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Campeões revelam 15 histórias que você não sabe sobre 1º Mundial corintiano

Guilherme Costa e Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

14/01/2015 06h00

Há 15 anos, o Corinthians conquistou o mundo pela primeira vez. No dia 14 de janeiro de 2000, após empate sem gols no tempo normal e na prorrogação num Maracanã lotado, o time paulista bateu o Vasco por 4 a 3 nas penalidades e ficou com a taça do Mundial de clubes organizado pela Fifa. O UOL Esporte ouviu alguns jogadores que fizeram parte daquela campanha, e eles contam 15 histórias de bastidores da primeira conquista internacional corintiana.

1 – Zagueiro titular soube na véspera que não disputaria a decisão

A zaga do Corinthians na decisão do Mundial foi formada por Fabio Luciano e Adilson Batista, que não havia sido titular na partida anterior (vitória por 2 a 0 sobre o Al Nassr). Ele entrou no lugar de João Carlos, dono da posição em três partidas do torneio, que estava lesionado.

“Tive um estiramento na coxa e não me recuperei a tempo”, relatou João Carlos, 42. “Foi muito difícil porque eu participei de todos os jogos, mas fiquei fora bem na decisão. Viajei com o grupo, fiquei concentrado e cheguei a fazer um teste no centro de treinamento do Flamengo na véspera da partida, mas ainda estava sentindo. Fiquei no banco, com o coração a mil, só acompanhando. Ficar fora é bem pior”, completou.

Até a decisão, Adilson só havia disputado parte do jogo contra o Al Nassr (entrou no lugar de João Carlos quando o titular sentiu a lesão). Daniel, expulso nessa partida, foi outro desfalque do Corinthians na decisão. A escalação que conquistou o título foi a seguinte: Dida; Índio, Fabio Luciano, Adilson Batista e Kleber; Rincón, Vampeta (Gilmar), Marcelinho Carioca e Ricardinho (Edu); Edilson (Fernando Baiano) e Luizão.

2 – Jogador escolhido para cobrar o sexto pênalti recebia apenas R$ 3 mil mensais

O Corinthians que jogou o Mundial de 2000 tinha vários jogadores experientes. Era o elenco de Adilson Batista, Dida, Edilson, Luizão, Marcelinho Carioca, Ricardinho, Rincón e Vampeta, por exemplo. Mas também era o time de Índio, lateral direito que recebia R$ 3 mil por mês na época do torneio.

“Eu lembro muito do apoio dos mais experientes, que me pediram para jogar com tranquilidade. Tive muito apoio de outros jogadores. Eu lembro que o Vanderlei [Luxemburgo, técnico do Corinthians até 1998] sempre colocava os mais experientes e pediu várias contratações para a posição, mas sempre acabava sobrando uma vaga. Acho que era porque meu pai ficava batendo tambor”, disse Índio, 34, revelado na base do Corinthians.

Índio, aliás, é um personagem à parte naquele Corinthians. A despeito de ser o menos badalado entre os titulares e de ter o menor salário, o lateral era o jogador escolhido pelo técnico Oswaldo de Oliveira para bater o sexto pênalti na decisão contra o Vasco. No entanto, como Edmundo perdeu o tiro anterior, isso não foi necessário.

“Era o Índio. Ele batia e tinha sido cobrador na Libertadores”, lembrou o atacante Fernando Baiano, 35. “Eu estava preparado, mas estava nervoso na hora. Eu era vascaíno por causa do Edmundo e veio na minha cabeça que estava jogando contra o meu time. Eu falei que bateria, mas estava tremendo”, disse Índio.

3 – Edilson foi substituído porque não cobraria pênalti

Faltavam oito minutos para o término da prorrogação. Vasco e Corinthians empatavam por 0 a 0 no Maracanã quando o técnico Oswaldo de Oliveira decidiu trocar Edilson, um dos principais destaques da equipe, por Fernando Baiano, atacante revelado nas categorias de base do time paulista, que tinha apenas 19 anos na época.

“Eu tinha 19 anos, e o Edilson estava arrebentando. Mas ele não gostava de bater pênalti, e a decisão do Oswaldo foi colocar um jogador com essa característica. A caminhada do meio-campo até a marca de pênalti foi terrível – você não vê a hora de chegar, pegar a bola e acabar de vez com isso. Depois de se posicionar, é fundamental ter confiança. Todo mundo está olhando para você, e se você pensar em muita coisa não dá certo. Eu treinava de um jeito, mas o Helton caiu muito antes, e eu só inverti o canto. Ele não saiu nem na foto”, explicou Fernando Baiano.

4 – Jogador que perdeu um pênalti para o Vasco quase esteve do outro lado

O Vasco perdeu dois pênaltis na decisão do Mundial. Além de Edmundo, que errou o tiro decisivo, Gilberto parou nas mãos do goleiro Dida. "Eu tinha trabalhado com ele no Flamengo, em 1995, quando ele estava numa transição do futsal para o campo. A batida dele sempre foi forte, e ele nunca foi de colocar a bola. Falei isso para o Dida", contou o preparador de goleiros PC Gusmão.

O inusitado é que Gilberto quase esteve do outro lado na decisão. "Antes do Mundial o Corinthians estava tentando um acordo com ele, mas os jogadores já tinham pego muita confiança em mim. Eles conversaram com o Oswaldo [de Oliveira] e falaram que não precisávamos de outro nome para a posição. O Oswaldo acabou desistindo, e isso me fortaleceu muito", contou o lateral esquerdo Kleber, que foi titular na vaga que poderia ser do vascaíno.

Kleber tinha apenas 19 anos na época do Mundial. Entre os titulares, era o mais novo do Corinthians. "Havia muita especulação se eu conseguiria segurar a pressão de um campeonato tão importante, mas todos os mais experientes acabaram me ajudando muito", recordou.

5 – Por Dida, Corinthians jogou para levar decisão para os pênaltis

“Faltando 15 ou 20 minutos para terminar, lembro que os dois times estavam se respeitando muito. Eram dois times muito bons, mas estavam com medo de sofrer um gol e ficavam trabalhando a bola. Nosso time era muito técnico e estava esperando os pênaltis. Sabíamos que essa era uma opção boa porque tínhamos o Dida, que era um especialista. Foi isso que o Oswaldo falou: caprichem nas batidas porque o Dida vai pegar”. O relato do zagueiro João Carlos mostra o quanto o Corinthians apostava no goleiro.

Até hoje, Dida é um dos nomes mais incensados pelos jogadores que ganharam o Mundial com o Corinthians. “Quando foi para os pênaltis, ficamos animados. O Dida era pegador de pênaltis, e a chance de ficarmos com o título era muito grande”, disse o lateral direito Daniel. “O Dida ajudou muito. Nós sabíamos que ele estava num momento muito bom”, adicionou o goleiro reserva Yamada.

6 – Um telefonema para o Paraná

Hoje técnico, Paulo César Gusmão era o preparador de goleiros do Corinthians no fim dos anos 1990. Na época do Mundial ele estava no Paraná com a seleção brasileira sub-23, que era dirigida por Vanderlei Luxemburgo e disputava naquele mês o Torneio Pré-Olímpico.

“Fiz toda a preparação com o Dida, mas quem foi para o jogo foi o Solitinho, que ficava no meu lugar quando eu ia para a seleção. Mas o Dida estava sempre em contato comigo, e a gente falava muito sobre os adversários. Ele me ligou um dia antes da decisão, e eu estava com o Vanderlei e o Candinho [que era coordenador-técnico da seleção]. O Dida me perguntou sobre o Vasco, e eu tinha trabalhado lá entre 1992 e 1994. Trabalhei com a maioria dos jogadores que estavam ali e joguei com o Romário. Então, fui passando os cantos preferidos dos batedores. O Dida estava num momento espetacular e era praticamente um mito nos pênaltis. Ele saiu certo na cobrança do Edmundo, que tentou mudar e errou”, contou PC Gusmão.

Marcelinho beija troféu do título mundial que ajudou a conquistar pelo Corinthians em 2000 - Rodrigo Paiva/UOL Esporte - Rodrigo Paiva/UOL Esporte
Imagem: Rodrigo Paiva/UOL Esporte

7 – Erro de Marcelinho deu “aflição” e “frio na barriga”

Marcelinho Carioca era o homem das bolas paradas daquele Corinthians. O camisa 7 foi escolhido por Oswaldo de Oliveira para cobrar o último pênalti na decisão contra o Vasco e precisava apenas converter para assegurar o título – Gilberto havia perdido para os cariocas, e os quatro corintianos tinham acertado. Entretanto, ele mandou a bola nas mãos de Helton.

“Um jogador que tem tanta qualidade na bola parada era nome certo para acertar, mas ele estava desgastado fisicamente. Foi um baque quando ele perdeu”, admitiu o goleiro reserva Yamada. “Quando o Marcelinho errou deu um frio na barriga”, complementou o também goleiro reserva Maurício. “Deu uma aflição muito grande. Ficou aquela coisa de perder de novo nos pênaltis, mas deu tudo certo”, encerrou o zagueiro João Carlos, fazendo alusão à derrota para o Palmeiras em penalidades na Copa Libertadores de 1999.

8 – Até Dida sorriu

O goleiro Dida, um dos protagonistas do Corinthians em 2000, era comedido a ponto de ser chamado de frio. “Ele era assim para tudo: nos treinos e até para cumprimentar você, por exemplo. Quem não conhecia podia até pensar outra coisa”, ponderou Fernando Baiano.

Os momentos após o pênalti perdido por Edmundo reforçam isso. O Corinthians tinha acabado de conquistar o primeiro título mundial de sua história, jogando fora de casa, num Maracanã lotado. E Dida, um dos destaques da conquista, levantou com expressão serena, caminhou até o jogador vascaíno e o saudou como se fosse uma partida comum.

“Ele é muito calmo. Gosta de ficar na dele, mas passa tranquilidade para todos”, avaliou o reserva Maurício. “Quando o jogo acabou, o primeiro que nós abraçamos foi o [técnico] Oswaldo [de Oliveira]. Depois foi o Dida, é claro. O avião de volta para São Paulo foi uma festa. Ele até deu uma risada, algo que é difícil tirar”, entregou o ex-companheiro.

9 - Delegação do Corinthians recebeu parabéns e bronca de piloto de avião na volta para São Paulo

A festa que havia começado ainda no gramado do Maracanã ficou mais intensa depois que o Corinthians deixou o estádio. A comemoração seguiu no avião que levou a delegação de volta para São Paulo, e aí já havia extrapolado o elenco: funcionários do clube participavam como se tivessem entrado em campo.

"A gente pulava muito dentro do avião. O comandante nos deu parabéns pelo título, mas pediu para fazer menos bagunça. Pulando daquele jeito, acho que a gente não chegaria a São Paulo", lembrou o lateral esquerdo Kleber.

Antonio Mello, que hoje está no Flamengo e naquela época trabalhava como preparador físico do Corinthians, preferiu não participar da festa: "A diretoria havia fretado um avião para voltar para São Paulo e fazer um desfile, mas eu preferi ficar no Rio de Janeiro e comemorar com a minha família".

10 – Oswaldo de Oliveira tinha uma frase especial para motivar o elenco

Comandante do Corinthians no Mundial de 2000, Oswaldo de Oliveira era um técnico novato. Ele havia sido alçado ao cargo no ano anterior, amparado pelos principais líderes do elenco alvinegro.

“O Oswaldo sempre foi muito amigo. Era companheiro dos jogadores, e por isso teve uma dificuldade muito grande antes do Mundial. Ele tinha de cortar atletas da lista final, e por isso acabou deixando fora alguns nomes como o Nenê, que tinha feito um Campeonato Brasileiro brilhante em 1999. Isso partia o coração, mas ele conversava muito com a gente”, explicou o zagueiro João Carlos.

Uma coisa curiosa sobre Oswaldo de Oliveira é que ele tinha uma frase específica para encerrar todas as preleções. “Ele sempre falava: ‘vamos para dentro desses caras’. Era sempre no fim da reunião, e aí a gente saía dali com aquele grito. Isso motivava demais. O Oswaldo foi um dos melhores treinadores que eu tive”, disse o lateral direito Daniel.

11 – Rincón teve de dar um puxão de orelhas no elenco do Corinthians

Em campo, o Corinthians que disputou o Mundial de 2000 tinha um “dono”. O colombiano Freddy Rincón, capitão da equipe alvinegra na campanha vitoriosa, era o maior líder daquele elenco – e também o responsável pelas cobranças mais incisivas. Antes do início da competição, o camisa 8 chegou a fazer uma reunião para pedir confiança aos companheiros.

“Ele reuniu todo mundo no hotel e disse que o Mundial tinha muitos times grandes, como Manchester United e Real Madrid, mas pediu para a gente acreditar que podia conquistar o título. Ele chamou atenção do nosso grupo e pediu compromisso”, contou o lateral direito Daniel.

“O Rincón não aceitava erros grosseiros. Ele já vinha em cima do jogador e cobrava muito. A postura dele era assim”, completou o lateral esquerdo reserva Augusto.

12 – Elenco do Corinthians tinha problemas de relacionamento

Um time campeão nem sempre é feito apenas de amigos. Naquele Corinthians, essa máxima era extremamente válida. A despeito de ter sido responsável por um dos períodos mais vitoriosos da história do clube, a base do elenco que disputou o Mundial de 2000 tinha muitos problemas de relacionamento.

“Lembro num jogo na Argentina, antes do Mundial. Quase rolou uma briga generalizada”, contou o lateral esquerdo Augusto. “O pessoal não era muito unido. Havia vaidades aqui e ali, mas dentro de campo a gente resolvia”, concordou o lateral direito Daniel.

A situação foi agravada por um problema de calendário. O Corinthians conquistou no dia 22 de dezembro de 1999 o bicampeonato brasileiro e fez seu primeiro jogo no Mundial, contra o Raja Casablanca, no dia 5 de janeiro de 2000 (vitória por 2 a 0).

“Todo mundo acabou aquele Brasileiro desgastado, na expectativa de descansar, mas a gente sabia que tinha um Mundial em seguida. Era uma oportunidade única na história, e para isso a gente precisou renovar forças e buscar união”, finalizou o atacante Fernando Baiano.

13 – Times trocavam provocações em hotel de São Paulo

O Mundial de 2000 foi disputado em duas sedes (São Paulo e Rio de Janeiro). Na primeira fase, os oito times foram divididos em dois grupos, e cada chave ficou em uma cidade.

O Corinthians estava no Grupo A, que também tinha Real Madrid, Al Nassr e Raja Casablanca. E Todos os times ficaram no mesmo hotel.

“Os jogadores se encontravam e às vezes até jantavam juntos. Ninguém acreditava muito no Corinthians, até pela grandiosidade das outras equipes que estavam no Mundial. Eram muitas brincadeiras, e com o Roberto Carlos, que tinha jogado contra a gente aqui no Brasil, também havia rivalidade”, disse o lateral esquerdo Augusto.

Roberto Carlos comemora gol do Real Madrid diante do Corinthians no Mundial de 2000 - Jorge Araujo/Folhapress - Jorge Araujo/Folhapress
Imagem: Jorge Araujo/Folhapress

14 – Jogadores do Corinthians fizeram bullying com Roberto Carlos

As brincadeiras feitas no hotel transformaram Roberto Carlos em alvo. Foi para o lateral esquerdo brasileiro que os jogadores do Corinthians ligaram depois de um empate por 2 a 2 com o Real Madrid, no dia 7 de janeiro, no Morumbi.

Roberto Carlos era titular da equipe merengue, que contou com dois gols do francês Anelka – ele ainda perdeu um pênalti, que foi defendido por Dida. Edilson marcou os dois do Corinthians, e um deles foi um golaço: o camisa 10 jogou a bola entre as pernas de Karembeu e chutou sem chances para Casillas.

“Esse lance foi muito comentado no vestiário. Alguns jogadores do Corinthians que eram mais amigos do Roberto Carlos ficaram ligando para ele. Foi aquela brincadeira”, relatou João Carlos.

Corinthians e Real Madrid tiveram os mesmos sete pontos na primeira fase do Mundial, mas apenas o primeiro colocado da chave avançaria. O time paulista foi para a decisão por ter saldo de gols superior.

15 – O jogo mais marcante para os atletas do Corinthians não foi a decisão

Empate sem gols com o Vasco, Maracanã lotado, vitória nos pênaltis, primeiro título mundial da história do clube. Há uma extensa lista de ingredientes para a decisão do Mundial ter sido especial para o Corinthians. Só que essa não foi a partida mais marcante para os jogadores da equipe alvinegra.

“O Real Madrid era nosso maior adversário. Foi um jogo disputado, muito igual, que talvez tenha sido o mais marcante de todos. Óbvio que a final foi inesquecível, mas Real Madrid é Real Madrid”, opinou o goleiro Yamada. “Lembro da ansiedade na estreia, mas o jogo inesquecível foi contra o Real Madrid”, concordou o goleiro Maurício.

“O pessoal do Real Madrid falava que não conhecia o Edilson Capetinha e que ele não ia fazer nada naquele jogo. Antes do início ele disse que ia se apresentar: deu uma caneta no Karembeu e fez dois gols. Se eles não conheciam, ficaram conhecendo”, encerrou o zagueiro João Carlos.