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Possível sucessor de Del Nero dá poder a filho que responde por tráfico

Delfim Peixoto Filho (dir.) diz que contratou filho porque  federação é privada - Divulgação/CBF
Delfim Peixoto Filho (dir.) diz que contratou filho porque federação é privada Imagem: Divulgação/CBF

Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

06/06/2015 00h01

Se o atual presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Marco Polo del Nero, deixar o cargo antes do fim de seu mandato, segundo o estatuto da entidade, assumirá o posto o atual vice-presidente mais velho da entidade, Delfim Peixoto Filho.

Se isso ocorrer, a CBF será comandada por um cartola que preside a Federação Catarinense de Futebol ininterruptamente há 30 anos e que emprega na entidade a nora e o próprio filho, Delfim Peixoto Neto. O filho do cartola tem um passado de polêmicas, chegou a passar um ano preso por tráfico de drogas em 2007 (quando já trabalhava na federação) e até hoje responde pelo crime na Justiça catarinense.

O atual vice da CBF é presidente da FCF (Federação Catarinense de Futebol) desde 1985. Em 2007, nomeou seu filho Delfim Peixoto Neto como assessor especial da presidência, logo depois deste ter deixado uma clínica de tratamento de usuários de crack, onde estava graças a uma condenação judicial por porte de droga.
 
Três meses depois, ele foi preso em flagrante por tráfico de drogas portando 132 gramas de crack, adquiridas em um bar onde funcionava uma rinha de canários, no município de Camboriú, no litoral catarinense. A polícia havia grampeado seu telefone e descobrira que ele iria ali comprar a droga para, depois, revender a uma terceira pessoa.
 
Durante o processo criminal, o filho do vice-presidente da CBF alegou que era viciado desde os 16 anos, e que a droga era para consumo próprio. Disse que fumava de dez a 15 gramas de crack por dia e, eventualmente, fazia uso também de drogas injetáveis. Afirmou ainda que não precisava traficar para ter dinheiro, já que trabalhava para o Joinville Esporte Clube e também na FCF, e que também a sua esposa trabalhava na FCF.
 
Uma testemunha de defesa confirmou o que dizia Peixoto Neto, e contou também que já tinha visto o acusado chegar para trabalhar na FCF exalando o cheiro da droga e portando algumas pedras de crack no bolso e nas mãos.
 
Os argumentos da defesa não convenceram a Justiça, que condenou o filho do presidente da FCF a cinco anos e cinco meses de prisão por tráfico de drogas. Em agosto de 2008, quando ele já estava há um ano cumprindo pena, foi solto da cadeia, pois seus advogados conseguiram a anulação do julgamento, sob a alegação de que o magistrado que julgara o caso não detinha os requisitos legais para fazê-lo.
 
De acordo com André Lozano, do escritório RLMC Advogados, especialista em direito e processo penal, a anulação do primeiro julgamento se deu em virtude da "inobservação do princípio do juiz natural". "O juiz que deveria julgar o caso se declarou impedido por motivos pessoais. O novo juiz que assumiu não pertencia à vara que deveria ser a responsável pelo processo. Assim, a defesa obteve a anulação".
 
O processo, então, voltou à estaca zero, e Peixoto Neto agora aguarda em liberdade pelo novo julgamento, que está marcado para o próximo dia 30 de julho. 
 
Ao deixar a prisão, ele voltou a trabalhar na FCF, onde está até hoje. Ele atua como delegado da federação em jogos oficiais, representa o pai em compromissos e viagens ligadas à federação e auxilia o gabinete da presidência em assuntos gerais.
 
No dia 11 de julho de 2010, Peixoto Neto estava no estádio do Joinville acompanhando a final da Copa de Santa Catarina, disputada entre o time da casa e a equipe de Brusque. Os visitantes acabaram por sagrar-se campeões.
 
Um minuto após o apito final, Delfim Peixoto Neto, acompanhado de dois amigos (sendo um deles árbitro oficial da FCF), invadiu uma das cabines de rádio do estádio e espancou o narrador de Brusque Rodrigo Santos, que ainda estava no ar quando foi agredido. O áudio pode ser ouvido abaixo: 
 
 

No dia seguinte à agressão, o presidente da FCF convocou uma entrevista coletiva para dizer que lamentava o episódio e que não aprovava a conduta do filho. Apesar disso, seu cargo como assessor especial da presidência foi mantido.

Na última sexta-feira (5), o jornalista Rodrigo Santos falou com o UOL Esporte sobre o ocorrido: "Ele (Delfim Peixoto Neto) já entrou me dando um soco na cara e sem falar nada. Eu caí no chão e tomei chutes por todos os lados". Santos contou que a ira do filho do cartola foi despertada pelo fato de o jornalista ter noticiado que um vice-presidente da FCF havia dito que Peixoto Neto influenciava na escolha dos árbitros das partidas oficiais em Santa Catarina, e que muitas vezes a federação dizia que havia um sorteio mas, na realidade, o juiz era escolhido pela vontade dos cartolas.

Rodrigo Santos, jornalista de Brusque - Maurício Haas - Maurício Haas
Assim ficou o jornalista Rodrigo Santos após o espancamento que sofreu
Imagem: Maurício Haas

"Por causa disso, a FCF teve que transmitir via internet o sorteio do árbitro para a final da Copa de Santa Catarina. Daí, quando o time dele, o Joinville, perdeu, ele ficou muito bravo", conta Santos.

Novamente, o presidente Peixoto Filho deu entrevista para dizer que, sim, seu vice-presidente havia dito aquilo que o jornalista noticiara, mas que ele estava equivocado, que não havia tal prática de burlar os sorteios de arbitragens dentro da FCF.

Três anos depois, em julho de 2013, depois da vitória do Marcílio Dias por 3 a 0 contra o Hercílio Luz, no estádio Gigantão das Avenidas, em Itajaí, Delfim Peixoto Neto subiu as arquibancadas para tirar satisfação contra um colunista esportivo catarinense chamado Zélio Prado, de 62 anos. Ele cuspiu na cara do jornalista e o agrediu com socos. A ação foi filmada por uma equipe de TV local.

Na última sexta-feira (5), o UOL Esporte conversou com o presidente da FCF e vice-presidente da CBF, Delfim Peixoto Filho. Perguntou do motivo da contratação do filho como assessor especial da FCF. "Ele entende muito de futebol, é um ótimo assessor e me ajuda muito", disse o cartola. Perguntou sobre a relação do filho com as drogas. "Ele nunca foi traficante. O delegado qualificou assim porque não gosta de mim. Ele era viciado, mas está completamente recuperado." Perguntou, finalmente, se ele não acredita que seria nepotismo contratar o próprio filho e a nora para trabalhar na federação. "Nepotismo? Como assim, nepotismo? Nepotismo acontece em instituição pública! A FCF é uma entidade privada". O UOL Esporte procurou Peixoto Neto na Federação Catarinense, mas não conseguiu contato.

O presidente da Federação Catarinense já está pronto para assumir a CBF caso as suspeitas de envolvimento em casos de corrupção contra Del Nero tornem insustentável a permanência dele na chefia da instituição.

Del Nero, por sua vez, convocou uma assembléia geral da CBF para a próxima quinta-feira (11). Há a expectativa de que se tente alterar o estatuto da entidade, retirando a regra de que, na falta do presidente antes do fim de seu mandato, assuma o cargo o vice de idade mais avançada. Delfim, de 74 anos, diz que qualquer tentativa de mudar as regras nesse momento será um golpe