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Massagista-velocista do Santa é ídolo, tem nome cantado e dá autógrafo

Catatau, 50 anos, treina quase todo dia e dá 30 voltas no gramado do Arruda - Rodrigo Baltar/Santa Cruz
Catatau, 50 anos, treina quase todo dia e dá 30 voltas no gramado do Arruda Imagem: Rodrigo Baltar/Santa Cruz

Roberto Oliveira

Colaboração para o UOL, em Recife

11/06/2017 04h00

A cena se repete há muitos anos no Arruda. O técnico do Santa Cruz decide fazer uma substituição e chama o massagista Catatau. Ele se levanta do banco de reservas e arranca como um velocista. Da arquibancada, surge o grito da torcida: "Ah!, é Catatau, ah!, é Catatau".  Em poucos segundos, o escolhido já está à beira do campo.

"Quando vou buscar o jogador, não é média que eu faço, é minha finta mesmo, vou buscar e dou uma tapa nas costas para o cara acordar. Às vezes uma vinda rápida do jogador, ele entra e pode fazer o gol", explica. "Do banco até a área de aquecimento [atrás do gol] eu faço em dois, três segundos. Uma vez eu sai correndo tanto que derrubei todo mundo. Eu ainda avisei para sair da frente, já tenho minha rota. Foi repórter, câmera, tenente, capitão para tudo que é lado", conta aos risos ao UOL Esporte.

Numa dessas corridas, neste caso para atender um jogador que estava machucado e caído no em campo, Catatau já chegou até mesmo a se lesionar. E detalhe: recebeu atendimento médico primeiro do que o atleta.

"Já me machuquei numa carreira dessas, estava chovendo. Saí correndo do banco e quando estava chegando levei uma fisgada na coxa, como se tivesse furando. Aí arriei, o médico veio e me acudiu primeiro. O jogador estava caído, mas o médico veio para mim primeiro, aí Marcelino disse: 'sou eu, sou eu, não é Catatau não, vem para cá doutor'."

"E a torcida gritava 'Au au au, massagista é Catatau'. Essa torcida eu vou dizer, não tem Flamengo, Corinthians, a torcida é Santa Cruz", completa.

Mas não é fácil manter a forma e o pique aos 50 anos. Além de massagista, Catatau é enfermeiro no Hospital Maria Lucinda, no bairro de Parnamirim, região central do Recife - onde trabalha durante as madrugadas. Ainda assim, encontra tempo e disposição para passar os dias no Santa Cruz e até mesmo treinar.

"Eu corro quase todo dia aqui [no Arruda], antes era todo dia. Eu dou 15 voltas quando venho do hospital, porque estou cansado. Quando eu vou paro hospital eu dou 30, dá cerca de 1h30. Eu corro mesmo, o cansaço chega no 20, aí eu diminuo um pouco a velocidade, dou um trote rápido, mas eu não paro. Às vezes alguém fica contando, porque eu me perco, quando chega em 20 você se perde. É treinamento também, não corro só em dia de jogo não", diz, rindo novamente. "Vou fazer 51 anos em agosto e quero chegar aos 80 bem."

Rotina de fotos e autógrafos

Torcedor do Santa desde criança, Catatau  trabalha há 23 anos no clube - sempre como massagista. Mais de duas décadas de entrega e muita corrida lhe alçaram à condição de ídolo tricolor. Não é raro, inclusive, ele ser tratado no Recife e até fora do estado como celebridade.

Catatau - Rodrigo Baltar/Santa Cruz - Rodrigo Baltar/Santa Cruz
Carismático e risonho, Catatau é tratado como ídolo pelos torcedores do Santa Cruz
Imagem: Rodrigo Baltar/Santa Cruz

"O povo me chama para pedir autógrafo, tirar foto, quando eu vou no shopping, na lotérica, no Atacadão, Carrefour, Bompreço. Até quando eu estou em São Paulo o povo pede foto no aeroporto.Teve uma vez, no ano passado, que os mascotes do Grêmio e Inter tiraram foto comigo. Contra o Avaí também, até o repórter pediu foto. Mas aqui no Recife é mais comum, acontece várias vezes, quase todo dia", relata Catatau.

Carlinhos Bala "irmão", Caça-Rato "ídolo" e Grafite "coração gigante"

Questionado pela reportagem quais foram os jogadores mais marcantes com quem conviveu no Santa Cruz, Catatau relembra nomes que fizeram história no clube coral.

"O mais figura foi o Caça [Rato], e Carlinhos Bala também. Muito figuras, brincalhões, o grupo gostava que a gente ria demais. Aí rola uma amizade, Carlinhos Bala é como se fosse filho, meu irmão, e Caça é um ídolo, de quem gosto muito e ainda tenho na memória. Dênis Marques, Grafite e Kuki são muito profissionais. Grafazão não tem palavras, é um coração gigante, o cara ainda pensa no clube, está na cabeça dele e nunca saiu. Desde quando ele saiu daqui para ganhar o mundo, o clube e a torcida nunca saíram da cabeça dele, tanto que qualquer conversa com ele tem que ter o Santa Cruz, é um baita profissional e um baita homem."

Massagista, velocista, enfermeiro e... passista de samba

Como se não bastasse conciliar os trabalhos de massagista e enfermeiro, e ainda ter se tornado um corredor dedicado, Catatau já brilhou nas avenidas como passista de samba durante a juventude. Ele caminha com gingado e, perguntado sobre seus gostos musicais, revelou que já viajou para o exterior por causa da paixão pelo samba.

"Gosto de forró, brega, pagode, sertanejo e o sambinha, que é a minha raiz. Fui passista de samba, fui dos bons, um dos melhores sambistas de Pernambuco. Dancei em escola de samba, na Galeria do Ritmo, na Gigantes do Samba, já fui até pra fora do país, mas isso foi antes de vir pro Santa, lá no Alto do José do Pinho [bairro tradicional do Recife], que é um berço cultural muito forte."

"Eu aposto com Walter"

Foi no bairro que abriga diversos maracatus tradicionais, como o Nação Estrela Brilhante, e onde nasceu a banda de rock Devotos que Catatau começou sua paixão pelo Santa Cruz. Ainda criança, ele dizia que um dia iria correr no gramado no Arruda.

"Foi onde eu comecei a gostar do Santa, eu vinha para cá com 10, 12 anos. Vinha 20, 30 pirralhos para ver o Santa jogar, vinha do Alto cantando as músicas, o hino do Santa. E teve uma vez que eu disse: 'vocês vão me ver correr aí'. E os moleques tiravam onda: 'como, tu nem corre nem nada, como vai ser jogador?' E hoje eu estou aqui, tem jogador que não aguenta minha carreira, eu aposto com o Walter", desafia Catatau, gargalhando.