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Boné, roupas e até açaí: "marcas boleiras" invadem clubes e mercado

Corintiano Clayson pode virar linha de produtos de uma marca de vestuário boleiro - Arte/UOL
Corintiano Clayson pode virar linha de produtos de uma marca de vestuário boleiro Imagem: Arte/UOL

Gabriel Carneiro

Do UOL, em São Paulo

22/02/2018 04h00

Quem acompanha as redes sociais de jogadores de futebol com certeza já viu um monte de produtos e serviços sendo anunciados por eles, geralmente donos de perfis com milhares ou até milhões de seguidores. Há uma série de caminhos para uma celebridade do meio esportivo divulgar algo na internet, e um deles está em alta nos últimos meses: é o marketing baseado no relacionamento entre jogadores, pequenos e médios empresários e os torcedores, potenciais clientes das marcas.

Funciona mais ou menos assim: empresários de diversos ramos (cada vez mais) se envolvem no dia a dia de clubes, em centros de treinamento ou estádios, para presentear os jogadores de futebol com seus produtos. O mais comum é que este jogador use suas redes sociais para agradecer pelo presente e marcar o perfil da empresa. Daí, está feito: influenciados pelos ídolos, os torcedores vão atrás das camisetas, bonés, acessórios ou qualquer outro artigo usado ou consumido pelo jogador.

O universo das "marcas boleiras" invadiu os times, já está ditando moda no mercado e foi decifrado pelo UOL Esporte.

Há jogadores que aparecem tanto com determinadas marcas que já viraram "embaixadores" delas. É o caso do atacante Clayson, do Corinthians. O talismã do título brasileiro de 2017 aparece frequentemente com roupas e bonés da marca "Tudo Tranquilo". O jogador é amigo pessoal de Jonatan Lima, dono da empresa e, curiosamente, jogador de futebol em atividade pelo Novorizontino, que disputa a elite do Paulistão neste ano. Há menos de um ano no Corinthians, Clayson virou case da marca.

André Vinicius e Jonatan Lima em marcas boleiras - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
André Vinicius e Jonatan Lima são jogadores e sócios na Tudo Tranquilo
Imagem: Reprodução/Instagram

"Os primeiros caras que usaram a marca eram nossos amigos, aí colocavam as roupas e havia uma divulgação que gerou marketing para a empresa. Hoje nosso projeto de marketing passa pela divulgação deles. Foram eles que fizeram nossa marca ter a proporção que tem, e o Clayson é um que se posta foto com boné, camiseta, bermuda, o nosso site bomba de venda das peças. Vemos na hora que faz diferença", conta Jonatan, que ainda tem como divulgadores jogadores como Lucas Lima (Palmeiras), Willian (Chelsea-ING) e Elias (Atlético-MG).

Clayson bomba tanto que pode virar uma linha de produtos da "Tudo Tranquilo". Ele, que ainda tem contrato de fornecimento de material esportivo com a gigante Nike, também tem planos de abrir uma loja em sua cidade, Botucatu, e vender produtos da empresa. Enquanto isso, só fica surpreso pelo sucesso que seu modo de vestir tem feito com os fãs.

"Acho isso bem bacana, apesar de não ser o objetivo quando uso as roupas (risos). Eu visto porque eu gosto da marca, o pessoal é meu amigo e eu me identifiquei. Tem muita coisa legal e realmente passei a usar bastante quando estou fora do clube. Graças a Deus tenho conseguido me destacar profissionalmente, pude chegar ao Corinthians, conquistar título, ajudar a equipe... Então, a identificação com o torcedor foi muito legal, recebo o carinho de todos e acho que isso acabou ajudando em como eles me veem", diz o jogador do Corinthians, plenamente consciente da influência que um jogador de futebol tem no comportamento das pessoas.

"Quando você é um jogador de um clube de massa, uma figura pública, qualquer atitude tem uma consequência maior. Você passa a ser exemplo pra milhões de pessoas, crianças até... Eu sempre tive uma cabeça boa, desde a criação na família, os conselhos do meu pai, do meu empresário, as dicas dos jogadores mais experientes nos clubes por onde passei... O jogador é visado, para o bem e para o mal, não só dentro de campo, mas fora dele também".

Ricardo Oliveira e marcas boleiras - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Ricardo Oliveira faz sucesso com os seguidores evangélicos da Buh
Imagem: Reprodução/Instagram

"Não vendemos roupas, vendemos um conceito"

Felipe Sanchez decidiu deixar o Camboriú, onde jogava como goleiro, quando uma tentativa de negócio em sociedade com Diego Navarro deu resultado: eles mandaram confeccionar 200 camisetas e 50 bonés dentro do estilo "fashion soccer", divulgaram e rapidamente venderam tudo. Depois dobraram e vendeu. Triplicaram e vendeu. Foi aí que os amigos notaram que dava negócio e decidiram apostar na criação da marca "Buh" (Deus em tcheco). Após dois anos, eles têm escritório e loja física em São Paulo e mais de 200 revendedores pelo país.

"O jogador tem um jeito peculiar de se vestir e vimos que no mercado isso não existia. Tinha os materiais esportivos e tinha as roupas de grife que os jogadores usavam, como Armani, Gucci, Calvin Klein... O jogador ia pegando um pouco de cada coisa para compor o look, então nós agregamos tudo numa coisa só. É modelagem, uma coisa mais apertadinha, mais alongada, mas não muito, senão vira street. Enfim, é o estilo do jogador, estilo do boleiro, que existe, mas não era divulgado", conta Sanchez, também com estratégias de marketing claras.

"Nosso marketing é todo baseado em relacionamento. Eu não estudei, mas tínhamos uma ideia bacana e conhecíamos as pessoas. Temos gente na música, na televisão, mas a base é futebol, porque retratamos o estilo dos jogadores, e todos os que usam nossa marca já jogaram com a gente, são amigos da gente ou amigos de amigos".

Neymar e marcas boleiras - Reprodução/SporTV - Reprodução/SporTV
Neymar já usou boné da Buh publicamente
Imagem: Reprodução/SporTV

A "Buh" tem três cases de divulgação: o youtuber Fred, do canal Desimpedidos, o astro internacional Neymar e o atacante Ricardo Oliveira, do Atlético-MG, que atinge a comunidade evangélica. No total, a empresa aparece nas publicações de uma média de três atletas em cada clube grande da Série A, além de seleção e Europa. Segundo Felipe Sanchez, os jogadores são presenteados, mas nunca obrigados a usar qualquer artigo.

"Nós presenteamos os jogadores. Nunca pedimos foto de ninguém, ao contrário de outras marcas. Porque não vendemos roupa, vendemos um conceito. Não pagamos ninguém, todos usam por vontade própria e nós não tiramos fotos de ninguém, é um marketing espontâneo. A gente diz: "Vou te mandar uma roupa e se você gostar você usa". Ninguém é obrigado a nada. E eu sei que se ele gostar vai aparecer usando. Eu nem falei com o Neymar, por exemplo. Levei para ele no hotel e acabou, quando fui ver ele estava na zona mista com as roupas da Buh, e isso é gratificante, porque prova que o jogador entendeu a marca".

"Vale a pena para as duas partes"

João Freitas é criador de um conceito que virou moda. Trata-se do "Barco de Açaí", nada mais do que um recipiente em formato de barco preenchido com muito açaí (tem gente que pede até de 4kg) e muitos acompanhamentos, dos mais variados. Uma das razões de popularização da lanchonete de João, chamada "Açaí Magnífico" foi justamente o marketing iniciado pelos jogadores de futebol. Ele mesmo, hoje dono de 11 lojas e em processo de abertura de outras, admite que o negócio tomou repercussão sem muito estudo profundo de publicidade.

"Na verdade o negócio aconteceu por acaso. Criamos um conceito, que foi o "Barco de Açaí", e isso explodiu nas redes sociais. Quem veio primeiro foi o Gabriel Jesus, e na hora em que ele postou veio uma porrada de jogador que começou a entrar em contato. Aí aconteceu tudo naturalmente. Só o Jesus foi espontâneo, depois peguei contatos, amizades e a galera veio, virou um marketing. É tudo legal para caramba. Eu gosto bastante de futebol e rende bastante para a marca. Vira uma parceria legal e essa divulgação vale a pena para as duas partes", diz o empresário de São Paulo.

Gabriel Jesus e marcas boleiras - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Gabriel Jesus deu início à "febre" do Barco de Açaí, que atingiu boleiros e público
Imagem: Reprodução/Instagram

Nos últimos meses, além de receber jogadores em suas lojas, João Freitas também entrega ou manda entregar potes de açaí nas casas dos jogadores ou hotéis de concentração. Depois disso são comuns postagens nas redes sociais divulgando a marca e atraindo mais clientes. A estratégia dá tão certo que a "Açaí Magnífico" pensa em patrocinar formalmente um jogador.

"Temos planos de ter um garoto-propaganda e o Neymar está na mira. É sério (risos). Entre os jogadores que frequentam está o pessoal do Corinthians, Léo Santos, Pedrinho, Maycon, Fagner, Jô, tem o Rodrigo Caio, do São Paulo, o Victor Luis e o Thiago Martins, do Palmeiras, Neilton, Léo Jabá, que chegou da Rússia e a primeira coisa que fez foi tomar açaí. É uma galera, um vai falando para o outro e vai aumentando, crescendo. Agora estou para abrir loja em Santos e já pegando contatos", diz João Freitas.

João Freitas e marcas boleiras - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Empresa já atua também em publicidade em estádios e agora quer garoto-propaganda
Imagem: Reprodução/Instagram

As marcas boleiras, que no passado se orgulhavam de aparecer na TV em bonés ou camisas de jogadores, estão diferentes e vieram para ficar. E também vestir, ostentar, matar fome, refrescar...