Rivais ajudaram o Corinthians a ser campeão do mundo. Quem conta é Tite
O Corinthians contou com uma certa ajuda de alguns rivais para ser campeão do mundo em 2012. Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, o técnico Tite revelou que pediu conselhos ao ex-palmeirense Zinho e aos colorados Tinga, Abel Braga e Fernando Carvalho, entre outros, antes da disputa do Mundial. As dicas ajudaram o treinador a preparar o time para o campeonato, principalmente para a pressão psicológica do primeiro jogo.
Curiosamente, os interlocutores de Tite, todos com experiência no Mundial, possuem algum tipo de rivalidade com o Corinthians. Tinga foi o pivô do lance que iniciou a rixa entre o time paulista e o Internacional (um suposto pênalti não marcado que praticamente definiu o título do Brasileirão de 2005). Fernando Carvalho foi o vice-presidente de futebol do clube gaúcho que divulgou um DVD com erros de arbitragem a favor dos corintianos, na véspera da final da Copa do Brasil de 2009. E Zinho estava no time do Palmeiras que saiu da fila ao vencer o Corinthians na final do Paulistão de 1993 e que derrotou os arquirrivais na Libertadores de 1999.
Na entrevista, Tite também relembra a maturidade do elenco corintiano e conta o momento mais especial que o futebol lhe deu: ver a sua família após sua maior conquista e poder oferecer a ela o troféu como solidariedade nas batalhas que teve no esporte.
UOL Esporte: Você foi conversar com Carlo Ancelotti e Carlos Bianchi em intercâmbios fora do país. Como vê essas experiências, recomenda para outros técnicos?
Tite: Eu vi o Dorival Junior dizendo antes de assumir o Palmeiras que foi visitar o Chelsea. Essa troca de informações pra reafirmar conceitos ou pra conhecer outros novos, pra mim é fundamental. Uma série de outros técnicos pode estar fazendo isso. Tive a oportunidade de ver o complexo esportivo do Arsenal, seu departamento esportivo e tecnológico. Fui passar cinco dias com Ancelotti e surpreendentemente ele abriu sua gama de conhecimento, o que normalmente não se faz se a pessoa não for muito próxima. Não é uma praxe normal. Também vi jogos finais da Libertadores, da Liga dos Campeões. Isso vai te agregando informações.
UOL Esporte: Dirigentes poderiam procurar intercâmbio fora pra aprender mais?
Tite: Quando falamos em melhoria no futebol, há espaço para todos melhorarem. Ancelotti não teve problema nenhum em me perguntar de San Lorenzo, de Lucas Silva (jogador do Cruzeiro). E Bianchi perguntou que tipo de trabalho tático faço em vésperas de jogos. Era um cara muitas vezes campeão me perguntando. É fundamental trocar informações. E se é fundamental pra técnicos, acho que também é para dirigentes e executivos do futebol, e até para imprensa em suas análises. O público hoje avalia melhor.
UOL Esporte: Você sentiu se o treinador brasileiro tem visão negativa fora do país?
Tite: Eu confesso que não tinha essa pretensão (de treinar equipes fora do país), mas me despertou com meu dialeto italiano quando conversei com Ancelotti. Coincidentemente, ele é da mesma região que meus conterrâneos, de Mantova. E comecei a falar um pouco desse dialeto, ele compreendeu, começou a rir e falou que era o dialeto que ele falava. De alguma forma se identificou, e acendeu a luz de que se me faço compreender de alguma forma... tenho objetivo de fazer italiano para tê-lo mais fluente. A partir do momento que eu tiver um italiano mais fluente, posso abrir essa expectativa (de treinar um clube de fora). Antes disso, é ilusório. Tem que ter fluência na comunicação. Esse é meu projeto de futuro. Historicamente é assim (visão negativa do treinador brasileiro). Um dos motivos é que não temos curso de treinador aqui. Zidane teve problema grande porque não tinha autorização pra trabalhar no time B do Real Madrid. Vai depender muito dos profissionais e da nossa capacidade e resultados de campo. Conseguir feitos como São Paulo, Internacional e Corinthians que foram campeões (mundiais). Isso te dá respeito de enfrentar potências com poderio econômico.
UOL Esporte: Acha que sem a dupla Marin e Del Nero você seria o escolhido pra seleção?
Tite: Naquele momento dei a resposta conveniente e sincera. É meu jeito de ser. Aquele momento era oportuno pra falar sobre isso. Passou. Agora sou um brasileiro que acompanha a seleção brasileira que tem o técnico Dunga. Espero que ele tenha tempo para desempenhar sua função.
UOL Esporte: Como você vê a cultura tática do jogador brasileiro? Ele deixa tudo nas mãos do técnico?
Tite: Está crescendo bastante. Há um amadurecimento e iniciativa de externar isso. Tenho um tipo de liderança que incentiva isso. Eu gosto que me provoquem. Falo ´tragam as dúvidas, argumentem´. Pra provocar esse lado. E os grupos que têm atletas desse nível estão fadados a estar um patamar acima dos demais. Tive Zinho, Roger no Grêmio, Alex, Edinho, D´Alessandro, Paulo André, Chicão, Danilo, Paulinho e Alessandro como atletas. São jogadores que chegam e conversam contigo. Teve um dia que perguntei: Você sabe por que quero marcação setor sobre o Neymar? Eles me olharam e disseram ´porque você não quer responsabilizar um só atleta se não tivermos sucesso´. Isso é sensacional. Ouvir uma resposta de senso coletivo, de que a equipe toda precisa diminuir o espaço e a responsabilidade é de todos nós. É a essência. Está tendo um processo de evolução. Tem atletas que não têm a capacidade de se expressar, e por vezes confundimos cultura com inteligência. Maturidade, liderança e são componentes para essas atitudes.
UOL Esporte: O que aconteceu com Jorge Henrique no caso de indisciplina no Corinthians?
Tite: Uma das coisas que eu sempre gostei foi que meus erros não fossem externados e expostos de forma pública. Não é externar publicamente que vai resolvê-los. Você tem sua esposa, filho, namorada, pai... E se um atleta erra, não faz isso pra mim. O jogador (quando erra) não fez sacanagem com o técnico, mas com um clube, jogadores, normas. O fato (do Jorge) é passado. E tomara ele tenha tomado consciência de melhorar, porque eu coloquei pra ele. E torço pra que ele tenha melhorado.
UOL Esporte: Como ser gestor de jogadores vaidosos e não deixar a coisa desandar?
Tite: Trouxe um grande legado dos tempos jogador pra ser técnico. Eu gostava que o treinador falasse pela minha frente e que eu tivesse o mesmo respeito que o cara que estava jogando. A relação de respeito e de falar a verdade. Eu mostro que não gosto mais ou menos de um atleta. Dou as oportunidades iguais e quem agarrar vai aproveitar. O Gil, por exemplo, tirou a vaga do Chicão (na zaga) depois que ele foi campeão do mundo. Paulo André não foi relacionado pras semifinais e final da Libertadores. Foi o Marquinhos pro banco. E ele (Paulo) jogou a final do Mundial e jogou muito. Por exemplo, sei de um episódio que aconteceu com o Adriano em que tirei ele da concentração porque ele não quis pesar. Falei ´Fábio (Mahseredijan, fisioterapeuta), faça valer da sua autoridade e pega o peso do Adriano. Te delego isso. Aí ele disse ´professor, ele não quer pesar´. Aí no vestiário ele falou que estavam de sacanagem com ele. E sei que Ralf e Fábio Santos falaram ´o que foi Adriano´. Ele falou ´me tirou da concentração porque não quis pesar´. E falaram ´vai lá e pesa, cara. A balança está lá´. O grupo tinha suas regras próprias. O grupo se autogeria porque sabia da disciplina.
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