixar o time competitivo. Naquela oportunidade, bateu a Argentina logo no segundo jogo e só foi perder o primeiro jogo no segundo ano de trabalho, contra Portugal.

Ainda que não empolgasse, aquela seleção mostrava de cara que poderia encarar de frente alguns de seus principais rivais, mas sem o futebol encantador que se pode esperar da seleção brasileira. Foi nesse ritmo, por exemplo, que Dunga levantou a Copa América de 2007, na Venezuela, sua primeira competição oficial como treinador. 

O time atual, depois de seis jogos, dá sinais parecidos, embora o torneio continental se desenhe bem mais complicado que daquela vez. Em quatro meses, Neymar e companhia venceram seis jogos, marcaram 14 gols, sofreram apenas um e derrubaram rivais como Argentina e Colômbia.

Sem medo de polêmicas:

Neymar é substituído e deixa faixa de capitão com Thiago Silva - HEINZ-PETER BADER / REUTERS - HEINZ-PETER BADER / REUTERS
Imagem: HEINZ-PETER BADER / REUTERS
Guardando o estilo que o acompanha desde os tempos de volante, o capitão do tetra nunca foi de levar desaforo para casa. Em sua primeira passagem pela seleção, Dunga se notabilizou pelo pavio curto, que sempre deixava uma tensão no ar, especialmente entre jornalistas.

Dunga já reuniu a atual seleção em três oportunidades, e em todas elas saiu faísca. Na primeira, Maicon foi cortado por chegar atrasado à concentração após a folga. Na segunda, bateu boca com o massagista da Argentina e depois ainda se meteu em um entrevero com Galvão Bueno, narrador da Globo, em uma entrevista. Na terceira, viu Thiago Silva ganhar os holofotes ao reclamar de seu status.

Em todas, diga-se, Dunga mostrou mais jogo de costura do que costuma. Na última, em especial, foi ponderado ao rebater a fala do zagueiro e soube evitar que a crise deflagrada tomasse conta de um grupo em evolução.

Grupo fechado:

Roberto Firmino é abraçado por companheiros após marcar seu primeiro gol da seleção brasileira - LEONHARD FOEGER / REUTERS - LEONHARD FOEGER / REUTERS
Imagem: LEONHARD FOEGER / REUTERS
Em 2010, a maior característica do time foi a união, seja entre os jogadores, seja em torno do técnico. Ao longo de quatro anos, Dunga soube convencer o grupo de sua filosofia, por vezes abdicando daqueles que não seguissem sua cartilha e premiando quem se manteve fiel a ele ao longo do ciclo.

Ainda é cedo para dizer se ele repetirá a façanha agora, mas em poucos meses de trabalho a seleção reage a Dunga com muitos elogios. Os herdeiros da era Felipão reconhecem a mudança de sistema e falam em tentar atender ao máximo os pedidos do chefe.

Quem não estava nas graças do antigo chefe, por sua vez, se derrete pelo novo. Foi o caso de Filipe Luís, por exemplo, que falou muito bem da intensidade de treinamento aplicada por Dunga, bem diferente do ritmo mais lento do tempo de Felipão.

Exaltação à amarelinha:

Dunga, técnico da seleção brasileira, orienta a equipe no Superclássico das Américas, contra a Argentina, em Pequim - HEULER ANDREY/Mowa Press - HEULER ANDREY/Mowa Press
Imagem: HEULER ANDREY/Mowa Press
Todo técnico da seleção que assume após um grande fracasso precisa, de alguma forma, resgatar algo que se perdeu na gestão anterior. Nas duas chances de Dunga, ele tinha de tentar recuperar a autoestima do futebol verde-amarelo, que depois de uma queda brusca questionava se não estava muito distante das potências europeias.

“O Zagallo dizia que a camisa da seleção brasileira é a nossa segunda pele. Para mim, ela é a primeira”, disse Dunga na primeira entrevista que concedeu há oito anos, quando assumiu a seleção.

Em 2014, o 7 a 1 deixou uma dúvida ainda maior, já que apenas Neymar figura entre os maiores do mundo, e ainda assim longe do primeiro plano ocupado por Cristiano Ronaldo e Messi. Sempre que pôde, então, Dunga fez questão de ressaltar que há talento nos jogadores brasileiros, e preferiu dizer que vai beber na fonte dos cinco títulos da seleção antes de olhar para europeus de recente sucesso como Espanha e Alemanha.

O psicólogo sou eu:

Neymar conversa com o técnico Dunga durante a vitória sobre o Japão - REUTERS/Xavier Galiana  - REUTERS/Xavier Galiana
Imagem: REUTERS/Xavier Galiana
Dunga nunca foi adepto de muitas modernidades no trato de seu elenco. Seus antecessores, Felipão e Parreira, sempre apostaram em comissões técnicas multidisciplinares e deram especial atenção para psicólogos.

De 2006 a 2010, Dunga não deu espaço para profissionais da área. Apostou no discurso boleiro, incutiu ele mesmo uma mentalidade vencedora nos atletas e morreu abraçado com suas convicções.

Agora, depois do fracasso emocional na Copa do Mundo em casa, ficou mais fácil para ele manter os psicólogos longe do dia-a-dia da seleção. Regina Brandão, que aconselhou Felipão, foi substituída por ex-jogadores que dividem opiniões com a comissão técnica e algumas experiências com o elenco.