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9 passos da crise que Muricy expôs no São Paulo

Guilherme Palenzuela

Do UOL, em São Paulo

17/03/2015 06h00

Os burburinhos sobre problemas internos no São Paulo foram confirmados na última quinta-feira, quando o próprio técnico Muricy Ramalho resolveu expor uma crise interna, da diretoria, que estaria prejudicando o trabalho de departamento de futebol, comissão técnica e elenco do clube. O treinador citou, depois da vitória sobre o São Bento, no Morumbi, pelo Paulistão, que o clube está "dividido" e falou que sabe da existência de "forças" para derrubá-lo. Desafiou: afirmou que é preciso "ser grande" para tirá-lo do comando do time. No dia seguinte, recebeu apoio de todos os lados e colheu os efeitos que tentou plantar. A explosão de Muricy naquela entrevista coletiva não foi um ato intempestivo.

Muricy percebeu que era a hora de falar. Dias depois da derrota contra o Corinthians e de ter de treinar fora do CT da Barra Funda para se proteger da torcida organizada, o treinador se viu seguro para expor problemas que, em sua avaliação, atrapalham o São Paulo. Abaixo, o UOL Esporte lista, cronologicamente, a evolução dos problemas internos do São Paulo e o esgotamento da paciência do treinador. Agora, pelo menos até o jogo contra o San Lorenzo, nesta quarta-feira, pela Copa Libertadores, ele consegue suprimir novos capítulos.

1. Pressão pela saída de Gustavo
Houve no São Paulo, segundo membros da própria diretoria, uma mobilização ainda no segundo semestre de 2014 para que o gerente de futebol Gustavo Vieira de Oliveira fosse demitido. Segundo os relatos, foi o vice-presidente de futebol Ataíde Gil Guerreiro quem intercedeu e vetou a saída do profissional, que mantém ótima relação com todo o departamento de futebol. A causa da pressão interna pela saída seria aquilo que é interpretado como proximidade do antecessor e hoje maior rival de Aidar, Juvenal Juvêncio. Ataíde Gil Guerreiro nega que teve de agir para evitar a demissão, mas a história é contada como fato no São Paulo.

2. Muricy tem que conquistar títulos
Ainda no fim de janeiro, o presidente Carlos Miguel Aidar fez a primeira cobrança pública ao técnico Muricy Ramalho. "Montamos o time que ele quis", falou o presidente, em entrevista à rádio Jovem Pan. "Ele está devendo essa pra gente", completou. O recado não foi bem recebido pela comissão técnica e, aos poucos, Muricy foi inserindo de forma repetida em suas aparições públicas a fala de que, em 2013, assumiu o time e o salvou do rebaixamento.

3. Ligação direta com organizada
No dia 17 de fevereiro, Carlos Miguel Aidar fez nascer críticas internas no clube ao atender, diante da imprensa e durante uma entrevista coletiva improvisada, um telefonema do presidente da torcida Tricolor Independente. Sem sair dos microfones, Aidar confirmou que daria 50 ônibus para transportar a organizada na saída do Itaquerão, no clássico contra o Corinthians pela Copa Libertadores.

4. Atraso de salários
O centro de treinamento foi atingido quando, pela segunda vez, o São Paulo deixou atrasar em dois meses os direitos de imagem de parte do elenco. Os vencimentos, correspondentes a parte dos salários dos atletas, atrasaram pela primeira vez após uma gestão de anos sem qualquer problema. Pela primeira vez o departamento de futebol se viu atingido pela condução financeira do clube.

5. Intromissões no futebol
Defensor da total blindagem do centro de treinamento para que os jogadores tenham o mínimo de interferência externa, Muricy Ramalho viu em 2015 aquilo que considerou exposição exagerada. Ele mesmo falou com as próprias palavras que hoje vê o CT "muito aberto" e não como era até o fim do ano passado. Muricy não se incomoda pessoalmente por ter de receber dirigentes que são de fora do futebol, mas acredita que a presença de outras pessoas no CT o impede de fazer observações e cobranças mais incisivas aos jogadores, se necessário. A comissão técnica também avaliou que a abertura do CT fez com que outros dirigentes, que não acompanham o dia a dia do time, pudessem dar palpites no futebol. 

6. Convite à organizada para treino
O que mais irritou a comissão técnica em todo esse pacote foi aquilo que pareceu um convite da diretoria para que a principal torcida organizada do clube entrasse no CT da Barra Funda para acompanhar de perto um treino de sábado - fechado à imprensa - na véspera da partida contra o Corinthians, no Paulistão. Muricy Ramalho viu, então, seu campo de trabalho completamente comprometido e indefeso, em um momento que a organizada bradava críticas ao técnico, ao gerente de futebol Gustavo Vieira de Oliveira e pediu mais empenho do time.

7. "Drible" obrigatório na organizada
Foi necessário, então, que Ataíde Gil Guerreiro interviesse e tirasse o time do CT da Barra Funda, naquele mesmo dia. A alternativa encontrada foi levar o treino para o Morumbi, no qual a torcida poderia entrar e assistir, de longe, o elenco treinar. Assim, jogadores e comissão técnica ficariam resguardados, na medida do possível.

8. Ataíde e Souza falam e viram alvos
A derrota para o Corinthians, no Morumbi, aconteceu no dia seguinte e, com ela, declarações de Ataíde e do volante Souza que não foram bem digeridas pela torcida. Souza afirmou, ainda na saída do Morumbi, que o público não foi tão bom quanto o esperado (18 mil pessoas) e que a postura da torcida deveria ser mais positiva. O vice de futebol, mais tarde, comentou à TV Gazeta que o Morumbi não estaria lotado nem se os portões fossem abertos, com entradas de graça, em crítica à pouca procura dos torcedores são-paulinos. A torcida organizada não gostou do que ouviu e fez dos dois novos alvos. No jogo seguinte, contra o São Bento, Ataíde e Souza seriam hostilizados nos cantos.

9. Explosão de Muricy, e resposta
O jogo seguinte, contra o São Bento, proporcionou uma vitória ao São Paulo, mesmo jogando mal, e fez com que Muricy Ramalho expusesse aquilo que via como negativo no clube. Depois do racha anunciado, o técnico viu manifestação pública do presidente, na manhã do dia seguinte, reiterando apoio integral e viveu dias - até aqui - de tranquilidade para trabalhar no CT. Até a organizada desmarcou o protesto que marcara para sábado, no CT da Barra Funda, véspera do jogo contra a Ponte Preta, mais tarde vencido pelo São Paulo por 2 a 1.