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Por que o futebol brasileiro não se posicionou na causa do casamento gay?

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

30/06/2015 06h01

A liberação do casamento gay nos Estados Unidos gerou um grande burburinho na última sexta-feira.  A comoção foi geral: grandes empresas, governos, chefes de estado e celebridades vestiram seus avatares com as cores do arco-íris nas redes sociais em apoio à decisão da Suprema Corte Americana.

No âmbito esportivo, a organização dos Jogos do Rio de 2016 também usou as cores do arco-íris e a MLS (liga de futebol profissional nos EUA) foi outro a aderir à causa. Já no Brasil, o futebol preferiu ficar fora da onda.

Chamou a atenção o fato de nenhum time de expressão do país fazer qualquer menção ao tema. Os jogadores que costumam usar as redes sociais também não se manifestaram.

Se marcas famosas e celebridades compraram a ideia, por que ninguém no mundo do futebol nacional não se manifestou?

Doutor em sociologia pela Universidade de Nova York e com um pós-doutorado em Buenos Aires, sempre com teses relacionadas ao futebol, Ronaldo Helal acredita que, no Brasil, o meio do futebol ainda tem muito enraizado o preconceito em relação aos homossexuais.

Em sua visão, assumir uma posição favorável à causa gay é correr um risco grande de virar alvo de chacota dos rivais e sofrer rejeição dentro da própria torcida.

“No futebol brasileiro e argentino, existe muito a cultura do macho, viril. As torcidas tendem a fazer ofensas homofóbicas, não só ao juiz, mas contra à outra torcida. Tem a questão da virilidade do homem macho muito forte. Existe o estereótipo de que o homossexual é menos viril, menos homem, é frágil, menininha. Sempre apelam para a sexualidade, se amarelou é porque é bichinha. Essa visão equivocada”, disse Ronaldo Helal.

“Se um time sai na frente com uma ação como essa pode virar alvo de gozação rival. E a própria torcida pode não aceitar esse pioneirismo. O que seria uma coisa ótima por um mundo mais justo, mais fraterno, que aceita o diferente. Mas se o Flamengo compra isso sozinho, então ‘bambi’ é o Flamengo. É um ambiente muito complicado, tanto que em mais de 115 anos de futebol no Brasil, sendo 70 de profissionalismo, não temos um relato de algum jogador que assumiu ser gay. E é óbvio que tem porque há em todos os setores da sociedade”.

Helal ressalta ainda a importância de alguém dar um primeiro passo em busca de uma aceitação maior. “Alguém um dia vai ter que dar um passo para mudar. Se um ex-jogador como Romário, que hoje é senador, tem o afeto das pessoas e foi herói de uma conquista, colocasse a foto colorida, seria um gesto muito importante. Seria um tremendo gol de placa. Ou se juntassem ídolos como ele, Zico, Reinaldo, Casagrande, Júnior e Falcão. Ou se os clubes fizessem uma ação conjunta. Aí não teria chacota”.

O UOL Esporte procurou alguns clubes importantes do futebol brasileiro para entender por que preferiram não se manifestar. De uma maneira geral, as agremiações afirmaram que consideram a causa importante, mas têm outras prioridades e preocupações.

O diretor de futebol do Corinthians, Marcelo Passos, por exemplo, disse que o casamento gay já é uma realidade do país. Ele se refere ao ano de 2011, quando o STF (Supremo Tribunal Federal) reconheceu a equiparação da união homossexual à heterossexual.

Dois anos depois, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu que os cartórios brasileiros fossem obrigados a celebrar casamento entre pessoas do mesmo sexo e não poderiam se recusar a converter união estável homoafetiva em casamento.

Passos, no entanto, afirmou que está focado em outros assuntos internos. “Foi aprovado nos Estados Unidos esse ano, mas é uma lei que está aprovada no Brasil desde 2011. A gente já comemorou, aqui já é uma realidade. Foi um assunto bacana que aconteceu do ponto de vista mundial, mas aqui no Brasil já existe. Quanto mais países aceitarem, melhor, mas estamos focados na realidade do Corinthians, em como o time está funcionando e em tudo o que a gente tem feito. Estamos focados em construir a marca Corinthians e em montar um bom time de futebol. Esse assunto já é velho, a lei foi aprovada em 2011”.

O diretor de marketing do Botafogo, Márcio Padilha, também se mostrou favorável à causa, mas afirmou que o clube tem outras prioridades.

“É uma opinião pessoal. Tenho amigos gays e convivo em harmonia, mas não é um avatar colorido que vai ajudar. O futebol tem outras preocupações, a sobrevivência do clube, a política do futebol, as nossas coisas. Tivemos um fim de semana movimentado com jogo, a estreia do futebol americano, documentário sobre o título de 95... Não que não tenha interesse, mas se priorizou outras coisas e não temos nada contra. A gente tem tanta coisa para resolver, tanto incêndio para apagar”, afirmou Padilha.

A mesma opinião foi compartilhada pelo diretor de marketing do Grêmio, Beto Carvalho. “É uma questão muito pessoal, sou completamente a favor da pluralidade, não vejo nenhum tipo de problema em relação a isso. Não foi feito nada por uma questão de oportunidade ou de temática a ser usada, não temos que pegar todos os assuntos e usar. Mas não há um problema sobre isso, o Grêmio é plural”.