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Maurílio encarou vaias para brilhar no Palmeiras. Agora, é técnico de zebra

Marcello De Vico e Vanderlei Lima

Do UOL, em Santos e São Paulo

10/05/2016 06h00

Maurílio dificilmente seria citado logo de cara por palmeirenses que, em uma conversa de bar, começassem a destacar os principais jogadores dos times de 1993 e 1994, nos primeiros anos da chamada Era Parmalat. A história, porém, mostra que o atacante também teve sua devida importância na equipe de Vanderlei Luxemburgo que tinha craques como Edmundo, Evair, César Sampaio, Edílson e Roberto Carlos, entre outros.

Maurílio era reserva, mas contava com a confiança do treinador e costumava entrar com frequência nos jogos. E geralmente dava conta do recado.

Contratado do Paraná após ser um dos destaques do time na campanha do título da Série B de 1992, Maurílio chegou ao Palmeiras com o aval de Otacílio Gonçalves, técnico que o havia dirigido na conquista da segunda divisão do futebol nacional e foi o antecessor de Luxemburgo na equipe alviverde. Em abril de 1993, Otacílio saiu, mas Maurílio ficou, e com o tempo passou a ser considerado o talismã palmeirense.

O jogo ficou difícil? 'Chama o Maurílio'.

"É isso mesmo, quando apertava ele chamava o Maurílio [risos]. O Luxemburgo conversava comigo, ele tinha uma confiança muito grande em mim, e o que ele conversava era assim: 'estamos errando nesta situação, você está vendo que o jogador que eu escalei não está fazendo isso e isso?'. E ele me orientava para fazer o que ele pedia e na primeira oportunidade na frente do gol eu não podia errar", recorda Maurílio em entrevista ao UOL Esporte.

Entre as memórias mais vivas de Maurílio estão três jogos especiais: contra o Vitória, em 1993, ano que o Palmeiras acabou com um jejum de quase 17 anos sem títulos, e contra São Paulo e Bahia, ambos já em 1994, ano em que o Palmeiras conquistou o bicampeonato paulista e brasileiro.

Diante do Vitória, o time paulista havia perdido o jogo de ida das oitavas de final da Copa do Brasil por 2 a 1, na Fonte Nova. No duelo de volta, no Palestra Itália, Maurílio começou como titular no ataque ao lado de Edílson, e aos 31min do segundo tempo fez o gol da vitória de 1 a 0 que colocou o Palmeiras nas quartas de final do torneio.

"A gente precisava vencer o jogo de qualquer jeito, e estávamos empatando. Eu fiz o gol aos 40 e pouco do segundo tempo [na verdade foi aos 31min] e vencemos. Este jogo foi no primeiro ano, em 1993. Teve uma época até que a torcida pegava no meu pé... Eu pegava na bola e a torcida vaiava, e eu acabei fazendo esse gol, e melhorou depois que eu comecei a ser decisivo, comecei a fazer gols sempre próximos às semifinais, e isso foi mudando a minha situação. Eu, Jean Carlo, Tonhão, jogadores que não tinham a posição de titular garantida, tínhamos uma cobrança exacerbada, uma pressão imensa. Quando a gente iniciava o jogo não fazia o que a torcida queria pediam para tirar... Aí quando a gente estava no banco era 'coloca ele que ele resolve', era uma situação inusitada. Mas foi fantástico", recorda.

Outras duas partidas marcantes de Maurílio com a camisa alviverde aconteceram já em 1994. Diante do rival São Paulo, em jogo que ficou marcado por ter sido realizado no mesmo dia da morte de Ayrton Senna (1º de maio), ele começou no banco e entrou no lugar do lateral direito Claudio. O placar apontava 2 a 1 para o time tricolor, até que o atacante palmeirense começou a fazer a diferença. Primeiro, aproveitou uma sobra de escanteio e empatou a partida. Depois, sofreu a falta que originou o gol da virada, marcado por Evair. 3 a 2 Palmeiras.

"Eu não me sentia um talismã, eu me sentia uma peça importante. Teve um jogo contra o próprio São Paulo, no Morumbi... A gente estava perdendo o jogo, aí o Luxemburgo tirou o Claudio e me colocou. O Mazinho cobrou o escanteio e eu marquei o gol de empate, 2 a 2. Depois, logo em seguida, eu sofri uma falta e eu queria bater. E o Evair: 'deixa que eu bato'. E o Evair bateu e acabou fazendo o gol, e viramos o jogo", relembra o atacante.

Já contra o Bahia, pelas quartas de final do Brasileiro, na Fonte Nova, Maurílio marcou um golaço de cobertura de fora da área na vitória de 2 a 1, resultado que facilitou a vida do Palmeiras para o jogo da volta, no Pacaembu - o time alviverde voltou a vencer por 2 a 1 e avançou às semifinais, sendo alguns dias depois bicampeão em cima do rival Corinthians.

"Muitas vezes eu entrei no lugar do Edilson 'capetinha', do Rincón, mas este jogo eu entrei no lugar do Evair. Pegamos o Bahia no contra-ataque. Eu recebi a bola do lado esquerdo do meio-campo, e uns 10 metros à frente eu vi o goleiro se adiantando, saindo, e eu chutei por cima e a bola entrou na gaveta. Não foi aquela cavadinha, foi um chute até forte, e pela força que eu coloquei quando ela saiu por cima do goleiro Jean, da minha visão, já dava pra ver que a bola iria para o gol. Foi um chute mais reto", explica Maurílio, que ficou no Palmeiras até 1995.

"Eu cheguei ao Palmeiras no final de 92, fiquei até 95. O meu passe ainda pertencia ao Palmeiras, saí em 2000. De 95 a 2000 fui emprestado ao Santa Cruz, que era Parmalat, fui emprestado ao Juventude, também Parmalat, fui emprestado ao Logroñés, da Espanha, depois Goiás, Vila Nova... E no Brasil todo eu sou conhecido pelo Maurílio que jogou no Palmeiras. A grandeza desse clube faz com que a gente seja conhecido", que assim como o ídolo Edmundo passou a adotar Palmeiras e Vasco como clubes de coração, em situações semelhantes.

"Na infância eu era vascaíno, mas nunca joguei no Vasco. Meu pai era vascaíno, só que agora eu tenho dois filhos, um de 12 anos e o outro de cinco, e quando o Palmeiras perde é um chororô danado aqui em casa [risos]. E agora são três palmeirenses em casa porque, como eu vivi tudo isso no Palmeiras, sou palmeirense depois de ser vascaíno", conta o atacante.

Depois de abandonar os gramados em 2009, Maurílio resolveu seguir a carreira de treinador. Fez um curso de preparação e hoje, após passar por alguns clubes, é técnico do Uniclinic, time que conquistou o vice-campeonato cearense ao perder do Fortaleza no último domingo. "É um time pequeno que subiu da segunda divisão no ano passado, que eu subi. Este ano tiramos o Ceará, vários clubes aqui, e chegamos à final do Campeonato Cearense", completa Maurílio.