Topo

Por que números usados por Ceni não servem para explicar vexame do SP?

Rogério Ceni, técnico do SP, criou rotina pós-tropeços usando números contra críticas - Ronny Santos/Folhapress
Rogério Ceni, técnico do SP, criou rotina pós-tropeços usando números contra críticas Imagem: Ronny Santos/Folhapress

Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo

12/05/2017 16h57

A entrevista de Rogério Ceni depois da eliminação do São Paulo na Sul-Americana, diante do Defensa y Justicia, na última quinta, foi tensa. Em clima pouco amistoso, o treinador são paulino repetiu, desta vez um tom acima do que costuma, a rotina que adotou após tropeços importantes do time na temporada. Pressionado pelo mau desempenho em campo, o ex-goleiro invariavelmente reage com números positivos da equipe que nem sempre definem o cenário de quem soma três eliminações em 30 dias. 

Assim como ocorreu após vacilos diante de Audax, Palmeiras, Cruzeiro e Corinthians (os dois últimos resultaram em eliminações), Ceni se fia no aproveitamento do time na temporada, números do ataque e posse de bola. Lesões, calendário e sorte dos adversários também são citados. Nenhum dos dados é falso, mas a frieza estatística esconde o contexto de queda de rendimento e dificuldade de implementação da estratégia contra equipes mais qualificadas.

Aproveitamento melhor do que os dos antecessores?

“São 11 vitórias, 9 empates, 4 derrotas. É um aproveitamento bem superior aos outros que passaram aqui recentemente, quase 59% . Não é um aproveitamento ruim, se você for ver um aproveitamento de Campeonato Brasileiro”, disse Ceni, depois da eliminação na Sul-Americana. O ex-goleiro repetiu o número diversas vezes na entrevista.

O problema do raciocínio é que o São Paulo ainda não estreou no Brasileiro, mas disputou o Paulista, repleto de equipes de menor expressão. Considerando apenas o desempenho até o dia 12 de maio, o aproveitamento de Ceni não é melhor do que o das últimas temporadas: em 2014, com Paulista, Copa do Brasil e início de Brasileiro, Muricy levou 60% dos pontos em disputa. Em 2015, com Libertadores, entre Muricy e Milton Cruz, o time atingiu 70% até o dia 12 de maio.

Nos últimos três anos, o único índice que fica abaixo de Ceni nos primeiros cinco meses é o de Bauza, que foi de 50,6%. O argentino, no entanto, levou o time até as semifinais da competição continental, e até o dia 12 de maio tinha 58% de aproveitamento no torneio. Além disso, considerando apenas equipes de Série A (incluindo o Defensa y Justicia, da primeira divisão argentina), o aproveitamento do São Paulo em 2017 é de 43%.

O desempenho ofensivo do São Paulo

“As minhas convicções estão nos 45 gols feitos, um time que ataca bem e que precisa aprender a recompor mais rápido. O que importa são as eliminações, porque a campanha não é ruim”. Ceni está correto ao citar a produção ofensiva do time, que marca até agora 1,8 gol por partida na temporada.

Contra equipes de Série A, entretanto, essa média cai para 1,3 gol por partida, com um agravante: oito dos 13 gols contra equipes do primeiro escalão vieram em duas partidas, contra Ponte e Santos, no começo da temporada – duas das melhores atuações do São Paulo em 2017. Ceni não reconhece queda de produção, mas nas últimas oito partidas contra clubes de Série A foram cinco gols, uma vitória, quatro empates e três derrotas: 0,63 gol por jogo.

Nas duas partidas diante do Defensa y Justicia somadas, o São Paulo teve apenas quatro finalizações certas. Duas na Argentina, duas no Brasil, segundo números do Footstats.

Calendário e ritmo de jogo

Após a eliminação desta quinta, Ceni reclamou do longo período sem jogos. “Eu preferia ter jogado domingo e domingo do que neste espaçamento. Teria sido muito mais produtivo ter conseguido estar na final do Paulista. Independentemente de vitória ou derrota, teríamos mais ritmo”.

Depois da derrota diante do Cruzeiro, na Copa do Brasil, o raciocínio tinha sido oposto. “O trabalho tático foi feito todo na pré-temporada, foi tentado desenvolver, tivemos tempo, a única pena é que você tem alternâncias com jogadores que vão chegando, isso faz um pouco de diferença. Você não consegue ter o mesmo tempo para apresentar o conceito de jogo”.

Ceni marcando Lucas Pratto - Érico Leonan/saopaulofc.net - Érico Leonan/saopaulofc.net
Ceni treinou o time por 17 dias sem partidas
Imagem: Érico Leonan/saopaulofc.net

A pausa de 17 dias, de fato, parece não ter feito bem ao São Paulo: as duas finalizações certas estão bem abaixo do que o o time produziu, inclusive, nas eliminações diante de Corinthians e Cruzeiro.

Padrão: treinador evita críticas

A postura diante das críticas após a queda na Sul-Americana, embora mais exaltada que o normal, é uma repetição do que ocorreu em outras eliminações e tropeços na temporada: estudioso, Rogério se fia em números, defende o trabalho realizado e evita ataques, ao menos publicamente, aos seus jogadores.

“Fica injusto falar isso após duas derrotas seguidas. Mas se falar dos 42 gols, veja que o time tem uma boa produção. O que o Cruzeiro fez para vencer o São Paulo na quinta-feira? Hoje, além do chute do Jadson, o que mais o Corinthians fez? Time vem retrancado e nós tentamos furar a retranca. Tem dia que a bola entra, tem dia que você cruza 39 e não entra. Se analisar o jogo, vocês verão que teve repertório. Mas a bola não quis entrar”, foi o discurso após perder de 2 a 0 para o Corinthians.

Diante do Cruzeiro, Ceni culpou a bola parada, e exaltou o desempenho ofensivo na temporada. “Jamais esperava que o Cruzeiro jogaria na bola parada contra nós. Na maioria dos jogos temos mais possibilidade, independente do lugar que seja. Dentro de casa, não conseguimos um bom resultado. Temos três derrotas no ano. A equipe do Cruzeiro se defendeu bem. Ninguém faz 41 gols nesse período se não tiver diferentes jogadas”

Contra o Audax, no início do ano, o cenário foi parecido. “Se você pegar finalizações são 27 contra 12; 7 escanteios contra 1, no um levamos o gol;  55% de posse de bola contra 45%, contra uma equipe como o Audax, que tem como o seu forte a posse de bola, é algo relevante; 21 desarmes contra 17; 24 cruzamentos contra 9. Essa é a matemática e o futebol é aquilo que acontece dentro do campo. Então, bastante coisa para a gente acertar e fazer. Já falei, ganhamos do Liverpool com 18 escanteios contra nenhum, com 21 finalizações contra 3; fomos e ganhamos. Futebol não é matemático ou uma ciência exata. Usamos a matemática para montar o time dentro de campo”, foi o discurso depois da derrota por 4 a 2.

O São Paulo a partir de agora tem como única competição o Brasileirão, e estreia domingo, diante do Cruzeiro, no Mineirão. Dentre os principais clubes de Rio, Minas, Rio Grande do Sul e São Paulo, o Vasco é o único que também disputa apenas uma competição no restante da temporada.