Doença faz técnico do Uruguai treinar time de carrinho e mobiliza jogadores
Quem vê Oscar Tabárez debilitado ao lado do campo nas partidas do Uruguai pode supor que a carreira do técnico de 69 anos esteja chegando ao fim – ou, pelo menos, em uma pausa forçada. No entanto, apesar da imagem fragilizada em cima do carrinho elétrico em treinos, poucas vezes o veterano esteve tão entusiasmado em relação a um trabalho. Lutando contra uma neuropatia crônica, o comandante festeja a melhor campanha da "Celeste" desde que a América do Sul adotou o atual modelo de eliminatórias. Assim, a rotina dos deslocamentos de muletas fica em segundo plano, muito graças ao êxito de um pacto de vestiário com os jogadores.
Quando entrar de muletas na noite desta quinta-feira no estádio Centenário, para partida das eliminatórias contra o Equador, Tabárez deverá ser ovacionado de pé, como fora em setembro contra o Paraguai. O técnico é vítima de uma doença que afeta os nervos periféricos, mas recentemente negou que se trate de Síndrome de Guillain Barré, versão mais aguda de seu problema. A neuropatia crônica que afeta o treinador tem prazo mais prolongado de recuperação. O veterano do futebol refuta que conviva com dores, apesar das limitações físicas expostas nos últimos meses.
No cargo há dez anos, Tabárez coleciona resultados históricos, como o 4º lugar no Mundial da África do Sul e o título da Copa América da Argentina. A neuropatia crônica acompanha o treinador há algum tempo, presente em parte desta trajetória. Em 2011, ciente das circunstâncias que seu quadro imporia ao trabalho, o técnico levou um empresário que superou a doença para uma palestra com os jogadores. A partir deste momento, o grupo fechou com o comando, abraçou a questão internamente, com o compromisso de manter discrição sobre o problema médico.
Depois disso, a primeira crise física mais séria de Tabárez aconteceu nas vésperas do confronto contra a Jordânia, na repescagem para a última Copa. Já em março deste ano, antes dos confrontos com Brasil e Peru nas eliminatórias, o treinador entrou numa fase ainda mais complicada. A doença passou a comprometer seu deslocamento de forma mais contundente, mas o grupo se esforçou para manter o problema fora de foco. No fim, com quatro de seis pontos conquistados, a situação acabou não vazando para a opinião pública.
A estima pela figura pública de Oscar Washington Tábarez tem quase quatro décadas de duração. O atual técnico foi um zagueiro de times medianos e precisou abandonar o esporte precocemente, no fim dos anos 70, em razão de dores no joelho. Passou então a trabalhar como professor em uma escola primária de um bairro operário de Montevidéu. A atuação acabou lhe rendendo o apelido que carregaria no retorno ao futebol como treinador: "Maestro" (professor, em espanhol).
Ali, o ex-jogador parecia satisfeito com o nobre destino de alfabetizar crianças, mas a escassez de dinheiro para sustentar a família em pouco tempo devolveu Tabárez ao universo do futebol. Por alguns anos, o treinador até conseguiu conciliar as salas de aula com os gramados. Em 1983, por exemplo, levou o time sub-20 do Uruguai ao título dos Jogos Pan-Americanos de Caracas e depois foi festejado por seus alunos.
Mas o êxito como "maestro" de jogadores afastou definitivamente Tabárez das crianças. Então, gradualmente o treinador foi construindo uma carreira de feitos marcantes, como a conquista da Libertadores de 1987 com o Peñarol ou o título nacional com o Boca Juniors em 1991, livrando o popular time argentino de um jejum sem troféus. O uruguaio ainda passaria pelo comando do Milan, mas foi na seleção de seu país que encontrou o lugar mais confortável para trabalhar.
Em duas passagens diferentes, Tabárez levou o Uruguai a três Copas (1990, 2010 e 2014), sempre passando da primeira fase. Agora, com a neuropatia crônica que o acompanha, o treinador caminha firme para seu quarto Mundial – como unanimidade entre seus jogadores e idolatrado pelos seguidores da "Celeste". Nem mesmo um escândalo extraconjungal deflagrado em 2012 afetou sua popularidade.
"(Tabárez) tem um crédito enorme com a torcida. Essa seleção criou seu próprio público. Nem tudo depende dos resultados", afirmou o jornalista uruguaio Joselo Olascuaga.
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