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"Adotado" por Portugal: o caminho de Éder do orfanato a herói da Euro-16

Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo

10/07/2016 20h16

Dono da camisa 9 portuguesa, Éderzito Antonio Macedo Lopes não está entre os mais goleadores a levarem nas costas o número – em 29 jogos, foram quatro gols. Poderia, entretanto, ser só um; o deste domingo, diante da França, que deu a Portugal o histórico e inédito título de campeão da Europa. O centroavante já estaria marcado para sempre na história do futebol.

Nascido em Guiné-Bissau, Éder acabou afastado da família, mas foi adotado por Portugal – se tornou filho do país europeu e, décadas depois, retribuiu tornando possível a maior conquista da história do futebol português. Consagrado em solo espanhol, Cristiano Ronaldo viu saírem dos pés do atacante o gol e o título que devem alçá-lo ao posto de maior jogador da história de sua terra natal.

A trajetória que levaria Éderzito ao gol mais importante de sua vida e da Portugal começou em 1990, quando chegou, aos três anos de idade, a Lisboa.  A temporada na capital durou pouco: sem condições de sustenta-lo, sua família o deixou, cinco anos depois, nas mãos do Lar Girassol, uma espécie de orfanato em Coimbra, destinado a criar jovens de famílias sem condições de sustenta-los.

“Foi difícil de aceitar. Depois de um tempinho na instituição, comecei a adaptar-me e vi que era o melhor para mim. Tenho uma série de boas recordações”, disse o atacante, em entrevista ao Maisfutebol em 2013.

As frustrações iniciais do futuro camisa 9 português foram descontadas nas vidraças do Lar Girassol – desde os cinco anos de idade Éder sempre quis ser jogador de futebol. “Chegava da escola e ia jogar futebol. Cheguei mesmo a partir alguns vidros. Eu e os meus amigos éramos fanáticos por futebol”, contou ao O Jogo em 2009.

As vidraças viraram gols, e o jovem africano logo foi recrutado pelo Adémia, equipe local formadora de jogadores. Depois de sete anos, ao completar 19, obteve cidadania portuguesa e estreou pelo Academica de Coimbra, na primeira divisão. Assim como viria a ser com a camisa da seleção, não marcou muitos gols: 18 em 105 jogos. Comparado ao togôles Emmanuel Adebayor, conquistou pela força física e dedicação e desembarcou no Braga.

Vieram 16 gols em 31 partidas em 2012, e o país que o acolheu e lhe deu a cidadania também o convocou pela primeira vez para integrar a seleção nacional. Desde então, Éder defendeu Portugal em todas as temporadas, e foi parte do elenco que disputou a Copa de 2014 no Brasil.

Depois que a carreira decolou, a única vez em que o atacante ficou sem marcar gols foi quando deixou Portugal, em 2015, para defender o Swansea, no Campeonato Inglês – em 15 jogos, passou em branco e foi considerado um dos piores reforços da temporada. Foi como reserva, tentando ressucitar a carreira no Lille (FRA), que Éder viajou à França para defender a seleção portuguesa.

O mau momento atravessado e a falta de gols foram refletidas em uma relação turbulenta com a torcida – sua convocação foi muito criticada. Por isso o atacante vestiu  uma luva branca ao comemorar o gol: a celebração, uma marca sua, é um pedido de paz aos torcedores que o perseguem. “É uma forma de me motivar. Festejar desta forma faz-me sentir bem”.

É quase como se o destino de Éderzito estivesse amarrado com o de Portugal, e seu brilho atrelado às cores do país que o adotou. É o que pensa Cristiano Ronaldo, que o avisou que dos seus pés sairia o gol decisivo. “Disse-me que seria eu a fazer o gol da vitória. Passou-me essa confiança. Mas foi um gol muito trabalhado por toda a equipa”, contou o camisa 9.

Depois deste domingo, o atacante deverá ter carta branca pra voltar ao Lar Girassol e quebrar quantas vidraças quiser. E pode aposentar a luva branca, pelo menos em solo português.