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Góticos contrariam mito e formam time 'dark' que tem balada como sede

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

30/05/2015 06h01

É inevitável ficar um pouco perplexo ao ver Guilherme Freon e Tais Pandora caminhando pelo cemitério numa manhã de domingo. O visual 'dark', o cabelo moicano para lá de ousado e as roupas pretas de couro chamam a atenção em meio aos túmulos e ao silêncio do local. Adeptos do estilo gótico, de fato eles fogem bastante do padrão imposto pela sociedade ao qual todos estão acostumados.

Não é à toa que ainda têm que ouvir piadinhas e enfrentar uma série de preconceitos de gente com ideias prontas na cabeça do tipo: góticos têm rituais satânicos, fazem bagunça em cemitério ou sofrem de depressão.

“Tem muita coisa que ainda hoje a gente escuta, que é coisa do diabo, que gótico é satanista, ou que mexe com bruxaria ou que bebe sangue, ainda acontece muito. Diminuiu bastante de uns tempos para cá porque já é mais comum, o alternativo já é mais aceito de certa forma, mas ainda existem alguns preconceitos e estereótipos. Acho que hoje o gótico não é tão mau visto, mas alguns góticos têm culpa, falam muita besteira, fazem muita besteira e acabam contribuindo para a formação de estereótipos e preconceitos”, conta Freon.

Mas basta iniciar uma conversa para quebrar o gelo e colocar por terra qualquer ideia assustadora que possa vir à cabeça. Os sorrisos fáceis, a gentileza e a simpatia saem de trás da carcaça ‘dark’ e revelam pessoas doces que em nada lembram todos os rótulos.

Um dos vários mitos que eles já chutaram para o alto, literalmente, é que gótico não pratica esportes. Prova disso é que existe um time de futebol gótico.

O Real Gothic Brasil fez seu primeiro amistoso em 2009, mas foi em 2012 que a equipe ganhou corpo e virou a versão brasileira do Real Gothic, primeiro time formado por góticos no mundo, fundado na Inglaterra, em 2004.

É um time diferente, é verdade. Eles só jogam ao lado de uma caixa de som que toca um rock pesado, só se vestem de preto e entram em quadra de maquiagem.

“Tem um mito que gótico não pratica esporte e que gótico é sedentário, avesso a qualquer prática esportiva, ou sei lá, só joga xadrez com a morte, mas é mais um mito. Eu, por exemplo, sou gótico, adoro futebol e jogo num time formado por góticos. Outros góticos gostam também, tem um time lá na Inglaterra e muitos gostam de esporte e de futebol”.

O time tem uma menina entre os homens. Tais se sente à vontade e é bem aceita no grupo, já que uma das características dessa cultura é não fazer distinção de sexo e valorizar a figura da mulher. Tanto que os homens incorporaram hábitos do universo feminino nas roupas e no uso de maquiagem.

“Na hora que a gente chega para jogar em qualquer quadra o visual de cada um já chama a atenção por si só. O fato de ter uma mulher jogando com os homens causa o mesmo impacto, mas ainda acho que o visual gótico causa mais estranhamento do que o fato de ser mulher jogando com os homens”, conta ela.

E engana-se quem pensa que o ‘clube’ não é organizado. Tem uma página na internet com informações, notícias, perfis dos atletas e até o seu lema. “O Real Gothic Brasil pretende reunir góticos, darks e similares para praticar algum esporte, torcer e se divertir. Mais do que futebol, o Real Gothic Brasil é música e cultura alternativa”.

Assim, qualquer pessoa que se identifique com a cultura está convidada a participar dos jogos que costumam acontecer em um clube no bairro da Mooca, em São Paulo.

E eles têm até uma sede onde se reúnem antes e depois dos jogos, montam a estratégia, conversam sobre tática e analisam os adversários. Mas o Aeroflith é bem diferente de qualquer centro de treinamento convencional. Além de sede, é uma balada e tem uma decoração super especial.

Logo da entrada já dá para perceber que não é um local comum. É um ambiente escuro com pouquíssima iluminação, tem filmes de terror pendurados nas paredes, teias de aranhas nos lustres, esqueletos e máscaras, além de um gato que circula livremente.

“Esse é um ambiente peculiar, bem escuro e com uma decoração que pode ser pesada para alguns, mas diz muito sobre o que a gente gosta, sobre nossos gostos e preferências. Acho que o gótico sabe apreciar a noite, gosta da noite, se dá bem com a noite”, conta Freon.

E como ninguém é de ferro, depois do trabalho é hora de se divertir. As cervejas saem da geladeira e a caixa de som voltar a pulsar ao ritmo de The Cure ou Depeche Mode para comemorar uma vitória ou esquecer a derrota daquele dia.