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Como Gabriel Jesus foi de quase dispensado do Palmeiras a comparado a Kaká

Caio Carrieri

Colaboração para o UOL, de Manchester (Inglaterra)

15/11/2017 04h00

Sensação na Europa, xodó de um catalão e artilheiro da seleção brasileira, Gabriel Jesus quase teve a sua trajetória no futebol interrompida por um luso-canadense.

A carreira do atual parceiro de Neymar pelo Brasil poderia ter sido totalmente diferente se o Palmeiras tivesse concordado com a avaliação inicial de Marc dos Santos, então técnico da categoria Infantil do clube quando o menino conhecido como Gabriel Fernando chegou ao alviverde aos 15 anos, no segundo semestre de 2012, após se destacar na várzea de São Paulo.

"Em um mês, o treinador queria mandar ele embora", conta ao UOL Esporte Bruno Petri, que o atacante de 20 anos considera o seu principal mentor no aprendizado pelas equipes inferiores do alviverde. "O Marc tinha uma ideia diferente de jogo, com muita atividade em campo reduzido, o que é comum atualmente, mas não naquele período no Brasil", acrescenta. "E o Gabriel não conseguia mostrar no espaço curto a qualidade técnica, a inteligência de jogo, o passe rápido e a velocidade de raciocínio. Isso era absolutamente natural, porque ele ainda não tinha feito nada para desenvolver isso, já que o histórico era apenas na várzea", pondera.

Contrários à ideia de dispensarem o novato de forma prematura, os coordenadores da base palmeirense na época, Hamilton Ramos e Candinho, aproveitaram que Gabriel tinha sido aprovado no clube depois das inscrições do Paulista sub-15 e remanejaram o menino para o time um ano mais novo. Nesta mudança, os caminhos de Jesus e Petri se cruzaram. O jogador, destaque no Manchester City de Pep Guardiola, ainda hoje reconhece, do outro lado do Atlântico, a importância das lições com o seu primeiro grande influenciador.

"Evoluí bastante com o Bruno e levo comigo como aprendizado”, admite. "Tenho muita gratidão por ele, que foi muito importante na minha carreira. Além de técnico, as conversas fora de campo serviram como ótimos ensinamentos. Não é à toa que vários jogadores de alto nível já passaram pelas mãos dele”, diz o atacante em referência a nomes como Casemiro, do Real Madrid, e Lucas, atacante do PSG, ambos pupilos de Petri, que trabalhou por uma década na formação de jovens do São Paulo.

Hoje dono de um centro de excelência para atletas na capital paulista, Bruno Petri enxerga na estrela do City qualidades demonstradas desde a época de anonimato. "Ele sempre foi muito rápido e de força física", explica. "Com o tempo, ele amadureceu a ideia de que a determinação é essencial para o estilo de jogo dele, o que faz ele acreditar até o fim em todos os lances. Dá para notar claramente isso pela seleção e pela Inglaterra", ressalta. "Dava gosto de trabalhar com o Gabriel, porque além de fazer os exercícios com vontade, tinha resultado".

Então qual a principal característica de jogo melhorou desde a juventude? "O chute com a perna esquerda era horrível, ele quase caía sentado depois da batida”, lembra Petri, puxando pela memória. "Sofremos muito para melhorar a esquerdinha dele, que hoje já engana alguém”, brinca.

Além da categoria Infantil, a dupla trabalhou junta na equipe juvenil, pela qual Gabriel começou a roubar a cena dentro do Palmeiras. Em 2014, quebrou o recorde de gols no Campeonato Paulista sub-17, do qual foi vice-campeão para o Santos e marcou 37 gols em 22 jogos. O jovem goleador não só balançou a rede do rival do litoral paulista como também vazou São Paulo e Corinthians nas quartas de final e na semifinal, respectivamente.

As atuações chamaram a atenção do clube do Morumbi, e o assédio mexeu com a cabeça do menino. "Era novidade na vida dele, e isso afetou o desempenho, começou a perder gols", relembra o treinador. "Por isso, tivemos uma conversa com o psicólogo do clube para retomarmos o foco no trabalho”, conta Petri. "Também disse que ele tinha de dar a opinião dele e não deixar apenas nas mãos dos empresários. Reforcei que era o Palmeiras que tinha dado a oportunidade para ele, então tinha de haver gratidão. No meio de tudo isso, tive até de colocá-lo no banco em um jogo para ele esfriar a cabeça, enquanto o São Paulo vinha com um caminho de dinheiro para cima do menino”.

Antes de ser promovido em 2015 para os profissionais do Palmeiras, pelo qual foi campeão da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro, Gabriel Jesus foi semifinalista da Copa São Paulo de Futebol Júnior daquele ano.

Comparação com Kaká

Com passagens pela base de São Paulo, Palmeiras e Fluminense, Bruno Petri já acompanhou diferentes histórias de garotos que sonhavam com uma oportunidade na equipe principal. Com a experiência adquirida ao longo dos anos, ele vê semelhanças entre os caminhos de Gabriel Jesus e Kaká, eleito melhor do mundo em 2007 e jogador do Brasil em três Copas do Mundo (2002, 2006 e 2010).

"Chamo os dois de moscas brancas, daqueles casos que acontecem um em um milhão", compara. "O Kaká participou de todas as equipes inferiores no São Paulo, mas nunca jogou. Embora tivesse qualidade técnica, o biotipo não ajudava", esclarece. "Só que ele chegou no profissional e estourou", observa. "O caso do Gabriel é semelhante, porque chegou muito tarde em um clube e conseguiu despontar do jeito que está fazendo. São histórias que dificilmente serão repetidas".