Topo

No futebol brasileiro ninguém quer usar a camisa 24. Qual o problema dela?

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

02/07/2015 06h00

Os jogadores no futebol brasileiro não são mais escalados da maneira tradicional de 1 a 11. Os números estampados nas costas dos atletas se multiplicaram e se transformaram em número de jogos pelo clube e até homenagens à família. Mas o Campeonato Brasileiro tem uma camisa em especial que ninguém quer usar: a 24.

Na Série A do Brasileirão, a camisa é rejeitada. Apenas dois times têm jogadores que representam o número folclórico em seus elencos. No Cruzeiro, o dono da camisa é o terceiro goleiro Elisson. Já no Inter, é o lateral esquerdo Geferson.

Com exceção dos dois, os jogadores ignoram o número, mesmo nos clubes que estabelecem numeração fixa para o elenco.

Mesmo as escolhas de Elisson e Geferson têm uma explicação. A Copa Libertadores exige que a numeração dos inscritos para o torneio seja fixa e em ordem crescente. Então não tem como fugir do 24. No caso de Inter e Cruzeiro, os clubes simplesmente mantiveram o que havia sido determinado pelo torneio.

Já os outros times mudaram suas camisas para o Brasileirão. O Corinthians, por exemplo, teve Matheus Vidotto como o número 24 na Libertadores, mas no Brasileiro ele veste a 32. O mesmo aconteceu no Atlético-MG com o terceiro goleiro Uilson que agora também é dono 32. No São Paulo, o garoto João Paulo trocou a 24 pela 37, que havia sido do meia Lucas.

A camisa folclórica, de fato, pode gerar piadas e incomodar alguns jogadores. O goleiro Cássio, do Corinthians, foi campeão da Libertadores de 2012 com a 24 nas costas. Após um jogo do Brasileiro contra a Portuguesa, ouviu uma brincadeira do então repórter do CQC Felipe Andreoli sobre o simbolismo do número.

“Você trocou a camisa com o Dida por ser fã dele ou para se livrar da camisa 24 logo?'', brincou, na ocasião. “''Os dois, mas isso daí já está com os dias contados, o número 24 vai mudar já'', respondeu ele.

Insatisfeito com o número, Cássio pediu para vestir a 12 assim que o meia Alex foi negociado e deixou o número vago no elenco do Corinthians.

O diretor de futebol do Flamengo, Rodrigo Caetano, afirma que os números são escolhidos pelos jogadores e que existe um certo desconforto em relação à camisa.

“Quando a numeração é fixa, são eles quem escolhem. Talvez por conta dessa questão cultural ou mesmo de certos pré-conceitos, eles não gostam muito. Quando se trabalha com número fixo, quem escolhe é o jogador, a não ser quando o clube busca trabalhar alguma ação de marketing. Nos clubes que tiveram numeração fixa até o 24, eles normalmente não gostam. Ou já aconteceu de ser um número disponibilizado para goleiros quando tem três ou quatro goleiros”.

O ex-jogador Aloísio Chulapa, campeão mundial pelo São Paulo, disse que nunca viu alguém vestir a 24. “Ninguém gosta de usar. Às vezes até quando faz aniversário e completa 24 anos, fala que fez 23 anos e meio. Acho que tem a ver com um certo preconceito. Mas acho que não devia ter nada a ver não, tem que respeitar. Gay ou não, homem é homem, tem que vestir a camisa e jogar, botar para dentro de campo e jogar futebol”.

Mas qual o problema da camisa 24 e por que ela incomoda tanto? Alguns podem considerar uma questão de hábito, cultura e até mesmo preconceito.

No imaginário popular, o número 24 está associado ao movimento gay. Isso porque o veado, animal folcloricamente associado à causa, representa o 24º animal no Jogo do Bicho.

O numerólogo Gilson Chveid Oen, especializado em numerologia científica e engenharia dimensional, tem outras explicações. No entanto, ele acredita que o número realmente se relaciona com a construção de um universo mais feminino. Por isso, a rejeição.

Oen explica que o número 2 representa a figura da mulher. Já o 4 é o número do trabalho e da construção.

“O 24 é a construção da experiência feminina e isso remete à homofobia. O 24 tira do jogador a imagem de combatividade e virilidade. É como se fosse soltar a sensibilidade, ficar mais sensível, de alguma forma”, disse ele, que faz trabalhos com profissionais que vão de executivos e atrizes globais como Sheron Menezzes. Ela acrescentou uma letra Z ao sobrenome, aconselhada por Gilson.

Segundo o numerólogo, o atleta não precisa ter conhecimentos de numerologia para rejeitar o número porque essas noções são inconscientes e intuitivas. Mas ele vai além da relação com a homossexualidade. Na visão de Gilson, o número 24 não é apropriado para quem quer ter sucesso no futebol.

“2 + 4 = 6. O 6 é o número da família, representa a experiência da família no cérebro. E para o futebol essa conotação não é boa. A família está associada ao sentimento de proteção e segurança. Isso tira a seriedade do jogo, tira o lado aguerrido, guerreiro, brigador. É como se todo mundo tivesse jogando em família, não vai dar carrinho, vai jogar mais leve como se estivesse com o primo, com irmão. Tira a ousadia”.