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Cotas para jovens e apoio psicológico: as dicas de ex-técnicos para Dunga

Dunga esteve reunido com ex-técnicos da seleção na última segunda-feira e recebeu dicas - REUTERS/Andres Stapff
Dunga esteve reunido com ex-técnicos da seleção na última segunda-feira e recebeu dicas Imagem: REUTERS/Andres Stapff

Guilherme Costa

Do UOL, no Rio de Janeiro

07/07/2015 06h00

Afinal, quais são as mudanças necessárias para o futebol brasileiro? Para técnicos que passaram pela seleção, a lista inclui aspectos como cotas para jogadores jovens, apoio psicológico a atletas da seleção brasileira, fortalecimento dos clubes e mecanismos que retardem o êxodo de atletas para o futebol europeu. Esses foram os principais aspectos abordados por sete ex-treinadores da equipe nacional (Candinho, Carlos Alberto Parreira, Carlos Alberto Silva, Ernesto Paulo, Mario Jorge Lobo Zagallo, Paulo Roberto Falcão e Sebastião Lazaroni) em encontro com a atual comissão técnica na última segunda-feira (06), na sede da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), no Rio de Janeiro.

O encontro foi a primeira etapa do conselho de desenvolvimento estratégico do futebol brasileiro. Depois de uma reunião com ex-treinadores da seleção, a ideia da CBF é ter fóruns similares com treinadores da Série A do Campeonato Brasileiro, treinadores estrangeiros, jogadores, profissionais da imprensa e representantes de ciências do esporte. Ainda não há cronograma definido para os novos eventos.

Na segunda-feira, a reunião começou com uma apresentação de Dunga e Gilmar Rinaldi, coordenador de seleções da CBF. Os dois fizeram um diagnóstico das equipes nacionais no atual momento, do profissional às categorias de base. Depois, os antecessores abordaram suas experiências e sugeriram uma série de coisas para melhorar o futebol local (e não apenas a seleção).

Veja abaixo algumas dicas que os ex-treinadores da seleção deram a Dunga:

Cota para jovens nas Séries B e C do Campeonato Brasileiro

A ideia foi levantada por Candinho, que comandou a seleção de forma interina em 2000. “A Série B e a Série C não têm um jogador de 20 anos. Só há atletas de 30, 35. Temos de fazer uma reestruturação para atuarem quatro ou cinco com até 21 anos. Nós não aceitamos estrangeiros aqui? Por que não podemos colocar na Série B e na Série C a obrigatoriedade de quatro moleques de até 21 anos? Não tenho nada contra ninguém e acho que pode jogar até o jogador de 50 anos, mas é preciso abrir vaga para os jovens”, explicou.

A ideia de Candinho é que a imposição de um mínimo de atletas com faixa etária mais baixa ajude a desenvolver os jogadores e crie uma faixa de transição até que eles sejam efetivamente incorporados aos profissionais. O treinador espera que a mudança seja feita via ação da CBF em alteração no regulamento geral de competições. A entidade ainda não se pronunciou sobre o tema.

Mecanismo que limite transferências de jogadores jovens

Tema levantado por Carlos Alberto Parreira, a transferência de jogadores jovens para o futebol do exterior foi apontada por ex-treinadores da seleção como um indutor do atual modelo da seleção brasileira.

“A solução nós ainda não sabemos, mas é preciso criar um mecanismo. Via governo, talvez. O Falcão estava falando sobre isso: sabe com qual idade ele foi para a Roma? 27 ou 28 anos. O Zico foi para a Udinese com 27 ou 28 anos. Hoje eles estão saindo com 14, 15 ou 16 anos. Temos de criar uma maneira de interromper isso. Não impedir que eles saiam, mas não permitir que eles saiam tão cedo. Eles não terminam a formação futebolística e social aqui no Brasil. Até mesmo em termos de maturidade, é importante que eles saiam formados”. Apesar do diagnóstico, os ex-treinadores não debateram qualquer meio de mudar.

Trabalho psicológico

Outro aspecto abordado foi a questão emocional dos jogadores da seleção brasileira. “Falamos, discutimos, e isso sempre vai ser importante. Um time para ser campeão tem de estar equilibrado emocionalmente. Não adianta botar psicólogo para trabalhar três dias com o jogador que não vai funcionar. O máximo que dá para fazer é trazer um psicólogo para traçar um perfil dos jogadores e mostrar para o técnico”, explicou Parreira.

A cobrança sobre um trabalho psicológico surgiu após declarações de Carlos Alberto Silva, que passou pela seleção brasileira entre 1987 e 1988. “Trouxe a ideia de que precisamos de um líder, precisamos coordenar melhor as opiniões e temos de tocar para frente”, relatou.

Até a Copa do Mundo de 2014, Thiago Silva era o capitão da seleção brasileira. No entanto, o principal líder daquela equipe transformou-se em símbolo de um time que implodiu emocionalmente. Alijado das primeiras convocações da nova “era Dunga” por questões físicas, o defensor perdeu a braçadeira para Neymar, que também foi mal em sua primeira competição com a nova condição. Na Copa América, o camisa 10 foi expulso em derrota por 1 a 0 para a Colômbia, tentou cobrar o árbitro e acabou suspenso por quatro partidas.

Fortalecimento dos clubes

Uma das principais contribuições de Paulo Roberto Falcão foi usar uma expressão que ele e Dunga repetiram depois da reunião: “a seleção brasileira é apenas o topo de uma pirâmide”. No encontro, o ex-responsável pelo cargo apontou o desenvolvimento dos clubes como um ponto nevrálgico em qualquer debate sobre a equipe nacional.

“Minha contribuição foi em cima de a gente pensar no futebol no médio prazo, no curto, que é a classificação para a Copa, e também no Mundial. Mas nós ainda temos de pensar em fortalecer nossos clubes, e o mais importante é fortalecê-los a partir do futebol de base. E quando eu falo base, não me refiro a 18 ou 19 anos. Falo de antes, de trabalhar fundamentos e priorizar o talento, a qualidade”, relatou Falcão.

“Quando tudo isso funciona, lá em cima funciona bem. Em 1958 e 1962 o Brasil foi campeão com três clubes que eram maravilhosos: Santos, Botafogo e Vasco da Gama. A seleção da Alemanha foi campeã em 1974 e 2014 com a base do Bayern de Munique. É importante ter clubes saudáveis, com condições técnicas e bons jogadores”, corroborou Parreira. Mais uma vez, porém, o diagnóstico não foi seguido por ideias.

Organização e não craques

Os técnicos que estiveram no encontro foram unânimes ao defender a atual geração da seleção brasileira. Todos eles disseram que há valores de qualidade, ainda que o número de craques tenha rareado. Surgiu daí outra questão debatida.

“O erro é procurar craque. Nós não temos de procurar craque, mas jogadores acima da média. Eu já penso na Alemanha – temos de nos referir à Alemanha, lamentavelmente, mas com toda justiça. A Alemanha não tinha nenhum craque. Você não consegue apontar um craque, mas cinco ou seis jogadores acima da média e um planejamento muito bem feito, que pensou em toda a Copa do Mundo. Inclusive o fardamento segundo deles era a camisa do Flamengo. Eles pensaram até nisso. Eles se prepararam de forma minuciosa e competente, mas não tinham um Neymar, um Cristiano Ronaldo, um Messi ou um Maradona”, disse Falcão.

Cobranças

Depois da reunião, todos os técnicos que conversaram com a imprensa elogiaram o trabalho de Dunga e os conceitos que o atual dono do cargo tem usado para formar a seleção brasileira.

Sebastião Lazaroni, técnico da seleção na Copa de 1990 – quando Dunga foi atleta –, foi um dos menos comedidos nos elogios: “Se eu tiver de falar alguma coisa sobre ele... hoje eu tive uma oportunidade de dizer pessoalmente. Teve cobrança e elogio”.

Questões políticas

“Não, não falamos sobre isso”. Foi assim que os ex-técnicos da seleção reagiram quando foram questionados sobre a atual estrutura do futebol brasileiro e o quanto isso causa alguns dos problemas que eles relataram.