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Drama familiar e câncer marcam mãe de operário morto em Itaquera

Dona Rita exibe foto do filho Ronaldo, morto há exatamente um ano no Itaquerão - Rodrigo Capote/UOL
Dona Rita exibe foto do filho Ronaldo, morto há exatamente um ano no Itaquerão Imagem: Rodrigo Capote/UOL

Dassler Marques

Do UOL, em São Paulo

27/11/2014 06h00

Dona Rita não resiste à primeira pergunta. Recordar do filho faz ela chorar e soluçar. Não tem sido simples levar a vida adiante. 

Um ano se passou desde que um guindaste de 450 toneladas esmagou Ronaldo Oliveira dos Santos nas obras no Itaquerão, em São Paulo. O operário morreu junto com o colega de trabalho Fábio Luiz Pereira em 27 de novembro de 2013. O estádio ficou pronto, mas as feridas não se fecharam. 

Se não bastasse a saudade do filho, Dona Rita, 66 anos, descobriu um tumor maligno na garganta em setembro. Hoje, enquanto atravessa um drama familiar pela distância das netas, ela luta pela memória do filho e pela própria vida.

"Fui operada da tireoide em setembro. Tirei três caroços. Um estudo foi feito e, dentro de um deles, tinha um tumor. É um tumor maligno", conta Dona Rita ao UOL Esporte. "Com certeza a perda do meu filho ocasionou tudo isso", acredita. "Me fez piorar ainda mais, estou depressiva, moro isolada. Não recebo visitas, a gente fica mais doente". 

Indenizada, nora de Dona Rita se distanciou da família do ex-marido

Em Caucaia, no interior do Ceará, Dona Rita vive sob os cuidados das filhas com um salário mensal de R$ 724. A casa dela é extremamente simples. Indenizada por um acordo realizado com a construtora Odebrecht, a nora Jamile se afastou desde a perda do marido. A avó, há meses, não vê as netas Juliana e Jullie, que moram com a mãe na capital Fortaleza. Dois anos antes da morte, ela havia se divorciado. 

"Ela tinha ciúmes e isso piorou. Minha filha, que toma conta de mim, ligou e disse que tem a missa dele, mas parece que ela não vem. Ele amava muito as duas filhas, mas ela não quer contato comigo e nem com os irmãos. Para ela, a família dele (Ronaldo) morreu", conta a mãe, magoada com a situação.

"Ele perdeu a vida para deixar algo para elas. Ela recebeu bastante dinheiro, recebeu R$ 700 mil para ela e as duas filhas. Também está recebendo aposentadoria. Dois ou três meses depois que meu filho faleceu, fui com a minha irmã até a casa dela, mas não fui recebida. As minhas netas nem desceram para tomar a benção", lamenta Dona Rita. 

Há alguns meses, diante da insistência de um advogado, a mãe e os irmãos de Ronaldo resolveram também pedir uma indenização. Em fevereiro, uma audiência será realizada para tentativa de acordo. Antes disso, Dona Rita terá mais uma provação.  

"Agora, no dia 8 de janeiro, vou me internar para um tratamento radiativo. Tenho que ficar isolada por dois ou três dias", conta a mãe de Ronaldo. "É um negócio muito sério, chato, e minha mãe tem diabetes e pressão alta", lembra Paulo Renato, também filho de Dona Rita. 

Seguir a vida, nesse momento, se torna mais difícil sem Ronaldo Oliveira dos Santos, o filho homem com quem ela era mais apegada. De São Paulo, para onde foi trabalhar no Itaquerão, ele enviava até um dinheiro para a mãe em Caucaia. 

"Tive muitas dores, nos pés e no joelho. Passei um mês todo em cadeira de rodas. Se meu filho estivesse aqui, me ajudaria a empurrar a cadeira de rodas. Sinto muita falta do meu filho. É muito difícil de esquecer", diz Dona Rita em meio às lágrimas.

Missa em memória ao operário será realizada em Caucaia, no Ceará

Um ano depois, nenhum responsável foi apontado nas investigações do acidente no Itaquerão. O memorial que havia sido prometido como forma de homenagem não foi realizado. No estádio do Corinthians, não há menções a Ronaldo Oliveira dos Santos, ao colega de obra Fábio Luiz Pereira e nem a Fábio Hamilton da Cruz, que também morreu em março, em acidente isolado. 

Uma missa em homenagem a Ronaldo será rezada nesta quinta-feira, às 17h, na Igreja Matriz de Caucaia.