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Crise na economia afeta futebol e técnicos renomados perdem espaço

Celso Roth durante sua passagem pelo Coritiba, no ano passado - Divulgação/Coritiba
Celso Roth durante sua passagem pelo Coritiba, no ano passado Imagem: Divulgação/Coritiba

Vagner Magalhães e Vanderlei Lima

Do UOL, em São Paulo

06/04/2015 06h00

A crise econômica que o Brasil atravessa e as condições financeiras precárias dos principais clubes do país têm se refletido na mesa de negociações para a contratação de treinadores. As pedidas mais altas têm sido refutadas. Técnicos com menor experiência e consequentemente mais baratos estão ocupando esses espaços.

Quando acertou o seu retorno ao Corinthians, no final do ano passado, o técnico Tite aceitou reduzir o seu salário, mas em contrapartida pediu um tempo maior de contrato. De um para três anos.
 
Na contramão, o Palmeiras aceitou pagar mais por Oswaldo de Oliveira do que por seu antecessor Dorival Júnior. Porém, o time, que foi o que mais se reforçou em 2015, reduziu gastos fixos com jogadores, propondo contratos de produtividade.
 
Recentemente o Fluminense demitiu o técnico Cristóvão Borges. Para o seu lugar foi contratado Ricardo Drubscky, em um momento em que técnicos como Abel Braga, Mano Menezes, Ney Franco, Dorival Júnior e Celso Roth estão no mercado.
 
Peter Siemsen, presidente do Fluminense, explica: "Ao avaliar o investimento em técnicos contra manter uma espinha dorsal de jogadores que tem visibilidade e sejam âncoras do time, a gente optou por manter alguns jogadores dessa espinha dorsal, como referência do time, e investir menos em um treinador".
 
De acordo com ele, o período econômico vivido pelo Brasil, com uma possível retração da economia em 2015, cada vez mais deverá atingir os clubes.
 
"O nosso setor tem um número de empregos muito alto, um investimento alto. O próprio governo, ao gastar mais do que recebe, acaba gerando um aumento das taxas de juros e com isso aumenta a velocidade da correção das dívidas. Se você for avaliar os componentes desse cenário, todos são negativos em relação ao investimento no futebol. É um cenário bastante complexo em termos econômicos", diz.
 
O técnico Dorival Júnior chegou a negociar com o Santos depois da demissão de Enderson Moreira, mas Marcelo Fernandes, auxiliar de Moreira, foi efetivado. "É uma contingência natural. Primeiro, temos um número considerável de profissionais e ainda temos alguns que estão aparecendo. Isso acirra um pouco a concorrência. O mercado está começando a se estabilizar. É um dado importante, independentemente de a gente estar momentaneamente passando por essa situação", diz Júnior. 
 
O treinador afirma que negociar um salário menor faz parte do momento atual. "Isso aí nunca foi o motivo que me impediu de estar à frente de um clube, nunca foi. O profissional sempre procura ter uma valorização dentro do que ele acha conveniente. Na última conversa que eu tive com o Santos, a própria diretoria estava um pouco incerta sobre o que fazer. O profissional tem de saber os momentos. Vai ter um momento um pouco melhor, mas também terá um momento em que ele terá de dar um passo atrás". 
 
Segundo ele, uma negociação que não atinja o patamar desejado não deve ser motivo para ficar desempregado. "O profissional tem de estar trabalhando e eu nunca tive esse problema. Sempre quando eu sentei para negociar, eu abri mão de uma situação ou outra e sempre chegamos a um denominador", diz.
 
 
Para o presidente do Santos, Modesto Roma, a opção por Marcelo Fernandes, que começou como interino, se deu também pela questão salarial.
 
"Foi uma opção que nós fizemos. A questão salarial, é óbvio que tem peso, mas tem um peso relativo. A opção pelo Marcelo foi algo concreto. Se não tivéssemos ele, talvez fosse diferente. O Santos tem uma política (salarial) e não sai dela. Todos os profissionais do futebol vão ter de se adequar a uma política de não comprar sapato maior que o pé. Então, essa é a realidade, nós temos de ter essa consciência", diz o dirigente santista, que também negociou com Dorival Júnior e Vágner Mancini para o cargo.
 
"Eu conversei com o Dorival, com o Vágner Mancini e optamos pelo Marcelo. Se a opção fosse por um deles, nós discutiríamos a questão salarial para que ela adequasse às condições salariais do clube", diz.
 
Nova ordem
 
José Luís Moreira, vice-presidente de futebol do Vasco, afirma que Doriva foi contratado dentro da atual realidade.
 
"Loucura nós não vamos fazer. Se a gente começar a fazer loucuras como alguns clubes fazem, a vaca vai para o brejo. Segundo ele, a atual política do clube é investir em técnicos jovens, com ideias novas. "Técnico medalhão não passa pela nossa cabeça. Sem dúvida, são treinadores excelentes, mas temos de ser realistas". 
 
Gilson Kleina, que atualmente está no Avaí, chegou a negociar com o Vasco, sem êxito. "Todo o profissional tem de ter o seu mínimo, quanto maior é aquilo que ele conquiste dentro dos clubes. O futebol é muito desgastante. Eu penso que neste momento, os clubes estão freando um pouquinho, mas ao mesmo tempo você faz uma equação e entende que é melhor você ter uma situação sempre organizada e garantida do que estar esperando um patamar financeiro lá em cima e as coisas não acontecem". 
 
Copa do Mundo
 
Celso Roth, que está parado desde que deixou o Coritiba no ano passado, afirma que até a perda da Copa do Mundo pelo Brasil dificultou a situação.
 
"O fator econômico é um que o país está vivendo. Eu sabia que se a gente não ganhasse a Copa do Mundo, nós do futebol, profissionais, teríamos dificuldades. Quando não se ganha uma Copa do Mundo no seu país, obviamente teríamos um revés. É um conjunto de situações dentro do futebol que levou a isso", diz.
 
"Os clubes, depois que passaram a negociar diretamente com determinado setor que financia o futebol, passaram a fazer antecipações de cotas e todos eles estão com dificuldades financeiras. Isso, obviamente, vai acarretar essa situação de dificuldade de acerto também para os treinadores, sem dúvida".