Topo

Argel diz que rejeitaria seleção, recusou Flu e quer "padrão Tite" no Inter

Argel tem contrato até dezembro e diz sonhar com renovação por mais dois anos - Ricardo Duarte/Divulgação SC Internacional
Argel tem contrato até dezembro e diz sonhar com renovação por mais dois anos Imagem: Ricardo Duarte/Divulgação SC Internacional

Jeremias Wernek

Do UOL, em Porto Alegre

08/04/2016 06h00

Argel Fucks tem um plano. Há oito meses como treinador do Internacional, ele sonha em repetir os passos de Tite no Corinthians, Alex Ferguson no Manchester United e Diego Simeone no Atlético de Madrid. Independente do estilo de jogo, a ideia é criar uma identidade com o clube. Para realizar essa meta, ele afirma ter recusado procura do Fluminense.

Em entrevista ao UOL Esporte, Argel revelou as consultas. O contato do Flu ocorreu em fevereiro, após a demissão de Eduardo Baptista. Ao canal Esporte Interativo, o técnico falou sobre a procura do Figueirense também.

Citado nominalmente em entrevista ao EI, Peter Siemsen, presidente do Fluminense, afirmou por meio de assessoria de imprensa que não comentará o assunto.

"Meu desafio é ficar quatro ou cinco anos no Internacional, vencer títulos. Se quisesse sair do Inter, já poderia ter saído. Já recebi convites de times de ponta nesse ano, mas não quis. Agradeci e fiquei no Internacional. Eu comi o pão que o diabo amassou para chegar aqui", disse Argel.

Além disso, o ex-zagueiro de Inter, Santos e Palmeiras garante que não tem o sonho de treinar a seleção brasileira. O ápice seria comandar Portugal ou o Benfica, por onde atuou.

Confira a entrevista completa abaixo:

UOL Esporte: Estamos no início de abril. Quando você sentou para planejar 2016, certamente traçou meta para o período. Você considera que o trabalho, neste momento, está em que estágio?
Argel: Primeiro você faz um projeto e ele engloba diretoria, comissão técnica... O Inter precisava de uma reformulação, ela estava atrasada. E por jogarmos só Gauchão e Primeira Liga, ganhamos o tempo necessário para rejuvenescer a equipe. Esse não é um pensamento só meu, é do clube. Nós apostamos na base, subindo muitos garotos e dando confiança a todos eles. Conseguimos dar padrão na parte técnica e tática, dar uma melhorada na parte física. Esse era um problema crônico, no ano passado faltou a preparação física ideal. A gente conseguiu melhorar em todas as áreas. Fizemos um time mais competitivo, veloz e agressivo. É um time que joga um futebol com transição mais rápida. Claro que não estamos no nível ideal, temos que crescer. Mas o caminho é esse...

UOL Esporte: Está no meio do caminho, então?
Argel: Um pouco mais, eu acredito. Estamos entre 60 e 70% daquilo que podemos render. Os jogadores sabem a forma de jogar, os jogadores que temos são versáteis e nos dão muitas possibilidades. Temos dois volantes e depois deles, podemos variar sempre.

UOL Esporte: A gente percebeu que o Inter tentou coisas diferentes, em diferentes partidas, neste começo de ano. No âmbito tático. Nas férias você procurou algo novo em livros, colegas, jogos?
Argel: Primeira coisa é que você não aprende nada sobre futebol em livro. Futebol você aprende se for ver, se participar. Estive em Portugal, vi o que eles estão fazendo por lá e conversei com várias pessoas. Mas o que difere este ano do outro é tempo. Eu fiz 10 jogos seguidos, logo que cheguei, com três dias de descanso entre eles. Não tinha como trabalhar nada. Nada. A grande diferença não é que fui estudar futebol, eu sou treinador há oito anos. Passei por 15 clubes antes de chegar ao Internacional, passei por vários estágios. Ganhei do Inter com São José, Figueirense... O meu trabalho foi que me trouxe aqui. Mas para qualquer coisa, é preciso de tempo. É preciso tempo para dar padrão, criar modelo de jogo. Com o tempo, aí é possível programar trabalhos e formar trabalho duradouro. A única diferença é o tempo.

Esse ano nós conseguimos fazer trabalhos diferentes. Agora eu conheço a comissão técnica e sei que posso delegar tarefas para os auxiliares. Não preciso me desgastar em todos os treinos, o Odair (Hellmann), Galego e André (Döring) conseguem comandar trabalhos bem. Tem voz de comando. Aí você pode dividir os turnos e trabalhar bem. A partir do momento em que convivi e vi que eles têm voz de comando, dividi as coisas. Ano passado a gente chegava 30 minutos antes do treino. Agora chegamos 1h30 antes e revisamos tudo. Planejamos cada minuto do treino, a semana inteira. O mês. Cada um tem liberdade para dar opinião, e eu não sou centralizador. Eu escuto todo mundo, afinal de contas 10 cabeças pensam melhor que uma.

UOL Esporte: Você acha que é subestimado?
Argel: Eu não... Não vejo isso.

UOL Esporte: É que mesmo com números bons, no segundo turno do Brasileirão e neste ano (Inter perdeu apenas um jogo, para o Veranópolis), há contestação ao trabalho. Talvez por você não parecer com um perfil vendido como de treinador moderno...
Argel: Não me preocupo com isso, sinceramente. Sei conviver com isso, não preciso provar nada para imprensa e torcedor. Eu moro em Porto Alegre, vou ao mercado, posto de gasolina e farmácia e a torcida me cumprimenta. Me dá voto de confiança. A imprensa avalia, elogia e critica. Eu faço meu trabalho em cima de uma diretriz. Sei de onde saí, tenho convicção. Venci como jogador assim, estou vencendo como treinador assim. As pessoas podem achar que fico triste, brabo. Eu não ligo. A minha diretriz, a minha forma, não vou mudar. Eu sou o mesmo quando ganha, perde ou empata. Não mudo com os jogadores, com a imprensa. Com ninguém. A forma que uso me fez vencer mais do que perder, então tem seu valor. Mas não me apego. Se achar outro jeito que me faça vencer mais, vamos lá.

UOL Esporte: Quem é o melhor time do Brasil, atualmente?
Argel: O melhor time... (pausa). Acho que o Corinthians continua jogando bem. O Corinthians criou uma identidade, essa é a verdade. Soma as duas passagens do Tite aí, soma. Dá quase cinco anos. O Corinthians tem um jeito definido de jogar futebol e ninguém mais no Brasil tem isso. É o jeito do Tite. Todos os funcionários conhecem ele, todos os jogadores, a diretoria. Torcedor. Isso ajuda a criar identidade de trabalho. E isso só vai se conseguir com três, quatro, cinco ou sete anos. Me lembro do Manchester United com o Alex Ferguson. O Barcelona e sua identidade. O Atlético de Madrid do Diego Simeone. Jorge Jesus no Benfica, Mourinho no Porto e no Chelsea.

UOL Esporte: Em um cenário hipotético, se amanhã você fosse convidado para treinar a seleção brasileira. Iria?
Argel: Não.

UOL Esporte: Por quê?
Argel: Não tenho vontade nenhuma de treinar a seleção brasileira.

UOL Esporte: Pelo momento da CBF?
Argel: Não, simplesmente não tenho o interesse. Nunca me fascinou e acredito que nunca vai ter isso. Nunca foi meu objetivo, meu desafio. A seleção portuguesa e o Benfica me fascinam. A seleção brasileira não. Mas agora estou muito feliz, estou em um clube de ponta do Brasil. Pretendo renovar meu contrato, que vai até dezembro. Pretendo criar uma identidade com o clube. Ficar quatro ou cinco anos no Inter, fazendo mais ou menos aquilo que o Tite fez no Corinthians. Criar identidade do treinador com a equipe e seu jeito de jogar. Aí, no futuro, quem sabe eu possa treinar em Portugal. Mas claro que para chegar lá, preciso ganhar um Brasileirão, Libertadores. Tenho vontade muito grande de jogar Libertadores como treinador. Acho que o perfil da Libertadores vai se encaixar demais no meu perfil de treinador...

Se quisesse sair do Inter, já poderia ter saído. A partir do momento em que você trabalha bem, em um clube gigante como o Internacional, tem reconhecimento. Já recebi convites de times de ponta, neste ano, e recusei. Não pensei em momento algum na hipótese. Comi o pão que o diabo amassou para chegar aqui. E se sair, não tem problema algum também, vou ficar menos de 10 dias desempregado. Mas receber contato é bom, significa que existe uma boa imagem do seu trabalho. Isso dá confiança maior de seguir em frente.